- terça-feira, 03 novembro 2015 18:55
Mas, não se pode fechar os olhos para outros biomas** e para outras agendas socioambientais.
Discursos e ações oficiais, do setor privado e até do não governamental têm centrado esforços políticos e investimentos na floresta tropical, enquanto na prática e junto à opinião pública se minimiza a função climática, de conservação da biodiversidade e de serviços ecossistêmicos de outras formações naturais.
Exemplos recentes, o Fundo Global para o Meio Ambiente anunciou US$ 115 milhões para gestão sustentável e corte de emissões de carbono, na Amazônia. As metas que o Brasil levará à conferência de Paris têm entre seus carros-chefes zerar o desmatamento ilegal até 2030, na Amazônia. E há poucos dias, recursos públicos foram usados para que o Governo Federal promovesse, em Londres, um... Dia da Amazônia, para apresentar nossa “política ambiental”.
Todavia, a Amazônia não é uma ilha. Ela não sobreviverá sozinha ao jogo das mudanças climáticas globais, ainda mais se persistir como alvo de projetos desenvolvimentistas que vêm lhe entregando fartamente hidrelétricas, rodovias e desmatamento.
Quase 30 barragens para geração de energia estão planejadas para a região. O desmatamento cresce fortemente no entorno de canteiros de obras, como da polêmica usina de Belo Monte. Discurso e prática em conflito.
Enquanto isso, do Cerrado, chamado de caixa d´água do país e reconhecido como a savana mais rica em vida do planeta, já se consumiu a metade, especialmente para pastagens e monoculturas, como de soja. Apenas 20% do Cerrado ainda não viraram uma grande colcha de retalhos de matas, e menos de 3% dele estão efetivamente protegidos em parques nacionais e espaços semelhantes.
Algo grave para uma região cujas águas ajudam a manter vivo o Pantanal e são responsáveis por boa parte da eletricidade que chega a nossas casas.
Além disso, as emissões de gases estufa por perdas de Cerrado já rivalizam com as oriundas do desmatamento e queimadas na Amazônia.
Riquezas naturais e humanas de outros biomas e dos ambientes costeiros e marinhos caíram no quase total ostracismo
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Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal e Pampa se tornaram “biomas de segunda categoria” em termos políticos, científicos e de investimentos para sua conservação frente à atenção nacional e internacional focada na Amazônia.
O Brasil assinou e ratificou uma séria de convenções e acordos internacionais destinados à manutenção da vida em suas infinitas formas, à preservação de áreas úmidas, à proteção de ambientes marinhos, à contenção da poluição e à conservação de ecossistemas terrestres, por exemplo.
Tais contratos não fazem distinção entre nossos biomas, e corretamente cumpri-los exigirá do Poder Público um olhar mais abrangente sobre o território brasileiro. Antes que seja tarde.
Nosso sistema de parques nacionais e outros tipos de “unidades de conservação” é francamente concentrado na Amazônia. Ponto para a floresta. Enquanto isso, os demais ecossistemas têm graves falhas em proteção oficial, especialmente frente às metas internacionais que demandam o abrigo de 17% das formações terrestres e 10% das zonas costeiras e marinhas, até 2020. Nesse quesito, Pampa e ambientes marinho costeiros detêm o maior déficit de proteção.
Proteger e conservar adequadamente todas essas formações naturais não atenderá apenas à sobrevivência de plantas e animais, muitos ameaçados de extinção, mas também ajudará a oferecer clima adequado, espaços de lazer, turismo e geração de renda, água para geração de energia, agricultura e abastecimento público, meios de sobrevivência para populações tradicionais e um futuro realmente mais sustentável para todos os brasileiros.
Se o Brasil seguir tocando um samba de um bioma só, todos iremos dançar.
**O termo mais correto seria domínio biogeográfico, mas bioma está na boca do povo.
*Aldem Bourscheit é jornalista, especialista em Meio Ambiente, Economia e Sociedade.
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