Tocantins vende terras públicas invadidas a R$ 3,50 o
hectare
Valor é o mais baixo entre os estados da Amazônia, revela
estudo do Imazon. Além do preço irrisório, Tocantins tem pior colocação no ranking
de transparência
17 de setembro de 2021
Invasores de terras públicas do estado do Tocantins podem
regularizar as áreas ocupadas ilegalmente pagando valores irrisórios por elas.
A média do preço da terra cobrado pelo estado para fins de regularização
fundiária é de R$ 3,50 o hectare (10 mil m²), sendo que, em alguns casos, com
R$ 1 o grileiro pode ter a posse definitiva da área invadida e desmatada.
As informações constam no relatório “Leis e Práticas de Regularização Fundiária no Estado do
Tocantins”, produzido pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
(Imazon).
A média do valor cobrado pelo estado para regularização
representa apenas 0,4% do Valor da Terra Nua (VTN) praticado pelo INCRA e
ínfimos 0,04% do valor médio de mercado no Tocantins.
Para comprar uma área privada de 1 hectare no marcado de
terras do estado, o interessado deverá desembolsar R$ 8.714,74, em média. Já
para regularizar, por meio de compra, uma área federal que foi ocupada, o
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agraria cobra R$ 930 por hectare.
Os preços praticados pelo órgão fundiário estadual, o
Instituto de Terras do Tocantins (Itertins), são os menores entre os estados da
Amazônia Legal, situação que serve de estímulo para a ocupação ilegal de terras
públicas e consequente desmatamento, aponta o relatório do Imazon.
Outros problemas
Além dos preços irrisórios cobrados pelo Tocantins, o
relatório levanta outros problemas alarmantes nas normas e nos sistemas de
regularização fundiária do estado.
Não constam nas leis estaduais, por exemplo, data limite ou
tempo mínimo de ocupação para que terras ocupadas sejam passíveis de
regularização. Isso significa, na prática, que a grilagem de terras pode
ocorrer a qualquer tempo, até mesmo no futuro.
A lei federal estabelece a data de 22 de julho de 2008 como
marco temporal para ocupações de terras da União. Os estados têm autonomia para
definir suas datas, sendo considerada ilegal qualquer ocupação que ocorra em
terras públicas estaduais após o marco temporal definido nas suas leis
fundiárias.
Não ter um marco, como é o caso do Tocantins, torna as áreas
públicas mais vulneráveis à grilagem. “É um estímulo para continuidade da
ocupação de terras públicas para fins de apropriação”, diz o documento.
A estado do Tocantins também não impede a titulação para
requerentes que apareçam na lista de trabalho análogo à escravidão e não prevê
a perda do imóvel titulado no caso de ocorrência desse tipo de situação após a
regularização.
A legislação fundiária tocantinense também não exige
compromisso de recuperação de áreas ilegalmente desmatadas no imóvel antes da
titulação ou como condição para manutenção do título após a regularização. Além
disso, não há qualquer impedimento para regularizar áreas desmatadas
recentemente.
Ausência de transparência
Todas as informações fundiárias do estado do Tocantins só
foram possíveis de serem compiladas e analisadas após muito trabalho do Imazon.
Isso porque o estado ficou na pior colocação de transparência ativa entre oito
estados da Amazônia Legal analisados pelo Instituto. Dos indicadores avaliados,
79% estavam ausentes e 9% apresentavam-se de maneira parcial.
A falta desses dados se agrava com a ausência de instâncias
de participação pública para acompanhamento das ações do órgão de terras. A
falta de transparência e participação social fazem com que a sociedade não
saiba quais áreas públicas estão sendo privatizadas e quem está recebendo
títulos de terra emitidos pelo estado.
Situação fundiária no Tocantins
Segundo levantamento do Imazon, 34% do estado do Tocantins
(12,6 milhões de hectares) são áreas não destinadas ou sem informação de
destinação. O governo estadual afirma que esta área seria um pouco menor,
totalizando cerca de 9 milhões de hectares.
Do total da área sem informação, 83% (ou 28% do estado)
seriam de responsabilidade do governo estadual. De acordo com funcionários do
Itertins, 80% das áreas estaduais ainda precisam ser arrecadadas (incorporadas
ao patrimônio público estadual) e boa parte das áreas já arrecadadas e
matriculadas pelo estado ainda precisa ser georreferenciada para determinar sua
localização precisa.
Além das áreas sem destinação, 48,5% do estado é ocupado por
imóveis privados, 9,5% por Terras Indígenas, 4% por Unidades de Conservação
(exceto Áreas de Proteção Ambiental) e 4% por Projetos de Assentamento.
“O tema da indefinição fundiária na Amazônia está sendo discutido hoje por diferentes públicos e fóruns nacionalmente, devido à relação entre desmatamento e grilagem de terras. Porém, é necessário compreender como as leis e práticas fundiárias contribuem com o desmatamento. Com esse relatório, auxiliamos esse processo de compreensão dos desafios e recomendamos o que pode ser feito para que a União e os estados adotem leis e práticas fundiárias que contribuam com a conservação e redução de conflitos no campo”, explica a pesquisadora Brenda Brito, coordenadora do trabalho.
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