Valor Econômico – Alemanha, país-sede da CoP-23, não cumprirá sua meta climática
Por Daniela Chiaretti | De Bonn
A
apenas 50 quilômetros de Bonn, a antiga capital alemã que hospeda até
dia 17 a conferência sobre mudança do clima das Nações Unidas, existe um
buraco gigante e cinzento que, dizem os ativistas, é a maior fonte de
emissões de CO2 da Europa - a mina de carvão de Hambach operada pela
RWE. O carvão e os combustíveis fósseis usados nos transportes são
apontados como os culpados por um grande desconforto no evento: a
Alemanha, país anfitrião da CoP-23, tem pouca chance de cumprir suas
metas climáticas para 2020.
As
estimativas apontam que quase um quinto das emissões de CO2 da Europa
vêm do setor de carvão, e Alemanha e Polônia seriam responsáveis por
metade disso. O país que hospeda a CoP-23 (que é presidida pela primeira
vez por um país-ilha, Fiji) é o maior emissor europeu, com 900 milhões
de toneladas de CO2 equivalente em 2015, sem considerar as emissões pelo
uso da terra. É quase o dobro das emissões da França.
A
Alemanha está comprometida com duas metas, a europeia e a nacional. O
compromisso do bloco europeu é reduzir em 20% as emissões de
gases-estufa em 2020 e em pelo menos 40% em 2030 em relação a 1990.
Neste ponto não há problema. O país já alcançou um corte de 28% nas
emissões.
A
questão é que a Alemanha perdeu seu próprio alvo climático. A meta
alemã é de cortar emissões em 40% até 2020. A ministra do Meio Ambiente
Barbara Hendricks admitiu recentemente que o país precisa de esforços
adicionais para atingir a meta. Seguindo a curva atual de emissões, o
país chegará a apenas 32%. "Se a Alemanha quer permanecer como um líder
climático tem que anunciar imediatamente um plano para fechar usinas de
carvão", diz Lili Fuhr, líder da política ambiental internacional da
Fundação Heinrich Boell, ligada ao Partido Verde alemão.
Para
fechar o intervalo que existe entre a redução atual das emissões e o
que é necessário para atingir a meta, a Alemanha tem que parar de emitir
150 milhões de toneladas de CO2. "Estima-se que isso só pode ser
conseguido a tempo se 20 usinas a carvão forem fechadas", explica Martin
Kaiser, diretor-executivo do Greenpeace Alemanha. "Desistir de 20
usinas de carvão não levará a Alemanha a ter um apagão energético",
continua.
"Para
entender o dilema alemão é preciso olhar o mix energético do país", diz
o cientista social Thomas Fatheuer, autor de vários livros sobre
desenvolvimento sustentável. Na Alemanha, 40% da energia vêm do carvão,
sobretudo o mais poluente deles, linhito. O percentual cresceu muito
para compensar o desligamento das nucleares que ainda respondem por 13%,
diz ele. Energias renováveis são 30% da geração, 12% é gás. "O desafio
agora é substituir carvão por renováveis".
Há
gargalos. A produção eólica é muito forte no Norte da Alemanha, mas não
no Sul e há resistência em atravessar o país com linhas de transmissão.
A Alemanha ainda têm três grandes regiões com extração de carvão, que
emprega entre 15 mil a 30 mil trabalhadores.
"Um
modo eficiente de reduzir a dependência ao carvão é colocar um preço
mínimo de € 30 a € 40 por tonelada de carbono", diz Ottmar Edenhofer,
economista-chefe do Instituto Climático de Potsdam, o PIK. Assim o gás
se tornaria mais econômico e poderia entrar na matriz alemã. "Mas é
preciso que a Europa tome uma medida conjunta para ser eficiente",
continua.
O
outro item da descarbonização alemã é mais sensível - transporte. Na
Alemanha, o lobby da indústria automobilística é comparável ao do
agronegócio no Brasil.
Na
campanha eleitoral, era parte do programa do Partido Verde pedir o fim
dos veículos a combustão a diesel e gasolina até 2025 e o fim do uso do
carvão. Agora, o carvão é tópico importante no debate da coalizão que a
chanceler Angela Merkel tenta fechar para seu próximo governo unindo seu
partido democrata-cristão (CDU) aos liberais do FDP e aos Verdes. Na
semana passada, os Verdes deram sinais de que estavam mais flexíveis no
item sobre carros. "Mas não posso imaginar que saiam de uma negociação
sem um compromisso claro em relação ao carvão, diz Fatheuer.
Na
primeira conferência do clima presidida por um país-ilha, que estão
entre os mais afetados pela mudança do clima, o discurso da quarta-feira
da chanceler Angela Merkel será um momento importante. "A grande
questão é se ela irá permanecer no compromisso dos 40% de redução", diz
Kaiser.
Observadores
da fase de sondagens da negociação da coalizão dizem que membros da CDU
questionam até os dados apresentados pela ciência. Os liberais dizem
que a meta dos 40% não é legalmente vinculante e a Alemanha deveria ser
livrar dela. Para os Verdes, contudo, livrar-se do carvão é ponto
crucial da identidade do partido.
A jornalista viajou a Bonn a convite do Instituto Clima e Sociedade (ICS)
Nenhum comentário:
Postar um comentário