Maurício Voivodic*
Cientistas
do mundo todo estão fazendo um alerta. Este 2 de agosto marca o dia em
que a humanidade consumiu mais recursos naturais do que a Terra é capaz
de repor em um período de doze meses - o Dia da Sobrecarga da Terra. Em
2016, a Terra entrou neste cheque especial no dia 8 de agosto. Em 2000,
foi no dia 5 de outubro. Esta antecipação mostra que o uso dos recursos
do planeta é maior a cada ano, de forma descontrolada.
As
pesquisas indicam que as ações humanas já causaram a redução de mais da
metade (58%) das populações de vida silvestre desde 1970. Caminhamos a
passos largos para a sexta extinção em massa dos seres vivos – a última
delas, há mais ou menos 65 milhões de anos, fez desparecer da face da
Terra os dinossauros. Atualmente, nos trópicos, o ritmo dessa perda é
ainda mais acelerado.
Até
o ano 2000, 48,5% do habitat de florestas tropicais e subtropicais
foram convertidos para o uso humano, segundo dados do Living Planet
Report. Considere que as florestas tropicais estão entre os ecossistemas
mais ricos do planeta, e que sofreram a maior perda em termos de área.
Vai-se
a floresta e com ela vão todos os serviços ambientais de que a
humanidade depende: água, equilíbrio climático, alimentos, medicamentos,
abrigo. Estamos colocando o nosso futuro em risco.
Ingressamos
em uma nova época geológica, o Antropoceno, em que os seres humanos,
mais do que forças naturais, representam hoje o principal fator de
mudança na paisagem do planeta. A notícia boa é que podemos também
redefinir essa nossa relação com a Terra.
A
chave é sair de uma postura predatória adotada contra o planeta e
seguirmos um padrão de uso dos recursos naturais sustentável. Isso quer
dizer, na prática, que precisamos usar o que a Terra nos oferece dentro
da capacidade natural de reposição dos ecossistemas, além de parar
imediatamente de destruir a biodiversidade. Somente assim as gerações
futuras também poderão usufruir de toda essa riqueza.
Temos
de cruzar a ponte e fazer a transição para um modo de vida que
relacione o desenvolvimento humano com a conservação da natureza.
Trata-se de um novo pacto civilizatório. E esse pacto supõe,
necessariamente, a criação e a manutenção de uma rede de áreas
protegidas em escala global.
Ao
garantir a existência de áreas voltadas exclusivamente à conservação da
biodiversidade e seus serviços ambientais, e ao uso sustentável dos
recursos naturais, estamos assegurando as condições essenciais de
sobrevivência da vida na Terra.
Vejamos o caso do Brasil.
O
país tem hoje cerca de 17% do seu território em unidades de conservação
(UCs). Estamos falando de parques nacionais, reservas extrativistas,
estações ecológicas e florestas públicas. A maior parte da energia
elétrica consumida hoje no país vem de rios que nascem ou passam pelas
UCs.
Um
terço da água que abastece a todos nós parte dessas unidades. Elas
ajudam a controlar o microclima das cidades, a qualidade do ar que
respiramos e previnem desastres associados a eventos climáticos
extremos, como deslizamentos de terra, enchentes e grandes incêndios
florestais.
Sem
contar que o Brasil, como um dos maiores produtores de alimento do
mundo, depende da regulação do clima, da disponibilidade de água, do
combate às pragas e da polinização promovidos pela existência das áreas
protegidas.
Diante
disso, criar e consolidar a proteção das florestas é um dos
diferenciais que o país tem como alicerce para uma nova economia,
pautada no desenvolvimento de tecnologias e capacidades que valorizem
seu patrimônio natural – uma nova revolução industrial que só está
começando.
Garantia de futuro
Até
2010, o Brasil foi campeão mundial de criação de unidades de
conservação, aumentando significativamente a área sob proteção na
Amazônia. Esse fato ajudou a atrair para o país recursos de diversos
países para a conservação ambiental, o que mostra que a existência
dessas áreas criar fluxos financeiros para manter a biodiversidade.
O
Programa ARPA (Áreas Protegidas da Amazônia) tornou-se nos últimos 15
anos o maior programa de conservação de florestas tropicais do mundo.
Com investimentos internacionais na ordem de 250 milhões de dólares – a
serem combinados com o orçamento público –, o programa investe em boa
gestão de cerca de 114 Unidades de Conservação na Amazônia, totalizando
quase 60 milhões de hectares.
No
entanto, nos últimos anos, unidades de conservação no Brasil passaram a
ser ameaçadas por dois principais fatores: a redução de orçamento para
sua gestão e a contestação dos limites desses territórios protegidos por
setores ligados à mineração, energia e agropecuária.
De
acordo com o recente dossiê publicado pelo WWF-Brasil, em maio de 2017,
cerca de 10% do território dessas unidades de conservação corriam o
risco de serem extintos por pressão desses setores com apoio explícito
do Congresso Nacional.
Atrelar
o destino das áreas protegidas brasileiras a este cenário de ameaça é
condenar o país a um futuro de degradação ambiental e social.
As
áreas protegidas são nossa maior contribuição para conter a perda de
biodiversidade no mundo e a garantia de sobrevivência da nossa espécie.
* Maurício Voivodic é Diretor Executivo do WWF-Brasil
Artigo publicado originalmente no site do Museu do Amanhã.
* Maurício Voivodic é Diretor Executivo do WWF-Brasil
Artigo publicado originalmente no site do Museu do Amanhã.
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