Por Daniela Chiaretti | De São Paulo
Os oceanos são a nova fronteira econômica e do conhecimento. As Nações Unidas decretaram o período 2021 a 2030 como a "década dos oceanos", com a intenção de colocar foco no mar e integrar cientistas, empresários e governos na ciência e tecnologia oceânicas. No Brasil, acreditam especialistas, a iniciativa vai dinamizar políticas e ações no mar e na costa.
"A ideia é estimular a pesquisa oceânica", diz o professor Alexander Turra, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP). "A preocupação com os oceanos subiu na agenda nacional no último ano", continua.
Um relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) de 2016 estimou que a economia dos oceanos pode representar US$ 3 trilhões em 2030 em empregos e atividades produtivas.
No Brasil, estudo da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio Grande do Sul estimou que os setores da economia dos oceanos representaram 19% do PIB em 2015, incluindo aí segmentos como petróleo, transporte, pesca, cabos submarinos, lazer e turismo.
O Brasil, via Ministério do Meio Ambiente (MMA), está avançando em compromissos voluntários assumidos em conferência da ONU em 2017. O primeiro é ter um plano de combate ao lixo do mar, que deve ser lançado em junho. Outro é implementar um programa de conservação da costa.
A terceira frente, coordenada pela Secretaria da Comissão Interministerial para Recursos do Mar (Secirm) é ter um planejamento espacial marinho. "Trata-se de organizar o uso do espaço do mar apontando onde se deve conservar e onde explorar na Zona Econômica Exclusiva", continua. Ele lista as ações que poderiam ser feitas no mar, como exploração de biotecnologia, geração de energias limpas, aquicultura de criação de organismos diferentes ao mesmo tempo, como peixes, algas e mexilhões.
"Estudar oceanos é caro e difícil", diz Leandra Gonçalves, pesquisadora do IO. "Não temos séries de dados que possam embasar políticas públicas. A Década dos Oceanos vai neste sentido."
A ciência oceânica estima em um milhão o número de espécies marinhas que podem ainda ser desconhecidas. Só três pessoas no mundo exploraram o ponto mais profundo do oceano. Apenas 5% do solo oceânico já foi mapeado em alta resolução.
Estas são algumas das lacunas de conhecimento listadas em material da Comissão Oceanográfica Intergovernamental (COI) que a Assembleia da ONU designou como responsável para levar adiante a "Década da ONU da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável". A COI é ligada à Unesco.
"É um percentual realmente limitado o quanto os países destinam à pesquisa oceânica", diz Salvatore Arico, chefe da seção de Ciências Oceânicas da COI. Do total destinado a pesquisa e desenvolvimento na Noruega, apenas 4% é para estudos do mar. Nos Estados Unidos esta fatia é de 3%, na Coreia, 1%, Na Argentina, 0,04%.
A Noruega tem 364 cientistas oceânicos por milhão de habitantes, segundo a COI. Na Espanha esta proporção cai para 10. Em número de barcos oceanográficos, a Coreia ocupa o terceiro lugar, depois dos EUA e do Japão. "Alguns países começam a entender que é importante estudar os oceanos para o desenvolvimento econômico", diz Arico.
"Os problemas nos oceanos não têm fronteira", continua. "Quem poderia dizer, há 20 anos, que os oceanos ficariam mais ácidos? Ou que o plástico entraria na cadeia alimentar? Precisamos estudá-los oceanos, não apenas utilizá-los".
Nesse sentido, começa hoje um curso para 102 alunos selecionados de pós-graduação (50 brasileiros e 50 estrangeiros) no IOUSP. A Escola Avançada em Ciência Oceânica é uma iniciativa do IO, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Instituto de Estudos Avançados da USP.
"Queremos produzir um conhecimento robusto", diz Turra, que coordena o curso. Participarão vários especialistas estrangeiros, como Arico e Jake Rice, co-chair do IPBES (Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços dos Ecossistemas) para as Américas. Segundo Rice, a região das Américas pode perder 40% de sua biodiversidade original até 2050. Os oceanos absorvem 26% do gás carbônico gerado pelas atividades humanas. Esse gás produz uma reação química no mar que está tornando os oceanos mais ácidos.
"Olhando para os oceanos há mensagens encorajadoras e outras desafiadoras", diz Rice. As positivas são o número de ações globais que vêm sendo feitas para reduzir a poluição costeira ou combater a pesca predatória. "O desafio é que a implementação ocorre de forma muito desigual no mundo.".
"Sabemos o que temos que fazer. O problema é que nem sempre os governos escolhem esse caminho", segue Rice. Ele diz que o uso abusivo de fósforo e nitrogênio na agricultura, que chega aos mares, também fertiliza a vida marinha. "Ocorre um boom de algas que tiram oxigênio do mar e impactam outras espécies", exemplifica.
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