quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Os riscos extremos do aquecimento global no Brasil

Vista aérea da represa de Atibainha, parte do Sistema Cantareira, que passa pela pior seca dos últimos 80 anos (Foto: Victor Moriyama/Getty Images)
Blog do Planeta


Estudo avalia quais podem ser impactos mais catastróficos das mudanças climáticas: quebra de lavouras, ondas de calor e apagões

BRUNO CALIXTO| DE BRASÍLIA
29/09/2015 - 19h15 - Atualizado 29/09/2015 19h30
Imagine que há 1% de chance de um meteoro cair na Terra e destruir o mundo. O que você faz: tenta evitar a tragédia, mesmo o risco sendo baixo, ou não faz nada e conta com os 99% de sorte? Uma equipe de prestigiados pesquisadores brasileiros e internacionais, talvez cansados de contar com a sorte da paralisia nos esforços contra o aquecimento global, decidiu avaliar o risco do cenário mais pessimista de mudanças climáticas. A conclusão é que vale a pena agir para impedir mesmo as catástrofes mais improváveis.


O estudo foi liderado pelo climatologista do IPCC e presidente da Capes, Carlos Nobre, e conta com pesquisadores de órgãos como a Embrapa, Fiocruz e Coppe-UFRJ. O trabalho segue a metodologia criada pelo cientista representante do governo do Reino Unido, sir David King, já aplicada em países como Reino Unido, Índia e China. Em evento em Brasília nesta segunda-feira (28), King explicou que a ideia é fazer com o tema das mudanças climáticas uma análise similar a que foi feita com o risco de um surto de gripe aviária.

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O Reino Unido calculou o risco do vírus H5N1 sofrer uma mutação e infectar humanos em 1% nos próximos dez anos - um risco pequeno. Porém, os danos caso esse risco se concretize seriam enormes, podendo gerar milhões de vítimas. Ao fazer esse balanço, o país decidiu investir em uma vacina em vez de ficar esperando para saber se o vírus sofreria mutação. Seguindo essa lógica, um dos efeitos do aquecimento global, o aumento de mais de 10 metros do nível do mar, tem poucas chances de acontecer neste século, mas o mero fato de essa possibilidade existir seria o suficiente para os governos se mobilizarem e impedir o derretimento do gelo no Ártico.

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No caso específico brasileiro, os pesquisadores analisaram quatro áreas. Descobriram que, escondido no cenário mais pessimista, há perdas enormes de lavoura, apagões, mortes por ondas de calor e desaparecimento da rica fauna brasileira. Os dados ainda são preliminares. O estudo ainda está em andamento, e será divulgado oficialmente no ano que vem, mas já temos alguns resultados.

Agricultura – O Brasil tem tecnologia, ou está aprimorando, para conseguir adaptar suas principais lavouras para um clima mais quente. Já há formas de produzir soja ou café, por exemplo, com sementes resistentes ao calor. Mas isso tem um limite. "É possível adaptar lavouras para um aquecimento de 2C. Passou disso, o risco é muito grande", diz Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa e um os autores do estudo. Caso o mundo fique 4C mais quente, a probabilidade de danos às culturas de arroz, milho e soja é muito alta. No cenário mais pessismista, a produção agrícola brasileira entra em colapso.

Energia – O Brasil é muito dependente de usinas hidrelétricas para a geração de eletricidade. Essas usinas dependem da quantidade e distribuição das chuvas. Os modelos climáticos mostram que, em um cenário de 4°C de aquecimento, o Brasil poderá perder um quarto de seu potencial de geração de energia hídrica. Secas e apagões poderão se tornar frequentes.

Saúde humana – Ondas de calor como a que recentemente matou milhares de pessoas na Índia podem se tornar comum no Brasil. O ser humano tem um limite fisiológico do quanto ele aguenta de calor. Pessoas devem evitar ficar expostas por muito tempo a temperaturas acima de 35°C com muita umidade. No cenário mais grave, qualquer um que não tiver ar condicionado estará em risco.

Biodiversidade – Para o país com uma das maiores biodiversidades do mundo, o Brasil tem muito a perder. A Amazônia pode sofrer um processo de savanização, e o semiárido pode virar um semideserto. O resultado é que calcula-se que 16% das espécies brasileiras seriam extintas.
Como evitar os cenários mais extremos? Há estratégias de adaptação e reflorestamento.


Mas para Nobre, só é possível resolver o problema controlando a emissão de gases de efeito estufa. "Se não queremos correr esses riscos, precisamos pagar o seguro, e o seguro é manter a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera abaixo de 350 partes por milhão (ppm)." Tarefa difícil. A concentração atual está em 400 ppm, e as propostas apresentadas pelos governos mundiais mostram que essa trajetória dificilmente será mudada.

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*O repórter viajou a Brasília a convite da Embaixada Britânica no Brasil.

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