Pesquisa inédita busca preservar a biodiversidade em centros urbanos
Projeto relaciona de forma inédita dados de avifauna, áreas verdes, forma urbana e densidade populacional
Por Ciências Ambientais - URL Curta:
jornal.usp.br/?p=132295
- Editorias:
Estima-se que, em 2020, 90% da população
brasileira viverá em cidades. Como o desenho urbano pode influenciar a
vida das pessoas? Sabe-se que a forma como o ambiente é construído
(ruas, edifícios, lojas, calçadas, áreas verdes) afeta diretamente o
cotidiano e a qualidade de vida. Será que ocorre o mesmo com os animais
que vivem nas cidades? Perguntas como essas nortearam pesquisa que
relaciona, de forma inédita, dados de avifauna, áreas verdes, forma
urbana e densidade. Os pesquisadores pretendem testar se diferentes
arranjos de desenho urbano influenciam na quantidade de áreas verdes e,
consequentemente, se as aves (um componente da biodiversidade) respondem
de forma diferente conforme se altera o desenho das cidades.
Realizado por uma equipe interdisciplinar
que inclui o Grupo de Silvicultura Urbana da Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), o estudo Biodiversidade e forma urbana no desenho de cidades mais sustentáveis
está sendo feito nas cidades de São Paulo, Berlim e no Distrito
Federal, uma vez que possuem soluções de desenho urbano e porcentagem de
áreas verdes bem variadas. Os pesquisadores têm formação em Arquitetura
e Urbanismo, Biologia, Agronomia, Engenharia Ambiental e Geografia, e
são integrantes de quatro instituições: USP, com a Esalq; a Universidade
Federal de São Carlos (UFSCar) – campus Sorocaba; a Universidade de
Brasília (UnB); e a Universidade de Humboldt, na Alemanha. A coordenação
do projeto, na Esalq, é do professor Demóstenes Ferreira da Silva
Filho, do Departamento de Ciências Florestais.
Desenho urbano
Brasília, considerada como
o plano piloto do arquiteto e urbanista Lúcio Costa, tem
características muito peculiares e bem diferentes do seu entorno, onde
estão as cidades-satélites. Foi planejada sob as diretrizes do
Modernismo, tendo as superquadras como unidade mínima de desenho urbano e
a preocupação constante com a qualidade urbana gerada. Apesar de todas
as críticas em torno dos ideais modernistas, que não atendem por
completo às necessidades atuais da sociedade, não se pode negar a
diferença entre Brasília e as demais áreas urbanas do Distrito Federal
em termos da qualidade dos espaços abertos e áreas verdes. As
cidades-satélites são representantes do modelo de desenho urbano que
estamos praticando em nossas cidades brasileiras desde o período
colonial: baseada no lote individual sem um senso de um desenho urbano
coletivo de maior qualidade, como em Brasília.
O lote ou o terreno em que são construídas
as edificações faz parte de uma lógica de parcelamento e uso do solo que
ocorre na maioria das cidades brasileiras (com raras exceções, como
Brasília). Junto com o plano diretor, o zoneamento e o código de obras
municipal ditam o desenho e a forma das cidades.
Os resultados parciais obtidos até agora
com relação ao Distrito Federal foram apresentados em um congresso
internacional sobre biodiversidade e desenho urbano na cidade do Panamá.
Eles revelaram que Brasília tem a mesma densidade de habitações que a
cidade-satélite Taguatinga, porém esta última tem quase 18% a menos de
cobertura arbórea que a primeira. Essa diferença se deve principalmente
ao desenho urbano.
A morfologia de São Paulo é
regrada a partir do lote e lembrada como um símbolo de verticalização,
tendo bairros inteiramente preenchidos por altas torres residenciais,
acima de 20 andares. Questiona-se se essa forma de ocupação muito mais
verticalizada afeta positivamente ou negativamente as áreas verdes e,
consequentemente, as aves.
Berlim é considerada uma
das cidades que mais têm inovado em termos de experimentações e de novas
propostas de desenho urbano desde o início do século 20, devido, em
parte, à necessidade de se reinventar após duas guerras mundiais que
destruíram seu território. É uma cidade construída, em geral, a partir
de uma lógica de projeto urbano que considera a quadra como unidade
mínima e não o lote, resultando assim, em maior qualidade dos espaços
verdes e um desenho de quadras que fortalece essa ligação.
Diante dessas diferenças, os pesquisadores
querem testar o quanto as formas de projetar a cidade pode influenciar a
biodiversidade através dos dados de ocorrência e diversidade de
avifauna. A expectativa da equipe é de que os resultados possam
surpreender e, acima de tudo, influenciar políticas públicas no
planejamento de novas áreas urbanas em expansão, como cidades de pequeno
e de médio porte e revitalização de áreas urbanas consolidadas. A
grande contribuição dos pesquisadores virá a partir da recomendação de
diretrizes de desenho urbano de alto desempenho em termos de áreas
verdes e biodiversidade, considerando, ao mesmo tempo, a importância da
promoção de cidades mais densas e melhor qualidade de vida.
A pesquisa tem o apoio da Digital Globe
Foundation (fundação americana), da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes) e, recentemente, da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Também foi selecionada em
edital público realizado pela USP-Humboldt, que disponibilizou recursos
financeiros para estabelecer a parceria entre as duas instituições nas
atividades de campo e intercâmbio de conhecimento através de reuniões e
workshops em Piracicaba e em Berlim.
Patrícia Sanches – arquiteta e urbanista, doutoranda em Recursos Florestais na Esalq
Mais informações: e-mail patricia.msanches@uol.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário