segunda-feira, 22 de junho de 2015

Armadilha fiscal - MÍRIAM LEITÃO


O GLOBO - 21/06
 
A crise piorou, e ficou claro que será necessário da equipe econômica mais do que ela tem sido conseguido. Na semana passada, todos os indicadores pioraram, e alguns, mais do que era previsto. As medidas provisórias enviadas ao Congresso não eram o ajuste fiscal necessário. Para piorar, serviram de pretexto para o aumento de despesas como a da Previdência, que já é deficitária.

O plano dos ministros da área econômica era, no início do segundo mandato da presidente Dilma, tomar medidas fiscais duras, assumir o compromisso com uma meta de superávit primário que seria forte, mas factível, e que subiria ao longo dos próximos anos. Além disso, apertar a política monetária. O plano era este. A consequência seria uma queda do nível de atividade, mas que seria seguida por uma recuperação rápida, pela reconquista da confiança no meio empresarial.

A confiança não veio, as medidas fiscais foram diluídas no Congresso, foi colocada uma armadilha em uma das medidas provisórias, e o governo está preparando o anúncio da redução da meta fiscal porque já sabe que não conseguirá atingir 1,2% do PIB. Os ministros descobriram que o buraco era maior do que eles haviam calculado, e a desaceleração está sendo mais profunda, encolhendo as receitas.

A sexta-feira foi particularmente difícil pela série de indicadores divulgados, mostrando o difícil quadro econômico. A inflação pelo IPCA-15 chegou a 8,8% em 12 meses e 6,28% até junho. A atividade econômica encolheu em abril, pelo dado do Banco Central. O desemprego no mercado formal aumentou, segundo o Ministério do Trabalho. Foi uma sucessão de más notícias. A inflação em junho normalmente é baixa, mas desta vez veio quase em 1%, o que é um espanto.

O quadro internacional também não ajuda. A situação da Grécia piorou muito na última semana e começou uma corrida bancária no país diante da previsão de que seja impossível entrar em um acordo dos credores com o governo Alexis Tsipras. Ocorreram saques na última semana de mais de € 3 bilhões. No caso da Grécia, o que assusta é o desfecho possível de sua saída da Europa.

Nos Estados Unidos, o que pode nos atingir é a força da economia americana, que elevará as taxas de juros já no segundo semestre, e isso pode fortalecer mais o dólar, com várias repercussões no Brasil, inclusive com um impacto inflacionário.

O que realmente comprovou a dificuldade da conjuntura foi o caso da Previdência. O governo fez uma proposta modestíssima. Era apenas para acabar com a pensão vitalícia das viúvas jovens. O ganho imediato seria pequeno. A equipe avaliou mal o que poderia acontecer com um tema como esse dentro de um Congresso rebelado. Diante da baixíssima popularidade da presidente, o Congresso tem construído sua própria agenda. Em ambiente assim tão fluído é melhor nem apresentar proposta que pudesse ser usada para outros fins.

Foi o que aconteceu. O Congresso começou ampliando o tempo de duração das pensões das viúvas jovens em relação ao projeto do governo. Mas isso seria apenas um caso normal nesse tipo de tramitação. O pior foi a inclusão do sistema de aposentadoria 85/ 95. O governo enfraquecido fez apenas uma alteração na fórmula, incluindo a progressividade, que não resolve o fato de que ela representa mais gastos para o Tesouro do que a situação atual.

Agora criou-se uma situação complicada. No Congresso, tramitará o veto, que pode ser derrubado, e a MP, que tem um prazo para ser votada e que incluiu a progressividade. Mesmo se o governo ganhar todas as batalhas, ou seja, não ter o veto derrubado e ver aprovada a sua MP, o país será o único do mundo que, no meio de uma crise fiscal, sob risco de rebaixamento da sua nota de crédito, com ampliação da expectativa de vida, vai aumentar o ganho dos que se aposentam com menos de 60 anos. É um sinal totalmente trocado.

O Tesouro é um só, as demandas são muitas, os cortes prejudicaram várias áreas. Se aumentar o custo da Previdência, que já tem déficit, terá que haver cortes em outras áreas. O país já está cortando no essencial.

O ajuste fiscal não está dando certo. A recuperação da confiança não está ocorrendo, e o país está em recessão com inflação subindo.


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