Há duas saídas para "o Brasil nos tempos da cólera": renúncia ou impeachment.
"Vivemos um impasse", afirma o historiador Marco Antônio Villa em artigo publicado no jornal O Globo,
" e não nenhum paralelo com qualquer outro momento da história
republicana". O fato é que o governo perdeu a legitimidade. "Protestar,
ocupar as ruas é a tarefa que se coloca". O objetivo é derrotar o
"projeto criminoso de poder" do lulopetismo. Esta é a hora das pessoas
que têm compromisso com o Brasil:
Nunca na
história recente do Brasil o interesse por política foi tão grande como
agora. Fala-se de política em qualquer lugar e a qualquer hora. O chato
é, neste momento, o brasileiro que não está nem aí para os rumos do
nosso país. Esta sensação perpassa as classes sociais, as faixas etárias
e as diversas regiões do país. É um sentimento nacional de ódio aos
corruptos, ao seu partido e a suas lideranças, especialmente aquela que
se apresentou durante anos como salvadora da pátria e, hoje, não tem
coragem de caminhar, sem segurança, por uma simples rua de alguma
cidade. Transformou-se em um espantalho. Só assusta — se assusta — algum
passarinho desavisado.
Vivemos
um impasse. E não há nenhum paralelo com qualquer momento da história
republicana. O governo perdeu a legitimidade e mal completou três meses.
E ainda faltam — impensáveis — 45 meses. Se as eleições fossem
realizadas hoje, Dilma Rousseff sequer chegaria ao segundo turno. E o
que fazer? É necessário encontrar uma saída para a greve crise que
vivemos. Não cabe dar ouvidos aos covardes de plantão, aqueles que dizem
que temos de tomar cuidado com a governabilidade, que não podemos
colocar em risco a estabilidade econômica e que o enfrentamento aberto
do projeto criminoso de poder é um perigo para a democracia.
Devemos
silenciar frente a tudo isso? Não, absolutamente não. Esta é a hora
daqueles que têm compromisso com o Brasil. Protestar, ocupar as ruas é a
tarefa que se coloca. É seguir a lição de Mário de Andrade. Não sejamos
“espiões da vida, camuflados em técnicos da vida, espiando a multidão
passar. Marchem com as multidões.” E no dia 12 as ruas estarão tomadas
por aqueles que não querem simplesmente espiar a vida, mas desejam mudar
a vida.
O projeto
criminoso de poder acabou transformando a corrupção em algo natural. E o
volume fabuloso de denúncias que horroriza a nação é visto
positivamente, pois as denúncias estariam sendo apuradas. É
inacreditável: em uma manobra orwelliana, o petrolão é definido como uma
ação saneadora do Estado, e não como o maior desvio de recursos de uma
empresa pública na história da humanidade. Seus asseclas — supostos
intelectuais — buscaram algum tipo de justificativa. Como se no Brasil
houvesse uma cultura da corrupção, um fator de longa duração. Erro
crasso: imaginam que os brasileiros são à sua imagem e semelhança. Não
são. Eles é que são corruptos — e nem precisam sair do armário. Já
assumiram e faz tempo.
Cabe
ressaltar que o movimento da História é surpreendente e imprevisível. No
início de junho de 1992, quando a CPMI sobre as atividades de Paulo
César Farias — denunciadas por Pedro Collor, irmão do presidente —
estava iniciando seus trabalhos, o senador Fernando Henrique Cardoso fez
questão de declarar que “impeachment é como bomba atômica, existe para
não ser usado.” O deputado peemedebista Nélson Jobim foi enfático: “O
Congresso não pode fazer uma CPI para investigar o presidente. Se vocês
insistirem nisso, eu vou ao Supremo.” Mais cordato, mas não menos
conciliador, o senador Marco Maciel (PFL-PE) declarou que a “CPI não vai
produzir sequelas, pois as acusações foram feitas sem provas.” Líderes
empresariais saíram em defesa do presidente. Emerson Kapaz, candidato a
presidente da Fiesp, disse que as denúncias eram “uma grande
irresponsabilidade.
As pessoas precisam medir seus atos para não causar
mais turbulência no Brasil, já tão afetado pela crise econômica.” E até
juristas criticaram Pedro. Um deles, Celso Bastos, declarou que o irmão
do presidente era de “um egoísmo elevado à última potência” e que ele
“nunca pensou nos interesses da nação.” Quatro meses depois, Fernando
Collor não era mais presidente do Brasil.
Hoje
vivemos uma situação muito distinta em relação a 1992. Entre outros
fatores, um é essencial: as ruas. Desta vez, são elas que estão
impulsionando o Parlamento, e não o inverso, como naquele ano. O que
ocorreu pelo Brasil, no dia 15 de março, é fato único na nossa história.
Eu testemunhei dezenas de milhares de pessoas se manifestando em
absoluta ordem na Avenida Paulista. Com indignação — e justa indignação —
mas também com bom humor. Foi um reencontro com o Brasil. A
auto-organização da sociedade civil é o novo, só não reconhece quem está
comprometido com o projeto criminoso de poder — e são tantos que
venderam suas consciências.
Esta será
uma semana de muita tensão. E isto é bom para a democracia. Ruim é o
silêncio ou o medo. As ruas voltaram a ser do povo, e não mais monopólio
daqueles que têm ódio à democracia. Nós temos tudo para construir um
grande país mas antes temos uma tarefa histórica: nos livrar dos
corruptos. E sempre dentro da democracia, da lei e da ordem. São eles — e
existem sim o nós e eles — que sempre desprezaram o Estado Democrático
de Direito. Nunca é demais lembrar que o PT votou contra o texto final
da Constituição.
Vivemos
uma quadra histórica ímpar. Não é exagero que nós teremos muito a contar
aos nossos filhos e netos. É aquele momento de decisão, de encruzilhada
do destino nacional. Para onde vamos? Continuaremos a aceitar
passivamente a destruição dos valores republicanos ou tomaremos uma
atitude cívica, de acordo com bons momentos da nossa história?
Eles não
passarão. E não passarão porque — paradoxalmente — uniram o Brasil
contra eles. Ninguém aguenta mais. É hora de dar um passo adiante, de
encurralar aqueles que transformaram o exercício de administração da
coisa pública em negociata, em mercadoria. E deixar duas saídas: a
renúncia ou o impeachment.
Comentário
Ao dizer que o Brasil está "no tempo da cólera" o autor do texto acima faz uma comparação com o titulo de um livro muito famoso de Garcia Marquez intitulado o "Amor no tempo do cólera" .Só que, no livro, "cólera" era a doença, portanto substantivo masculino, e no caso do Brasil cólera é sinonimo de raiva, portanto substantivo feminino.N.B.
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