Dal Marcondes 19/12/2018
por Bere Adams, da revista Educação Ambiental em Ação –
Entrevista com Dal Marcondes para a 66ª edição da Revista Virtual Educação Ambiental em Ação
Apresentação: O entrevistado desta edição é Dal Marcondes, um dos
mais importantes jornalistas do país que se dedicam as questões
ambientais. Ele tem especialização em economia e em sustentabilidade com
foco em economia e negócios. É, também, especialista em Ciência
Ambiental pela USP.
Atualmente cursa Mestrado Profissional em Jornalismo
Digital e Modelos de Negócios em Jornalismo Pós Industrial e participa
ativamente de diversas atividades de Militância em Sustentabilidade e
Jornalismo. Além disto, é Presidente da Rede Brasileira de Jornalismo
Ambiental e Vice-Presidente da Associação Profissão Jornalista. É,
ainda, Presidente do Instituto Envolverde e diretor executivo da DAL
MARCONDES Consultoria & Comunicação. Será que teremos algo a
aprender com ele?
Bere Adams – Prezado Dal Marcondes, é uma grande honra tê-lo como o
nosso entrevistado. A sua contribuição será ímpar para todos, e
certamente poderemos aprender muito a partir da sua vasta experiência.
Muito obrigada por aceitar o nosso convite. Normalmente começo as minhas
entrevistas perguntado: como o tema meio ambiente entrou em sua vida?
Algo aconteceu que despertou o seu interesse? Conta pra gente como foi o
seu ingresso nesta temática tão importante e essencial que é meio
ambiente.
Dal Marcondes – Minha relação com o meio ambiente é uma paixão
antiga. Quando eu era criança meus pais saíram de São Paulo e fomos
morar em uma cidade no interior de Goiás. La aprendi a nadar em rio,
andar a cavalo, comer fruta no pé. Depois, em 1974 fui para a Amazônia e
me embrenhei na floresta, no Pará e no Maranhão. Até então, era uma
relação idílica. Quando voltei para São Paulo fui estudar jornalismo, me
tornei repórter e editor de economia. Foi quando compreendi que as
questões ambientais são essencialmente dilemas econômicos. Todos os
problemas socioambientais que enfrentamos no dia a dia têm origem em
decisões de caráter estritamente econômico.
Bere Adams – Qual foi o maior desafio de sua jornada pelo jornalismo ambiental?
Dal Marcondes – Montei a Envolverde em 1995 e o site entrou no ar em 8
de janeiro de 1998. Quando contei a alguns amigos que iria largar a
grande imprensa para me dedicar ao jornalismo ambiental foi um deboche
só. Um amigo me disse que eu estava jogando a minha carreira de
jornalista econômico bem sucedido no lixo. Hoje eu acho que tomei a
decisão certa, não pelo dinheiro, acho que estaria ganhando mais na
grande mídia, mas pela qualidade da minha vida.
Bere Adams – Qual é, para você, a importância da informação ambiental
para lidarmos com os desafios ambientais que se apresentam?
Dal Marcondes – Informação, jornalismo independente e de qualidade
são fundamentais para o desenvolvimento de uma sociedade, de um país e
para a qualidade de vida no planeta. O cuidado que se deve ter é não
confundir ser um jornalista ambiental com ser um militante ambiental. O
jornalista trabalha com dados, fatos, informações e pluralismo de
opiniões. O militante trabalha com causa.
Bere Adams – Temos inúmeros problemas ambientais e não seria possível
abordarmos a cada um. Por esta razão, destaco um deles que é de suma
importância e se trata de um dos grandes desafios que enfrentamos que é o
da falta de saneamento básico, que potencializa a proliferação de
doenças, a desigualdade social, a poluição… Como você percebe esta
lacuna e como a mídia lida com este assunto?
Dal Marcondes – Nenhum país do mundo desenvolvido chegou lá sem antes
resolver as demandas de sua população em água potável e saneamento.
Esse é o principal problema a ser abordado pela sociedade brasileira nos
próximos anos e os números são assustadores. Menos de 50% do esgoto
gerado é coletado, e menos de 25% é tratado. Nossos ecossistemas recebem
seis piscinas olímpicas repletas de merda todos os dias. A mídia dá uma
atenção marginal a esse assunto. Não contabiliza as milhares de
crianças doentes nas filas de postos de saúde sem nenhuma estrutura e
não dá ouvido às pessoas que carregam esse subdesenvolvimento nas
costas. Apenas quando sai uma nova estatística os indignados de plantão
se manifestam.
O apartheid brasileiro se define por quem tem e quem não
tem água e esgoto. No mundo dos políticos esgoto é “obra enterrada”, não
dá voto. Uma mentira que escorrega no tempo e serve de bordão para
desviar o dinheiro para bonitezas que chamam a atenção de eleitores com
torneira e chuveiro.
Bere Adams – Fale-nos um pouco sobre como as questões ambientais devem ser enfrentadas.
Dal Marcondes – As questões ambientais devem ser encaradas e tratadas
em toda a sua complexidade. Não há simplicidade nas relações
ambientais. Os impactos humanos sobre a natureza devem ser continuamente
estudados e mitigados e o equilíbrio das ações deve se dar pela
resultante da aplicação de ciência e tecnologia sobre serviços
ecossistêmicos de forma a garantir o benefício para a sociedade sem
impactar negativamente biomas e ecossistemas. Não é simples, mas já
temos a ciência e a civilidade necessária. O papel do jornalista nesse
cenário é tornar transparente para a sociedade os critérios de cada
decisão e seus impactos e resultados.
