Foto: Nacho Doce/ REUTERS
Região amazônica desmatada em um distrito de Porto Velho (RO)
Região amazônica desmatada em um distrito de Porto Velho (RO)

 
 Em 2014, 29 ambientalistas foram assassinados no Brasil. É o número mais alto do mundo - a Colômbia, que tem o segundo lugar, teve 25 mortes. Somadas, essas cifras representaram quase metade das mortes desse tipo no mundo todo no mesmo ano: foram 116 no total. As informações são da ONG Global Witness.


A ONG registrou 78 assassinatos do tipo em 2015 até o momento, e Colômbia e Brasil seguem liderando os números. A concentração de terras nas mãos de grandes proprietários é um dos elementos que contribui para o grande número de conflitos fundiários.


No país, 2,8% dos proprietários de terras são donos de mais de 56% de terras aráveis, enquanto 50% dos agricultores são donos de apenas 2,5% da área total. Por outro lado, a facilidade para obter dados sobre mortes resultantes de conflitos também está entre os motivos que colocam o Brasil no topo do ranking de mortes.

Para se preocupar#

Entenda porque o Brasil é o país em que mais se matam ativistas do meio-ambiente no mundo:
  • A maior parte dos assassinatos acontece na região amazônica, no Pará e no Mato Grosso. "São estados grandes e com áreas remotas, em que o Estado não chega, e há um histórico de conflitos sociais decorrentes de desigualdades extremas, agravadas pelo poder da elite rural. A lei da bala prevalece", diz Chris Moye, líder da campanha pela defesa de ambientalistas da Global Witness.
  • O Brasil é um dos países com maior número de homicídios do mundo e 80% das investigações desse tipo de crime são arquivadas. Esses números também se refletem nos assassinatos de líderes ambientalistas.
  • Como os crimes ocorrem em áreas isoladas, de difícil acesso, a investigação dos casos fica comprometida. Aliada à corrupção, a impunidade dos criminosos faz com que crimes desse tipo acabem sendo mais frequentes.
  • Apesar dos problemas, o Brasil é um dos países da América Latina em que a sociedade civil está melhor conectada. Por isso, é mais fácil obter informações e relatos sobre os casos. Nesse sentido, as estatísticas elevadas também são um reflexo do acesso a essa informação.
O assassinato de Chico Mendes em, 1988, chamou a atenção da comunidade ambientalista global e se converteu num caso emblemático. Defensor da preservação da floresta amazônica, o seringueiro denunciou as ameaças que vinha recebendo de fazendeiros locais antes de ser morto em sua própria casa.
“São estados grandes e com áreas remotas, em que o Estado não chega, e há um histórico de conflitos sociais decorrentes de desigualdades extremas, agravadas pelo poder da elite rural. A lei da bala prevalece.”

Chris Moye
Líder da campanha pela defesa de ambientalistas da Global Witness, em entrevista ao Nexo
Outro crime com ampla repercussão foi o assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang. Ela foi morta em 2005 em Anapu, no Pará, por sua atuação como defensora de pequenos proprietários de terra e mediadora de conflitos na região. O mandante do crime foi condenado a 30 anos de prisão em 2010.


Foto: Circuito Fora do Eixo/Flickr/Creative Commons
Ato Pelas Florestas, protesto em Brasília (DF) em 2012
Ato Pelas Florestas, protesto em Brasília (DF) em 2012

Leis de proteção e investigação podem mudar o cenário#

Uma das propostas do Brasil na COP21, a conferência de mudanças climáticas que termina neste sábado (12) em Paris, é o fim do desmatamento ilegal. O tema que pode virar parte da agenda global tem relevância local: ambientalistas que atuam nas regiões mais afetadas, tentando evitar o desmate ilegal, correm grandes riscos, que vão de ameaças constantes até assassinatos.
“Essas pessoas se envolvem porque estão lutando por coisas que estão sendo tiradas de suas comunidades. E são especialmente vulneráveis porque normalmente não têm uma rede de apoio, e as coisas podem ficar feias antes que suas histórias entrem no radar de ONGs nacionais ou internacionais.”

Jane Cohen

Especialista em saúde ambiental do Observatório de Direitos Humanos de Nova York, em entrevista à Smithsonian Mag
Em um comunicado, Billy Kyte, porta-voz da Global Witness, criticou a falta de enfoque no tema pelas delegações da COP21. “Enquanto eles discutem soluções para a nossa crise climática, longe dos corredores do poder as pessoas comuns que defendem seu direito a um meio ambiente saudável estão sendo assassinadas em números recordes”, disse.

A ONG diz que o combate a esse tipo de crime precisa de ajuda dos governos federais e locais dos países. É preciso garantir, entre outras coisas:
  • Criação e fiscalização de leis de proteção das comunidades;
  • Investigações rápidas e imparciais das denúncias de ameaças a ambientalistas;
  • Ações legais efetivas onde existam evidências de crimes, sistema de proteção e reparação para as vítimas;
  • Reconhecimento e reafirmação pública da importância do trabalho dos líderes ambientalistas;
Segundo a Global Witness, o problema é mundial, mas a América Latina é o foco desses assassinatos - três em cada quatro acontecem aqui. Os crimes são todos ligados à disputas de terra e têm como 40% das vítimas membros de populações indígenas. Na maioria dos casos, ninguém é responsabilizado.

O Brasil tem o maior número absoluto de assassinatos, mas Honduras lidera no número de assassinatos de ambientalistas per capita. Entre 2010 e 2014, foram 101 assassinatos de ativistas ambientais nesse país.