CARTA ABERTA AO GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL
Excelentíssimo Governador,
As reformas anunciadas pelo atual Governo de Brasília têm
impactos maiores que a simples solução de problemas orçamentários e
financeiros As consequências na área socioambiental serão avassaladoras,
caso haja apenas fusão de Secretarias do GDF. Principalmente, porque as
questões ambientais sempre foram vistas como externalidades ao desenvolvimento
do Distrito Federal e tratadas em segundo plano nas agendas dos governantes.
Por conseguinte, há um passivo que só cresce no Território.
Acresce que há um grande abismo das atuais políticas
públicas referentes às áreas ambiental, urbana, rural e social, se levarmos em
consideração as agendas nacionais e internacionais. É necessário nos inserir
nos planos e metas que tratam da erradicação da pobreza, segurança alimentar e
agricultura, mudanças climáticas, cidades sustentáveis, proteção e uso
sustentável dos ecossistemas terrestres e aquáticos, crescimento econômico
inclusivo, infraestrutura e industrialização, governança e meios de
implementação.
Destacamos os pontos-chave que julgamos imprescindíveis de
serem tratados pelo governo, os quais possuem dimensões distintas, mas precisam
ser compatibilizados no espaço geográfico, quais sejam:
1. PATRIMÔNIO
HISTÓRICO NACIONAL E CULTURAL DA HUMANIDADE - Sob o ponto de vista de
sua preservação, existe a preocupação com relação ao que o Governo do Distrito
Federal divulgou, recentemente. Tem a intenção de retomar as discussões sobre a
“revisão” do PDOT-DF, a retomada do Plano de Preservação do Conjunto
Urbanístico de Brasília – PPCUB e a Lei de Uso do Solo – LUOS, instrumentos
esses de planejamento e controle do uso do solo previstos na Lei Orgânica
do DF;
2. PLANO DE ORDENAMENTO
TERRITORIAL DO DF – PDOT - aprovado e vigente, não atendeu aos
interesses públicos, de proteção à biodiversidade do Cerrado e à preservação de
Brasília, Patrimônio Mundial, e os demais instrumentos, decorrentes do
primeiro, estão sobre os mesmos princípios: não possuem sustentação
técnico-científica, desrespeitam convenções e acordos internacionais, assumidos
pelo governo brasileiro, e a favor do lucro fácil, para aqueles que não têm
compromisso com Brasília, Capital do país e Patrimônio do Distrito Federal e da
UNESCO;
3. ZONAS-NÚCLEO DA
RESERVA DA BIOSFERA DO CERRADO - Uma enorme pressão de urbanização no
entorno do Parque Nacional de Brasília, da Estação Ecológica de Águas Emendadas
e da Estação Ecológica do Jardim Botânico, tem provocado a fragmentação da
vegetação dessas unidades de conservação. Por conseguinte, há um aumento
do efeito de borda que resulta na perda da biodiversidade, aumento das espécies
exóticas nas UCs, aumento da temperatura, favorecendo essas áreas a terem maior
propensão à queimadas. Sem contar a descaracterização da área rural. Tudo isso
inviabiliza tanto as zonas-núcleo da Reserva da Biosfera quanto as zonas de
amortecimento e transição, que são a base territorial para se desenvolver o
Programa Man and Biosphere, da UNESCO;
4. COMPATIBILIZAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO
E GESTÃO TERRITORIAL/AMBIENTAL: há anos se sabe que é preciso integrar os
instrumentos de Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) + ZEE do Entorno do DF +
PDOT + Zoneamento Ambiental das UCs existentes e elaborar o Zoneamento
Ambiental da Reserva da Biosfera do Cerrado. Sem isso, não se avança no
desenvolvimento sustentável do DF. Fica-se na “esquizofrenia” de elaboração de
instrumentos de planejamento e gestão de forma isolada, mas não se avança sobre
um “olhar sistêmico sobre as questões urbanas, ambientais, sociais, econômicas
e culturais”.
5. LICENCIAMENTO AMBIENTAL –
como a área ambiental ainda é tratada como impeditiva do desenvolvimento,
procura-se um vilão. E este recai naturalmente sobre “facilitar o processo de
Licenciamento Ambiental, tornando-o mais flexível”.
6. SISTEMA DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS
7. CONTROLE SOCIAL POR MEIO DOS CONSELHOS DE POLÍTICAS
PÚBLICAS
Considerando que os pontos acima são fundamentais para
termos planejamento e gestão territorial/ambiental e cultural dentro das bases
da legalidade e da sustentabilidade, preocupa-nos a decisão do Governo de
fundir as Secretarias de Meio Ambiente e de Gestão Territorial e Habitação.
