13/01/2015
às 16:11
O
Brasil é mesmo um país sui generis, com particularidades bem
extravagantes. Uma delas deu certo: a jabuticaba. Só prospera por aqui e
é uma delícia. O resto, como não se cansa de dizer por aí, é besteira e
fabrica o nosso atraso. Em nenhum outro país do mundo, liberais
empedernidos servem a governos de esquerda, nominalmente ao menos. Em
tese, teríamos essa particularidade. Todos sabemos que Joaquim Levy,
novo ministro da Fazenda, chegou para, digamos, refazer as pazes entre o
governo Dilma e o mercado.
Levy
participou nesta terça de um café da manhã com a imprensa. Deixou claro
que é mesmo diferente do esquerdista Guido Mantega, seu antecessor.
Chamou o mandato em curso de Dilma de “segundo tempo”, afirmou que houve
um “empate em zero a zero” no primeiro — não especificou quem era o
adversário — e disse ser chegada a hora de marcar gol. Para quem está à
caça de frases de efeito, decarou com pompa: é a iniciativa privada que
toca o país. Beleza! Tudo no lugar!
Sob Levy,
está claro, mudanças importantes serão operadas na economista, também no
quesito despesas. As barbeiragens cometidas no setor elétrico no
primeiro mandato de Dilma tendem a ser corrigidas agora. Cessará o
subsídio ao setor, e o consumidor tenderá a pagar pela energia algo mais
parecido com o que ela custa. É ruim? Para quem paga, é. Mas é
necessário. Um país começa a se danar quando os preços entram em
parafuso.
O governo
decidiu também dar uma paulada na bagunça do seguro-desemprego, como se
pode ler posts abaixo. Ninguém ignora que o benefício se transformou
numa forma de captação de recursos públicos, a um custo bilionário. E
poderíamos dizer, então: “Eis aí o liberal Levy! Ele serve a um governo
que se diz de esquerda, mas está fazendo a coisa certa”.
Pois é.
Ocorre que o “liberal” — ou “neoliberal”, como querem alguns — Levy
também está preocupado com a arrecadação, não é? Sim, eu acho isso
justo. Aliás, se o Brasil voltar a crescer, se gastar menos na
administração da própria máquina, se desperdiçar menos dinheiro, se
puser fim à corrupção, é certo que arrecadará mais. Ocorre que o homem
anda com outras ideias.
Ele está
de olho no bolso dos prestadores de serviço e disse que vai analisar a
situação das “pessoas que têm renda através de pequena empresa, que
pagam 4%, 5% de imposto em vez de 27,5%”. Ou seja: o senhor Joaquim Levy
está empenhado agora em tirar salário — porque é disto que se trata —
de uma fatia da classe média. A classe média, leitores, é aquela gente
que sempre paga a conta no Brasil.
Espera-se
que o senhor Joaquim Levy se lembre de que os ditos “prestadores de
serviço”, que atuam como pessoas jurídicas, não gozam de benefícios que
oneram tanto o estado como as empresas com as quais mantêm contrato.
Elevar o imposto pago por esses profissionais vai, sim, lhes roubar
renda, sem que voltem a ter nenhum dos benefícios dos quais abriram mão.
Mais: o governo pode estar dando um tiro no pé, estimulando a
informalidade.
Em nenhum
país do mundo, um liberal proporia tomar dinheiro da sociedade —
especialmente da camada que impõe maior dinamismo na economia — em favor
de um estado perdulário — todos são; o brasileiro é mais. Com que
discurso Levy vai bater a carteira da classe média? Também ele vai
brincar de luta de classes, a exemplo de seus neocompanheiros do PT?
Aliás,
para onde vai um governo que decide ampliar o “Supersimples” e que, ao
mesmo tempo, demonstra a disposição de tungar seus eventuais
beneficiários — o que, convenham, nem o esquerdista Guido Mantega
decidiu fazer?
Que país
sui generis! O comunista do Brasil, Flávio Dino, novo governador do
Maranhão, diz que seu Estado precisa de um choque de capitalismo. E o
liberal Joaquim Levy alimenta delírios confiscatórios. Isso tudo poderia
parecer engraçado. Mas isso tudo é só parte do nosso atraso e na nossa
miséria, também intelectual e política. Espero que as oposições não se
deixem encantar pelo dito conservadorismo do sr. Levy e se organizem
para impedir um novo assalto a uma fatia da sociedade que já paga a
conta.
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