STF
Ministro Toffoli pediu vista. Até o momento, questão está empatada em 4 a 4.
Quinta-feira, 2/6/2016
O
STF retomou nesta quinta-feira, 2, o julgamento de ADIn na qual a PGR
pede a declaração de inconstitucionalidade de lei estadual do CE (lei
15.299/13) que regulamenta a prática da
vaquejada no Estado. Até o momento, há quatro votos pela
inconstitucionalidade da lei (ministros Marco Aurélio, Barroso, Rosa
Weber e Celso de Mello) e quatro votos pela constitucionalidade
(ministros Fachin, Gilmar Mendes, Teori e Fux). O julgamento foi
suspenso por pedido de vista do ministro Dias Toffoli.
Apresentado voto-vista,
o ministro Luís Roberto Barroso votou pela procedência da ação. Para
ele, no caso da vaquejada, a gravidade da ação contra o animal está
tanto na tração e torção bruscas da cauda do boi, como também na queda
dele. “A força aplicada à cauda em sentido contrário a fuga, somada
ao peso do animal, evidência a gravidade da ação praticada contra o boi.
Uma vez que sua cauda não é mero adereço, mas sim a continuação de sua
coluna vertebral, possuindo terminação nervosa, não é difícil concluir
que o animal sinta dores e padeça grande sofrimento.”
"Na vaquejada, a torção brusca da cauda do animal em alta velocidade e sua derrubada, necessariamente com as quatro patas para cima como exige a regra, é inerentemente cruel e lesiva para o animal. Mesmo nas situações em que os danos físicos e mentais não sejam visíveis de imediato, a olho nu, há probabilidade de sequelas graves que se manifestam após o evento. De todo modo, a simples potencialidade relevante da lesão já é apta a deflagrar a incidência do princípio da precaução."
Para Barroso, qualquer ser vivo com desenvolvimento neurológico e capacidade de desenvolver estados mentais pode sofrer. “A
proteção dos animais contra a crueldade inscrita no capítulo
constitucional dedicado ao meio ambiente atrai a incidência do
denominado princípio da precaução.”
“Manifestações culturais com características de entretenimento que submetem animais a crueldade são incompatíveis com o artigo 225, parágrafo 1º, inciso 7º, da CF, quando for impossível sua regulamentação de modo suficiente para evitar práticas cruéis, sem que a própria prática seja descaracterizada.”
O decano da Corte, ministro Celso de Mello, pontuou que a prática de maus tratos tem início antes mesmo de o animal ser solto na arena. Para ele, a regulamentação não possui o condão de impedir o risco permanente ao que animal fica exposto e o sofrimento que lhe é causado, na medida que a prática inclui perseguição, tração de cauda e derrubada ao solo. "Inexiste norma legal que possa alterar a realidade e a natureza desses fatos."
"Uma prática violenta, que ameaça a integridade física dos animais. Ela não deixa de ser cruel porque a lei eventualmente a classifica como prática desportiva ou cultural."
Relator
O julgamento foi iniciado
em agosto do ano passado. Na ocasião, o relator, ministro Marco
Aurélio, entendeu estar comprovado o maltrato contra os bovinos e a
intolerável crueldade desenvolvida contra os animais, não permitindo
assim a prevalência da manifestação cultural.
"Os precedentes apontam a óptica adotada pela Corte considerado o conflito entre normas de direitos fundamentais – mesmo presente manifestação cultural, verificada situação a implicar inequívoca crueldade contra animais, há de se interpretar, no âmbito da ponderação de direitos, normas e fatos de forma mais favorável à proteção ao meio ambiente, demostrando-se preocupação maior com a manutenção, em prol dos cidadãos de hoje e de amanhã, das condições ecologicamente equilibradas para uma vida mais saudável e segura."
Em seu voto,
o ministro ressaltou que a PGR apresentou laudos técnicos dos prejuízos
que a prática causa aos bovinos, como por exemplo descolamentos da
articulação do rabo, fraturas, comprometimento da medula espinhal e dos
nervos espinhais, “e posso supor sofrimento mental”, e lembrou ainda que
os cavalos usados na atividade também sofrem lesões com danos
irreparáveis. “A atividade de perseguir animal em alta velocidade,
puxá-lo pelo rabo e derrubá-lo, sem os quais não receberia o rotulo de
vaquejada, configura maus tratos."
"Inexiste a mínima possibilidade de um boi não sofrer violência física e mental quando submetido a este tratamento, a par de questões morais relacionadas ao entretenimento as custas do sofrimento dos animais bem mais sérias se compradas as que envolvem experiências cientificas e médicas, a crueldade intrínseca, a vaquejada não permite a prevalência do valor cultural como resultado desejado pelo sistema de direitos fundamentais da Carta de 1988."
Divergência
Próximo a votar, o ministro Edson Fachin abriu a divergência. Para ele, o caso precisa ser analisado
sobre um olhar que alcance a advinda população rural, despindo-se de
eventual visão unilateral de uma sociedade urbana. "Tal atividade
constitui-se modo de criar, fazer e viver da população sertaneja."
“É preciso despir-se de eventual visão unilateral de uma sociedade eminentemente urbana com produção e acesso a outras manifestações culturais, para se alargar o olhar e alcançar essa outra realidade. Sendo a vaquejada manifestação cultural, encontra proteção expressa na Constituição. E não há razão para se proibir o evento e a competição, que reproduzem e avaliam tecnicamente atividade de captura própria de trabalho de vaqueiros e peões desenvolvidos na zona rural desse país. Ao contrário, tal atividade constitui-se modo de criar, fazer e viver da população sertaneja.”
Ao adiantar voto, o ministro Gilmar Mendes seguiu o entendimento do ministro Fachin, julgando improcedente a ação.
Na sessão de hoje, o
ministro Teori Zavascki acompanhou a divergência. Ele pontuou que o
Supremo não estava analisando a constitucionalidade da vaquejada e sim a
constitucionalidade ou não de uma lei que regulamenta a prática e
questionou: a vaquejada, se não fosse cruel, seria inconstitucional? "Me parece que a resposta é negativa". Segundo o ministro, é melhor ter uma lei que regulamenta, do que não ter nenhuma norma que cuide da prática.
"Símbolo nordestino"
Tratada como um esporte,
símbolo cultural do povo nordestino, a prática da Vaquejada, de acordo
com a Associação Brasileira de Vaquejada, é uma tradição que passa de
geração em geração há muitos anos. Na época dos coronéis, de acordo com a
entidade, quando não havia cercas no sertão nordestino, os animais eram
marcados e soltos na mata, e, depois de alguns meses, peões (vaqueiros)
se reuniam para juntar o gado. Alguns animais se reproduziam no mato e
os filhotes, selvagens por nunca terem mantido contato com humanos, eram
os animais difíceis de serem capturados. Os vaqueiros se embrenhavam na
mata cerrada e perseguiam, laçavam e levavam os bois ao coronel. Foi
daí que surgiu a ideia da realização da vaquejada. Atualmente, as
disputas são realizadas entre várias duplas, que montadas em seus
cavalos perseguem pela pista e tentam derrubar o boi na faixa apropriada
para a queda, com dez metros de largura, desenhada na areia da pista
com cal.
-
Processo relacionado: ADIn 4983
Nenhum comentário:
Postar um comentário