Bere Adams – Para você, a Educação Ambiental se relaciona com Informação Ambiental?
Dal Marcondes – Sempre! A educação ambiental oferece ao cidadão os
instrumentos necessários para entender e agir em um contexto de
complexidade e, principalmente, dá os instrumentos necessários para
decodificar as informações ambientais para a tomada de decisão. Há que
se ter em conta que o analfabeto ambiental passará a vida tomando
decisões baseadas em desconhecimento, em incapacidade de cognição com o
ambiente. As pessoas que têm acesso a uma educação ambiental de
qualidade – e isso á mais do que reciclar lixo ou plantar uma florzinha –
terão uma visão de mundo mais integrada e capaz de decodificar a
complexidade ambiental em suas decisões pessoais e profissionais.
Bere Adams – Destaque qual projeto você realizou e que considera mais significativo.
Dal Marcondes – Essa é uma pergunta delicada para alguém como eu que
tem mais de 40 anos como jornalista. Mas, acho que minha contribuição
para o jornalismo ambiental, a criação da Envolverde e o fortalecimento
da Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental estão entre as coisas que
considero um legado profissional. Porém, ainda há muito a ser feito.
Neste momento estou estudando modelagem de negócios para o jornalismo
digital, porque acredito que nos próximos anos o jornalismo em
ecossistema digital terá um papel estrutural para a sociedade. Além
disso, as novas plataformas digitais e redes sociais precisam da atuação
de jornalistas bem formados e remunerados por projetos capazes de se
sustentar. Essa é a parte da minha militância pelo jornalismo.
Bere Adams – Você está a frente da Envolverde, uma das revistas de
jornalismo e sustentabilidade mais importantes do Brasil. Conte-nos um
pouco sobre a sua trajetória com este informativo tão relevante.
Dal Marcondes – A Envolverde entrou no ar em 8 de janeiro de 1998, há
20 anos, portanto. Um estudo de uma universidade norte-americana
identificou a Envolverde como o mais antigo projeto de jornalismo nativo
digital em operação no Brasil. São duas décadas de invenções, inovações
e reinvenções em todos os sentidos. Tecnologias que mudam com o passar
do tempo, formatos de entrega das notícias, pautas, enfim, não há muita
rotina. O importante é o esforço cotidiano para manter a relevância dos
temas e pautas de nossas reportagens.
Bere Adams – Qual é a contribuição da Envolverde para o desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental?
Dal
Marcondes – Acho que a informação que oferecemos cotidianamente tem
ajudado muitos educadores ambientais e formular suas ações, estratégias e
aulas. E queremos fazer mais, oferecer instrumentos mais adequados para
o uso em turmas das mais diversas idades e interesses. Vamos ver se
avançamos mais nisso.
Bere Adams – Com tanto tempo trabalhando em veículos de comunicação
ambientais, quais avanços você poderia destacar, de forma geral, na área
ambiental?
Dal Marcondes – Hoje há muito mais informação sobre temas ambientais
do que a 20 anos, quando comecei nessa área. Há mais profissionais de
jornalismo que se interessam em obter uma melhor qualificação para
tratar do tema meio ambiente, com cursos de especialização e mestrado em
ciência ambiental, gestão ambiental, economia ambiental etc. Mesmo os
grandes veículos também dão mais atenção ao assunto, a pauta ambiental
deixou de ser uma pauta esporádica e tornou-se um assunto de economia.
Há profissionais trabalhando em organizações sociais que se
especializaram em temas específicos, como clima, água, poluição,
Amazônia, Oceanos e muitos outros. Em suma, há mais gente olhando para o
meio ambiente.
Bere Adams – Estamos em tempo de mudanças de governo. Resumidamente,
quais são as suas expectativas sobre como será tratada a Política
Ambiental?
Dal Marcondes – Esse é um tema de muita apreensão. A perspectiva não é
boa e por isso os jornalistas e os profissionais da área ambiental em
geral devem estar atentos para avaliar e trabalhar sobre a realidade com
a velocidade dos acontecimentos. Não dá para pré-julgar, mas também não
há um horizonte de otimismo.
Bere – Para finalizar, deixa uma frase, uma ideia que possa servir de inspiração para nossas leitoras e nossos leitores.
Dal Marcondes – Temos grandes desafios em termos de sobrevivência,
principalmente neste século. Este será um período decisivo para a
história humana, quando temos ciência, tecnologias e conhecimentos para
tornar o futuro um bom lugar para se viver. Nossas decisões cotidianas
nos dirão como será esse futuro e como irão viver nossos netos e
bisnetos.
A humanidade é uma espécie ainda na infância, temos menos de 5 mil
anos do início da civilização, 2 mil anos desde o surgimento do
cristianismo, pouco mais de 500 anos da invenção da prensa, 200 anos da
revolução industrial, pouco mais de 100 anos do automóvel e do avião, 70
anos da televisão, 15 anos dos smartphones… Há espécies na terra que
estão aqui há milhões de anos, temos ainda muito a aprender.
Bere – Prezado Dal Marcondes, nós da equipe da revista, agradecemos
pela oportunidade de conhecer melhor o seu trabalho, a sua jornada e as
peculiaridades que envolvem o jornalismo ambiental. Fica evidente a
importância da informação como referencial fundamental para o
desenvolvimento de ações de Educação Ambiental que promovam as mudanças
de atitudes para um futuro mais sustentável, muito obrigada! Parabéns e
desejamos-lhe cada vez mais sucesso! (#Envolverde)
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