Presidenta lança plano de exportações e diz que será 'caixeira viajante' como Lula
H. M.
São Paulo
22 JUL 2015 - 12:06 BRT
Em meio à crise e a falta de alternativas no mercado interno para retomar o crescimento, o Governo de Dilma Rousseff mira para fora para tentar reanimar a economia do país. Após quatro anos de certo descuido com o setor externo e a política externa, a presidenta lançou no último mês um plano de exportações para intensificar os acordos comerciais com outros países e dar um “novo status” ao comércio exterior brasileiro.
Citando o antecessor Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma promete ser caixeira viajante como ele e gastar mais tempo para promover o país. Com a recuperação americana e a desaceleração dos emergentes, ela também tem dado sinais de que priorizará a retomada das relações com os Estados Unidos. As complicações do Mercosul —que acaba de ganhar mais um sócio, a Bolívia— segue, no entanto, inspirando críticas.
As apostas no mercado externo fazem sentido. Apesar do Brasil ser hoje a sétima maior economia do mundo, o país ocupa a 25a posição no ranking de países, muito aquém do seu potencial. “Sempre fomos uma economia muito fechada, a nossa participação é desproporcional ao nosso tamanho, precisa ser aumentada, ela é quase ridícula”, explica o professor Renato Galvão Flôres Junior, da FGV/EPGE.
O que especialistas ponderam agora sobre esse plano do Governo vale para várias iniciativas do segundo mandato de Dilma Rousseff: as medidas chegam com atraso e merecem ser recebidas com certo ceticismo.
“A decisão de investir na política externa não foi natural, simplesmente não havia outra alternativa. É uma última cartada para recuperar a economia. A nossa grande dificuldade é que estamos entrando como um cliente novo. Paramos no tempo e outros ocuparam nosso espaço”, afirma o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.
Ao contrário do protagonismo diplomático de Lula, Dilma dedicou, até agora, muito menos tempo a viagens internacionais para “vender o Brasil”. No primeiro mandato, ela ficou quase cem dias a menos que Lula no exterior e ainda cortou o orçamento do Ministério das Relações Exteriores (MRE). “Claramente o ritmo mais desinteressado de Dilma comprometeu o legado deixado pelo antecessor. Ela é muito técnica, não é mascate como o Lula”, explica Castro.
“Já virei um pouco caixeiro viajante e vou continuar”, afirmou a presidenta em entrevista à Folha de S. Paulo, no início deste mês. Ela se comprometeu a “fazer o diabo” para atingir a menor recessão possível e uma das estratégias é justamente o plano anunciado para melhorar a competitividade brasileira e estimular a geração de empregos.
O projeto conta com cinco pontos chaves para estimular as vendas externas de produtos brasileiros: acesso a mercados; promoção comercial; facilitação do comércio; financiamento e garantia às exportações; e aperfeiçoamento de mecanismos e regime tributários para o apoio às exportações. “O plano é positivo, ainda mais em um cenário de recessão, porém não trouxe muita novidade, não criou expectativa de aumento de exportações.
O Portal único do exportador foi uma iniciativa importante, mas não foi nenhuma novidade. Se fala em novas parcerias, mas a grande questão é como isso vai acontecer”, explica o professor de economia do Ibmec/RJ, Daniel Sousa.
O especialista critica, no entanto, que a alíquota do Reintegra, programa que “devolve” parte do valor exportado em produtos manufaturados por meio de créditos do Pis e Confins, caiu de 3% para 1%, neste ano, e só voltará ao seu valor original em 2018. “Nossos problemas são hoje, precisamos desse crédito agora”.
Problemas no Mercosul
Segundo estimativa da AEB, a exportação brasileira deve somar 191,331 bilhões de dólares, em 2015, uma queda de 15% em relação a 2014. Já as importações vão apresentar um recuo de 20% em relação a 2014, somando 183,267 bilhões de dólares. Ainda que a perspectiva seja de um superávit de cerca de 8 bilhões de dólares, o presidente da entidade explica que o número é ilusório e é puxado muito mais pela queda de importação devido a fraca atividade econômica. “Ainda há uma dependência muito grande em relação as commodities, e a exportação está muito fraca”, afirma Castro.Castro engrossa a fila de especialistas que veem nas regras do Mercosul um entrave, um embate que ganha espaço entre integrantes do Governo que defendem que o bloco flexibilize suas normas para permitir acordos comerciais com apenas parte dos sócios. “Todas as decisões precisam ser aceitas por unanimidade por todos os membros. Com a entrada de mais um membro, a Bolívia (na última sexta-feira), fica ainda mais difícil chegar a consensos em acordos”, afirma. “Diferentemente da Aliança do Pacífico que é uma área de livre comércio, o Mercosul acaba sendo uma união aduaneira (que tem a intenção de compartilhar impostos e tributos externos)”, explica.
Para o especialista, a recente ênfase do Brasil suas relações comerciais com os Estados Unidos é acertada. A recuperação da economia americana pode ser um impulso para as exportações brasileiras de manufaturados em um momento em que a a América do Sul está reduzindo suas importações pelo impacto da queda do preço das commodities.
Acordo entre UE e Mercosul é visto com ceticismo
A conclusão de um acordo comercial entre o Mercosul e a UE é uma das prioridades da agenda externa do Brasil e um passo estratégico para o comércio internacional da região, segundo Dilma Rousseff. No entanto, especialista são céticos à aprovação de uma oferta comercial entre as duas regiões a curto prazo.Na última semana, a Europa fez na Organização Mundial Comércio uma ampla contestação sobre a política industrial brasileira, mostrando um indício das dificuldades de negociação entre os dois blocos. A UE condena o país, por exemplo, por discriminação contra produto estrangeiro. "Há 3 anos o interesse desse acordo era maior por parte da UE, mas agora o cenário inverteu. A Europa também está mais centrada no acordo com os EUA”, explica.
Para Renato Galvão, da FGV, apesar do esforço de aproximação do Brasil com os europeus, eles ainda possuem muitos conflitos de interesse. "Os europeus são muito resistentes em diminuir os entraves do setor agrícola e o Brasil resistente com mudanças em relação a serviços, então fica uma relação conflituosa. O momento também é outro ", afirma.
Para o especialista, a Europa passa por momentos de ajuste e vivencia uma forte desvalorização do euro. "O momento é outro, mais do que importar, os europeus estão focados em vender, em exportar", diz.
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