terça-feira, 13 de janeiro de 2015
(Valor Econômico, hoje) A nova regra para acesso ao
seguro-desemprego - que muda o prazo de carência para a concessão do
benefício de seis para 18 meses para quem o requisita pela primeira vez -
tem potencial para deixar mais da metade dos trabalhadores demitidos
sem justa causa sem acesso ao benefício.
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) compilados pelo Valor
e pelo professor da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos
mostram que, entre janeiro e novembro de 2014, 63,4% dos 10,8 milhões
dispensados sem justa causa no país tinham menos de um ano e meio de
serviço.
O percentual é uma estimativa aproximada do número de pessoas
que, de acordo com as regras anunciadas no fim do ano passado, não terão
acesso ao benefício, já que não leva em conta se o trabalhador está
sendo demitido pela primeira vez - e, nesse caso, quanto tempo ele
passou nos empregos anteriores.
Pela legislação antiga, que estabelecia o limite mínimo em seis meses
de trabalho, o percentual de "excluídos", feitas as ressalvas
anteriores, era de 21,5%. Levando em conta os números de 2013, o cenário
é semelhante, com 22% das demissões concentradas em funcionários com
até 5,9 meses de trabalho e 63,7% até 18 meses.Para Ramos, a estrutura não é exclusiva dos dois anos anteriores -
ela reflete as características de uma economia com alta rotatividade no
mercado de trabalho. "O tempo médio de permanência no trabalho no Brasil
é de três anos."
A mudança, diz Hélio Zylberstajn, professor da FEA-USP, afetará
principalmente os mais jovens, que mudam de emprego com maior frequência
até se estabelecerem no mercado de trabalho. De acordo com os números
do Caged, 78% dos dispensados sem justa causa com até 17 anos entre
janeiro e novembro estavam há até 11,9 meses no serviço. No grupo entre
18 e 24, o percentual é de 58,1%. Na faixa entre 25 e 29 anos, cai para
48% - e segue em queda, atingindo 27,1% entre os trabalhadores com mais
de 65 anos (desagregado por idade, os dados públicos divulgados pelo
Caged não têm a divisão de até 18 meses).
Para Rodrigo Leandro de Moura, da Fundação Getulio Vargas (FGV), a
exigência da permanência maior no serviço pode incentivar especialmente
os jovens - mas também as demais categorias de trabalhadores - a
permanecer no emprego por mais tempo. "As empresas gastam muito para
treinar novos funcionários. Uma mudança como essa poderia ajudar a
aumentar a produtividade da economia", diz.
Neste ano, entretanto, em que a expectativa é que a taxa de
desemprego suba e se aproxime de 6% - a estimativa da FGV está entre
5,6% e 5,7% -, muitos desses jovens podem ficar sem emprego não por
opção, mas pelos desdobramentos da conjuntura. Nesse caso, pondera o
economista, eles ficarão mais dependentes dos pais e poderão contribuir
para uma desaceleração mais forte da renda familiar. Levando em conta a perda de fôlego do mercado de trabalho esperada
para este ano, a FGV projeta variação da renda média real de apenas
0,1%, contra alta real de aproximadamente 2,8% observada em 2014.
Segundo o economista da FGV, os dados do Caged não contabilizam
apenas aqueles que estão sendo demitidos pela primeira vez. Como a nova
regra estabelece o prazo de um ano de tempo de serviço para quem recorre
ao seguro pela segunda vez e de seis meses para quem pedi-lo pela
terceira vez, o percentual de "excluídos" deve ser um pouco inferior aos
63% revelados pelos dados, ressalva Moura.
Além disso, de acordo com o texto da Medida Provisória 665, de 30 de
dezembro, para recorrer ao seguro pela primeira vez não é preciso
cumprir um ano e meio de trabalho consecutivo, mas ter a carteira
assinada por 18 meses acumulados no decorrer dos 24 meses anteriores à
demissão. As regras começam a valer 60 dias após a publicação da medida
provisória. Para Moura, no antigo formato, o seguro-desemprego dava um "incentivo
perverso" para que os trabalhadores mudassem com maior frequência de
emprego. "Essa troca deve ser pelo menos protelada", diz.
Ramos, da UnB, avalia que as novas medidas - tomadas mais para
resolver uma questão fiscal do que para ajustar a alocação de mão de
obra, diz - devem coagir uma fraude recorrente no seguro, em que
funcionário e empresa combinam uma demissão temporária para que o
trabalhador tenha acesso ao benefício e, muitas vezes, também ao FGTS.
A mudança, para ele, não deve reverter a rotatividade alta observada
no mercado de trabalho - que seria, afirma o professor, uma decorrência
da baixa qualidade de grande parte das vagas geradas pela economia
brasileira. "Essa troca de emprego geralmente se dá entre quem não tem
muita opção de escolha", afirma.
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