terça-feira, 8 de agosto de 2017

De parque ecológico a lixão


Brasília (DF) - Fazer com que a legislação e outras normativas ambientais sejam atendidas ainda depende fortemente de fiscalização e de outras ações de “comando e controle”. Afinal, benefícios como da manutenção de áreas verdes são de longo prazo e distribuídos nos territórios. Assim, muitas vezes a população não compreende e não valoriza medidas voltadas a regular o uso do solo, que também ajudam a assegurar fontes de água, espaços de lazer e para manter a vida selvagem.

Desta maneira e diante de realidades orçamentárias e políticas cada vez mais desfavoráveis, cresce o desafio dos órgãos ambientais para atender a demandas concretas da sociedade, como o estabelecimento e manutenção de parques urbanos e também para a conservação da biodiversidade, para a regulação do clima e para a manutenção de outros serviços ambientais.

Quando essas pautas não são priorizadas pelas políticas de governo, colhemos situações como a do Parque Ecológico Bernardo Sayão, no bairro Lago Sul de Brasília (DF), que está se tornando um lixão a céu aberto (foto).

Decretada em 2002, a área deveria proteger mais de 200 hectares de Cerrado, incluindo uma nascente que deságua no Lago Paranoá, próxima fonte de água para a população do Distrito Federal. Todavia, vários pontos em seu entorno e todos os espaços acessíveis por veículos estão crivados de restos de obras e de podas, de eletrodomésticos e móveis e de toda sorte de lixo.

A precária situação não faz mal apenas aos olhos. O novo lixão da capital federal serve de abrigo para mosquitos, ratos e outros transmissores de doenças, aumenta as chances de incêndios e de contaminação do solo, pode ferir pedestres e esportistas e é prova cabal do descaso do "poder público" com uma situação repetidamente denunciada por moradores da região e pela academia e que se tornou alvo de Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).

A legislação distrital que trata dos sistemas de áreas protegidas é clara. Parques Ecológicos servem tanto para conservar os ecossistemas quanto para manter espaços voltados ao lazer, recreação e educação ambiental. Todas essas funções estão com os dias contados frente ao abandono do Bernardo Sayão.

Tiro pela culatra, o depósito de lixo, a presença de automóveis em seu interior e outros impactos diretos ao parque cresceram após a interdição da via HI-104 Sul, que ligava a Estrada Parque Contorno (DF-001) à Quadra 27 do Lago Sul por cerca de 600 metros asfaltados, cortando a área protegida.

O trecho foi bloqueado pela Justiça em Agosto de 2015, frente à alegação do MPDFT de que não houve estudos de impacto para a manutenção da estrada após a criação do parque. Todavia, diariamente veículos driblam as barreiras e trafegam por caminhos de terra abertos ao lado da via principal. Tráfego reduzido, falta de sinalização e de fiscalização abrem alas ao despejo incessante de lixo na área verde.

Para o fim do ano passado e frente a um comentado acordo entre Judiciário, Ministério Publico e Governo Distrital, foi anunciado o início de obras para a reabertura do trecho bloqueado há dois anos. Elas incluiriam a instalação de quebra-molas, o conserto de meios-fios, a melhoria na sinalização e até o plantio de árvores nas laterais da HI-104 Sul para a redução de impactos ao Parque Ecológico Bernardo Sayão. Nada foi feito.

Enquanto medidas efetivas tropeçam na morosidade dos imbróglios administrativos, o despejo de lixo e outros danos à área protegida persistem. Sem reação popular e ação do Poder Público, o parque corre sério risco de perder definitivamente a capacidade de cumprir suas funções e, assim, abrir ainda mais espaço para a desabalada ocupação urbana do Distrito Federal.


por Aldem Bourscheit // Jornalista DRT/RS 9781 // jornaldem@gmail.com
- Ativista em Políticas Públicas Socioambientais
- Membro da Comissão sobre Educação e Comunicação da UICN
- Mestrando em Desenvolvimento Sustentável pelo Fórum Latino-america

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