Novo defensor dos agrotóxicos, Nizan Guanaes tem casa de campo com horta orgânica
Por Alceu Luís Castilho

Pelo sistema Top Class: metade do investidor, metade da empresa agropecuária. Um dos maiores entusiastas desse sistema, e colega de leilões de Guanaes, era o locutor Galvão Bueno, da Globo.
Guanaes acaba de entrar no noticiário por ter sido contratado como consultor pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Sua missão, promover o agronegócio. Em particular, os agrotóxicos, no momento em que a Câmara discute o chamado PL do Veneno, o PL 6.299/02, agora recheado de aditivos, que flexibiliza o uso dos pesticidas no Brasil.
A notícia dada pelo blog de Andréia Sadi, no G1, pegou os socioambientalistas de surpresa. Mas a relação do publicitário com o agronegócio vem de longe. Ele tem participado de inúmeros encontros do setor, com o mantra de que o modelo precisa vender melhor sua imagem.
“Só chamar agrotóxico já mostra que o setor se comunica mal”, afirmou Guanaes à repórter. Ele disse que não gosta de ser associado à bancada ruralista. Principal interessada, observou Andréia, no projeto em debate no Congresso. “Meu papel é fazer o setor se comunicar melhor, nem canonização nem satanização”.
Guanaes não
fala como um contratado distante, apenas um assalariado a serviço de uma
classe à qual não pertence. Habitué das altas rodas, ele também é
empresário – foi dono de várias agências de publicidade – e está
acostumado a conviver com aqueles que contratam seus préstimos. Alguns
deles são seus vizinhos.
NA BOA VISTA, A FINA FLOR DA ELITE PAULISTANA

O lançamento contou com a cantora jamaicana Grace Jones. Entre os condôminos de primeira viagem (banqueiros, empresários, grandes advogados) está Nizan Guanaes. Em Porto Feliz, a 100 quilômetros da capital, eles têm suas casas de campo, rodeados por 4 mil funcionários. “Onde os ricos descansam”, como definiu O Globo.
Segundo a VejaSP, a Fazenda Boa Vista tem um campo de polo, dois campos de golfe e doze quadras de tênis. Uma delas, em 2012, recebeu a russa Maria Sharapova para um jogo-exibição. Nas instalações hípicas, quatro picadeiros. As cocheiras têm piso de borracha e, relata a revista, “bordas arredondadas para que os cavalos não se machuquem em quinas traiçoeiras”.

De Olho nos Ruralistas identificou pelo menos dez imóveis à venda na Boa Vista, por preços que vão de R$ 3,5 milhões (“linda vista do vale com mata nativa preservada”) até R$ 13 milhões. Nenhum desses moradores se esqueceu de assinalar nos anúncios os itens “fazendinha e horta orgânica para consumo próprio do condomínio”.
Nesta terça-feira (20/06), no Twitter, o jornalista André Trigueiro lembrou que, em 2014, Guanaes escreveu estas palavras – as frases foram aqui agrupadas – na Folha: “A comida do futuro é orgânica. As pessoas estão cada vez mais preocupadas em comer e em dormir livres de substâncias químicas. Ninguém pode nos salvar a não ser nós mesmos”.
DO FASANO AO AGRONEGÓCIO, O “EMBAIXADOR”
Nem todos os moradores da Fazenda Boa Vista têm seus nomes divulgados. O do publicitário Nizan Guanaes, porém, sempre aparece nas reportagens. Seu nome é, em si, uma marca, assim como o sobrenome Fasano. Ele e Rogério Fasano são parceiros no projeto Reserva Trancoso, na Praia de Itapororoca, que será lançado em 2019 no município baiano. Guanaes é o “embaixador”.A palavra serve para ilustrar o que ele tem feito pelo agronegócio nos últimos anos. A figura sorridente de Guanaes aparece em diversos pontos do país, a promover o modelo – não custa lembrar, não exatamente o único na relação com as propriedades e os recursos naturais.
“Se o Brasil fosse um terreno, na frente do Atlântico, com uma vasta extensão de terra, exploraríamos agricultura e turismo, porque é o óbvio”, afirmou o publicitário, durante fórum sobre agronegócio da revista Exame. “No Brasil, o agronegócio é muito bom em fazer, mas é péssimo em se vender”.
O empresário prosseguiu:
– É impressionante que o setor do agronegócio seja um vencedor por ele mesmo, com suas próprias forças, a despeito do estado e da legislação. Somos um país capitalista que tem horror a lucro. Esse setor já faz muito pelo Brasil, muito mais do que o Brasil faz por ele.
ELE VÊ AGRONEGÓCIO COMO MARCA GLOBAL
Guanaes enxerga o agronegócio brasileiro como marca global. “Se o agronegócio quisesse dominar todos os principais aeroportos do mundo, ele conseguiria”, definiu.Em reunião da Comissão Nacional de Bovinocultura de Corte, da CNA, em maio, o publicitário disse que o setor agropecuário precisa contar suas histórias de sucesso para o Brasil e para o mundo. (Esse debate específico acontece no contexto da crise de exportações para a Europa, após a Operação Carne Fraca.)

