Gabriel Alves De São Paulo
O surgimento de furacões devastadores como o Irma –que chegou aos Estados Unidos neste domingo (10) depois de uma passagem arrasadora pelo Caribe– está cada vez mais frequente, e esse fenômeno pode estar diretamente associado ao aquecimento global.
A lógica por trás disso, explica o físico Paulo Artaxo, professor da USP e um dos principais nomes da área de mudanças climáticas, não é difícil de entender.
A energia para a formação dos furacões advém principalmente da temperatura da superfície do oceano. No caso, o oceano Atlântico está 4°C acima da média histórica. Outro fator que contribui é a temperatura da atmosfera, que também tem aumentado. Com mais energia acumulada no sistema, os furacões surgem como uma forma de dissipá-la.
Para a agência do governo americano Noaa, que monitora os oceanos e a atmosfera, ainda seria prematuro concluir que alguma atividade humana provoca diretamente o aumento da frequência de furacões, mas, "isto posto, as atividades humanas podem já ter causado mudanças que não são detectáveis tanto devido à pequena magnitude quanto por limitações observacionais".
No entanto, também segundo a agência, "o aquecimento antropogênico [causado pelo homem] no final do século 21 provavelmente vai gerar ciclones tropicais em média mais intensos".
"Se a temperatura continuar aumentando, esses eventos serão cada vez mais comuns e de maior intensidade", afirma Artaxo –o Irma chegou ao Estado americano da Flórida com ventos de 215 km/h, antes de perder força.
Para o especialista, pensar em políticas para evitar ou atenuar esses eventos, além de uma questão científica, é uma questão geopolítica. "Vários países caribenhos vão acabar se inviabilizando como nação –não dá para reconstruir um país por todo ano."
O Caribe e os Estados Unidos, no final de agosto, foram atingidos pelo furacão Harvey, de categoria 4 em uma escala que vai até 5, feita pelo Centro Nacional de Furacões dos EUA.
O prejuízo estimado é de mais de US$ 70 bilhões. Algumas contas já indicam que o Irma, que também atingiu a categoria 5 mas foi rebaixado para 2 neste domingo, pode causar danos que superam os US$ 100 bilhões.
Com recursos dessa mesma ordem de grandeza, diz Artaxo, seria possível dar um bom pontapé inicial para a modernização da matriz energética americana, caminhando para se livrar de combustíveis menos amigáveis ao ambiente, como o carvão e os derivados de petróleo.
Esses setores da economia vêm sendo privilegiados pelo governo do republicano Donald Trump, que escolheu Rex Tillerson, ex-CEO da petroleira Exxon-Mobil, para ser seu secretário de Estado, um dos postos de maior prestígio do governo.
Ao menos outros dois movimentos de Trump desagradaram ambientalistas. Um deles foi a indicação de Scott Pruitt para a agência de proteção ambiental do governo. Pruitt já disse não acreditar que o dióxido de carbono (CO2) seja uma das causas do aquecimento global –algo que é consenso entre os cientistas da área.
Mas o que causou maior repercussão ambientalmente negativa foi a manifestação do desejo, por parte de Trump, de retirar os EUA do Acordo de Paris sobre o clima, que visa limitar o aquecimento global a 1,5°C acima da média do século 20 –evitando consequências mais drásticas para o planeta.
Para Artaxo, a conduta de Trump não indica que ele não entende de ciência climática. Só mostra que ele está disposto a retribuir o apoio da indústria petrolífera e do carvão à sua eleição. "Ele está apenas pagando pelo que recebeu. Nesse sentido, não é muito diferente do que vemos acontecendo no Brasil."
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