Apesar de pequena, a cidade de Haia, na Holanda, está acostumada a
lidar com assuntos importantes: ela abriga o Tribunal Internacional de
Justiça, o Tribunal Internacional Criminal e outras cortes que analisam
crimes e massacres em regiões tão longe dali quanto os Bálcãs, o Líbano e
Ruanda.
A comissão nasce com o mandato de perseguir caçadores ilegais e contrabandistas de espécies ameaçadas em todo o mundo, mas pretende ser o principal mecanismo internacional para expôr quadrilhas que atuam internacionalmente no tráfico de animais – encabeçadas por empresários multimilionários, semelhantes aos chefes de cartéis do narcotráfico e aos grandes mafiosos.
O tráfico de animais é um negócio que gera cerca de US$ 17 bilhões (R$ 53 bilhões) por ano e é também o quarto maior crime transnacional no mundo – depois do narcotráfico, da falsificação e do tráfico de pessoas –, segundo o grupo ativista americano Global Financial Integrity.
"Estas organizações criminosas são transacionais, assim como as que atuam em outras formas de tráfico, seja de armas ou de drogas. Elas têm recursos e conexões para expandir seus negócios por todo o mundo, sabem como fazê-lo e a quem subornar e são ligados a políticos e empresários locais", diz Andrea Costa, um dos membros fundadores da WJC.
Especialistas afirmam que o comércio ilegal de animais selvagens anda de mãos dadas com crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.
Leia mais: Como o fascínio da humanidade com o 'rei dos animais' acabou com uma espécie
Apetite por rinocerontes
Da caça ilegal de rinocerontes à pesca de atum, do comércio de marfim à derrubada de madeira: inúmeras espécies de animais e vegetais são ameaçadas pelos crimes contra a vida selvagem.O comércio ilegal está em alta devido a uma demanda crescente, especialmente do sudeste da Ásia e da China.
O caso do rinoceronte africano ilustra o problema: em apenas sete anos, a caça ilegal destes animais na África do Sul – que abriga o maior número destes animais – cresceu quase 100 vezes (de 13 rinocerontes mortos em 2007 a 1.215 em 2014).
"Se não fizermos nada, rinocerontes selvagens deixarão de existir ainda nesta década", diz um relatório da WJC.
Cerca de 80% dos chifres contrabandeados desde 2010 saem do Parque Nacional Kruger, na África do Sul, e viajam por Moçambique, segundo a unidade de combate à caça ilegal do parque.
A queratina, proteína da qual são feitos os chifres, é usada na medicina tradicional asiática para tratar desde ressaca até doenças terminais.
Apreensões durante as seis semanas da operação global "Cobra 3":
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4,3 toneladas de marfim da República Democrática do Congo, achados na Tailândia
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511 peças de marfim escondidas em 220 sacos de folhas de chá do Quênia
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90 quilos de coral encontrados na Espanha
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500 quilos de enguias congeladas achados na Polônia
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16 costelas de baleia encontradas na Holanda
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10.000 cavalos marinhos e 400 tartarugas russas encontradas no Reino Unido
Além de rinocerontes, tigres e elefantes, animais menores – como pangolins, cágados, esturjões, salamandras, tatus, corais e cobras – são ameaçados pelo comércio ilegal.
Leia mais: O tráfico de chifres que valem mais que ouro
Leia mais: Elefantes podem ser extintos em cem anos na África
Comissão supranacional
O objetivo da WJC é lutar com novas armas, já que a perseguição aos caçadores ilegais não é mais uma tarefa apenas para patrulheiros locais. Agora, é preciso usar novas tecnologias, como GPS e análise de DNA, para rastrear carregamentos de materiais ilegais pelo mundo e descobrir de onde eles vêm.Meses antes de abrir as portas oficialmente, os membros da WJC trabalham produzindo "mapas de fatos" – como chamam seus dossiês – sobre dois dos principais comércios ilegais: marfim e chifres de rinocerontes.
A comissão de direitos dos animais pretende preencher as lacunas entre os países lidando com este tipo de crime transnacional.
A questão agora é como pôr em prática as decisões da comissão. Diferentemente dos outros tribunais em Haia, a WJC não consegue realizar julgamentos, apenas audiências públicas.
Além disso, ela não pode ordenar prisões e suas recomendações não têm força de lei.
Segundo os membros do grupo, a estratégia é a exposição dos culpados: reunir dados e divulgá-los pode responsabilizar os governos e, com sorte, ajudar a salvar as espécies em perigo.
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