Afinal, pode-se iniciar um caminho que inviabilize e até retroceda as mínimas
conquistas socioambientais e culturais que tivemos. E graças, em boa parte, à
participação ativa da sociedade civil organizada ao longo de quase três
décadas.
Defendemos a existência e a independência da Secretaria de
Meio Ambiente, que é conduzida de forma competente pelo Sr. André Lima.
Contudo, diante da impossibilidade de manter aquela Secretaria mais autônoma,
em função de problemas orçamentários, entendemos que o novo modelo de gestão
deve existir. Mas é preciso que ele seja despersonalizado, nos
moldes de três setores (Agricultura, Meio Ambiente e Gestão Territorial) dentro
de um só. Isso poderá trazer incontáveis avanços na transversalidade de
objetivos, metas, programas e planos, tendo a Sustentabilidade como ponto focal
das políticas públicas agrícolas, ambientais e territoriais. Assim, se avança
na visão sistêmica, embora o processo decisório seja diferenciado.
No Governo Arruda, as disputas políticas geraram a
existência de um super Secretário à frente da Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente – SEDUMA, quando foi criado algo
semelhante do que propõe o atual governo. Além da estrutura gigante, com
a incapacidade de conciliar princípios sustentáveis com avanços econômicos. E,
de forma proposital, houve o abandono da condução dos Conselhos de
Políticas Públicas, exatamente por haver um só secretário. Os
resultados dessa fusão resultaram em incontáveis prejuízos para o Distrito
Federal vivenciados até hoje. O ponto máximo dessa fusão foi a necessidade de
intervenção do Ministério Público do DF e Territórios, devido ao total
desrespeito às normas de licenciamento vigentes para os novos empreendimentos.
Pelo exposto, acreditamos, no entanto, que se este Órgão
Gestor da Sustentabilidade do Território (nome que sugerimos) poderia
ser dirigido por um conselho composto pelos três responsáveis pelas políticas
públicas: agrícola, ambiental e urbana/territorial. Com um regime de consenso e
a responsabilidade de coordenação por um deles. Neste caso, nossa
recomendação recai pelo Sr. André Lima. Acreditamos que tal solução
poderia trazer resultados efetivos, estruturantes e de longo prazo. E iria
descaracterizar uma possível predominância de um dos setores. Não haveria atropelamento
de “demandas”, como ocorreu na nefasta Administração Arruda.
Sendo assim, em princípio, propomos que não haja a
incorporação da Secretaria de Meio Ambiente às demais. E, caso isso ocorra, que
seja criado uma espécie de Órgão Gestor da Sustentabilidade do
Território (ou qualquer outra sigla), o qual seja composto pelas
SEMA, SEGETH e SEAGRI.
Que esse novo arranjo institucional seja inovador no
planejamento territorial/ambiental, com visão sistêmica e organicamente
articulada de gestão urbana, rural e ambiental. E que crie as condições
para que haja de fato práticas sustentáveis, com ampliação da governança e
controle social. Ao mesmo tempo, que respeite as especificidades de cada setor
econômico e demandas das regiões administrativas e que seja capaz de articular
as políticas públicas, com vistas a uma ação mais integradora do Distrito
Federal.
Gostaríamos que fosse assegurada a manutenção de iniciativas
importantes desenvolvidas pela SEMA, as quais não eram tratadas em governos
anteriores, dentre elas as pastas de Clima, Energia, Direitos Animais, e de
Cerrado, bem como as suas respectivas instâncias de participação social: GT
Clima, Brasília Solar, Comitê Interinstitucional da Política Distrital para os
Animais – CIPDA e GT Recupera Cerrado – Aliança Cerrado.
Por último, que a fusão pretendida pelo governo em
definitivo trate do que é essencial para a preservação, como diria Lucio Costa
em relação a Brasília: “Capital do país, Patrimônio Mundial”. E, ao mesmo
tempo, integradora com o Programa da Reserva da Biosfera do Cerrado da UNESCO
que, infelizmente, no momento, está sob ameaça da perda do título.
Assinam:
Fórum das ONGs Ambientalistas do DF e Entorno
Frente Comunitária do Sítio Histórico de Brasília e Distrito
Federal
Instituto Pactos de Desenvolvimento Regional Sustentável
União Planetária - UP
Universidade da Paz – Unipaz
Associação Park Way Residencial – APWR
Sítio das Neves – Projeto Olho d’Água
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