O publicitário é bem relacionado. Durante a posse do pecuarista João Martins da Silva Junior – seu conterrâneo – como presidente reeleito da CNA, em dezembro, em Brasília, ele falou sobre agronegócio brasileiro. Da cerimônia participaram ministros, parlamentares e o presidente Michel Temer.
Um ano antes, em dezembro de 2016, Temer ouviu de Guanaes o seguinte conselho: “Aproveite sua impopularidade para fazer o que precisa ser feito”.
Em julho daquele ano, ainda durante a interinidade do atual presidente, ambos participaram do Global Agribusiness Fórum 2016, em São Paulo. Um evento promovido pela Sociedade Rural Brasileira, pela Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho) e pela Associação Brasileira dos Criadores de Gado Zebu.
A Abramilho é uma das mantenedoras do Instituto Pensar Agro (IPA), por sua vez financiadora da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que banca projetos como a revisão da lei de agrotóxicos. Mais da metade dos votos que salvaram Temer, em agosto e outubro de 2017, saíram de membros da FPA: “55% dos novos votos a favor de Temer saíram da Frente Parlamentar da Agropecuária”.
AS VACAS DE GUANAES E GALVÃO
Quinze anos atrás, a Folha noticiava a migração de investidores do asfalto para o campo. Os exemplos citados eram os de Nizan Guanaes e Galvão Bueno. O publicitário estivera em Barra Bonita, no interior paulista, em leilão promovido pela Chalet Agropecuária, do pecuarista Luiz Eduardo Batalha – fornecedor mundial do Burger King.Os dois lances mais caros foram arrematados por Guanaes: 50% da vaca FLC Canyon, por R$ 93,8 mil, e 50% da mimosa Três Marias, por R$ 77 mil. Sempre metade do preço, pois, por esse sistema, os animais continuam com a empresa agropecuária. Na ocasião o publicitário fazia planos para comprar uma fazenda, “provavelmente em São Paulo”.
O paranaense Galvão Bueno, ele mesmo promotor de leilões em Londrina (PR), também é um entusiasta da raça Angus. Naquele leilão, em junho de 2003, o locutor gastou R$ 63,4 mil em compras e R$ 29,4 mil em vendas de gado.
No ano seguinte, após um leilão de Batalha no Copacabana Palace, Guanaes informou em entrevista à revista Época que tinha “umas 20 vaquinhas”, sempre Angus. Ele ainda se considerava um novato no negócio. Em São Paulo, vendera uma vaca – ou meia vaca – por R$ 37,8 mil. “Meus amigos me estimularam, achei divertido participar dos lances”.
Em 2005, o leilão ocorreu no DirecTV Music Hall, em São Paulo. Lá estavam, de novo, Galvão e Guanaes. O publicitário vendeu duas novilhas por R$ 18.200. O locutor, uma, por R$ 9.100. Outro investidor era o então presidente da Ford no Brasil – coincidentemente uma das empresas que, nos últimos anos, patrocinaram a campanha “O Agro é Pop”, da Globo.
Essa campanha – igualmente de promoção do agronegócio – não foi feita por Guanaes. Mas ele já teve uma relação direta com uma afiliada da emissora, a RBS. Em 2006 ele começou a prestar consultoria para a RBS para mudar a identidade visual e a linha editorial do Canal Rural. Seu objetivo era fazer do canal “a CNN do campo”.
O Canal Rural foi vendido em 2013 para a J&F Investimentos, a holding da JBS – outra patrocinadora da campanha “O Agro é Pop”. Em processo de venda de ativos após a deflagração da Operação Lava-Jato, o grupo tenta há alguns meses vender o canal.
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