O segundo maior bioma do
Brasil, o cerrado, conta com somente 8% da sua área protegida por
unidades de conservação, um índice três vezes menor do que na Amazônia,
que tem uma cobertura de 27% e área duas vezes maior. A discrepância é
ainda clara quando se leva em consideração que a taxa de desmatamento do
remanescente no cerrado foi cinco vezes maior do que na Amazônia entre
agosto de 2013 e julho de 2015, segundo dados oficiais do governo
brasileiro.
“A criação e a consolidação de unidades
de conservação são uma estratégia importante para a manutenção da
biodiversidade e dos serviços que aquele ecossistema fornece, como
regulação climática e recarga hídrica, além de barrar a expansão de
atividades que colocam em risco esses itens”, explica a diretora de
Ciência do IPAM, Ane Alencar.
Um bom exemplo é o Parque Nacional da
Chapada dos Veadeiros, em Goiás, ampliado em 5 de junho desse ano de 65
mil para 240 mil hectares. Seguindo um pedido antigo de ambientalistas, a
ampliação deve proteger 17 espécies da flora e 32 espécie da fauna
ameaçadas de extinção, de acordo com estudos do Instituto Chico Mendes
de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
O aumento da área do parque nacional é
importante também porque essa zona extra de proteção pode frear o avanço
acelerado do agronegócio na região, que ameaça inclusive comunidades
tradicionais, como os quilombolas (confira o mapa abaixo).
“A região da APA Pouso Alto ainda está
bem preservada, mas enfrenta séria ameaça no avanço crescente do
extrativismo e do agronegócio no nordeste goiano. A ampliação ajuda na
tentativa de frear esse processo e é muito importante para criar essa
barreira”, afirma Alencar. APAs são um tipo de unidade de conservação de
uso sustentável: sua eficiência na proteção ambiental depende de um
plano de manejo bem fundamentado e apoiado por seus moradores.
O parque
Ocupado por diversas comunidades
tradicionais, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros é Patrimônio
Natural da Humanidade pela UNESCO desde 2001 e recebe mais de 60 mil
visitantes por ano. É local propício para o refúgio de fauna em função
de suas nove fitofisionomias típicas do cerrado, incluindo espécies
endêmicas e ameaçadas de extinção, como o pato-mergulhão, o lobo-guará, o
tamanduá-bandeira e a onça pintada e outros.
A área também está inserida no Corredor
Ecológico Paranã-Pirineus, que deve interligar cerca de 100 mil
quilômetros quadrados de remanescentes de cerrado. Segundo contou o
chefe do Parque Nacional, Fernando Tatagiba, ao Portal Brasil, os novos
limites do Parque são fundamentais para conservação porque os grandes
mamíferos se locomovem a grandes distâncias ao longo do dia e essa área
nova abriga ecossistemas que não estavam protegidos, como as matas
secas, que têm alto grau de ameaça, plantas endêmicas e raras.
A área abriga ainda outros ecossistemas
importantes do cerrado, como campos rupestres, matas de galerias, matas
ciliares, palmeirais, campos limpos e campos sujos.
Com a ampliação, houve um crescimento de
333% na cobertura de vegetação nativa protegida (confira mapa abaixo).
As terras inseridas nos limites do parque poderão ser utilizadas nos
termos do Código Florestal para fins de compensação de passivos de
reserva legal em propriedades rurais privadas.
Mas é importante lembrar que atividades
de implantação, operação e manutenção de empreendimentos de geração,
transmissão e distribuição de energia elétrica, além de atividades de
mineração são permitidos dentro da APA, ainda que naturalmente exijam o
licenciamento ambiental, enfraquecido pela bancada ruralista no
Congresso. Pontos bastante polêmicos que revelam: a ameaça segue
presente.
A própria APA do Pouso Alto foi a quarta
unidade de conservação que mais desmatou entre 2013 e 2015, segundo
informações do Ministério do Meio Ambiente. Em todo o cerrado, o
desmatamento registrado em UCs foi de cerca de 112 mil hectares, ou 6%
do total registrado neste período.
Idas e vindas
A expansão do Parque Nacional da Chapada
dos Veadeiros corrige uma demanda histórica e devolve ao parque parte
da sua área original. Quando foi criado, em 1961, ele tinha 625 mil
hectares de área protegida. A primeira redução veio na ditadura militar,
em 1971, que cortou os limites para 171 mil hectares, já atendendo a
pressões do agronegócio.
O governo de Goiás fez jogo duro para
aceitar a atual expansão, tanto que o Ministério Público Federal em
Goiás (MPF-GO) pediu explicações sobre a morosidade do projeto. Segundo o
governo estadual, existiam cerca de 500 proprietários de imóveis
inseridos nos trechos de expansão do parque que precisariam ser
indenizados. A expansão do parque ocorreu após um acordo entre o governo
federal, estadual e o MPF.
Entre os principais pontos, foi definido um
novo desenho do parque que eliminou uma área do município de Nova Roma,
que concentrava o maior número de posseiros e pequenos produtores
rurais. Também ficou definido dispositivos legais que garantem recursos
de compensação ambiental para regularização fundiária, considerando
também o mecanismo de reserva legal previsto no Código Florestal.
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