Simone Kafruni
Lucas Valença
Além do temor de que as barragens localizadas na cidade de Paracatu sejam palco de uma nova tragédia, semelhante a de Mariana ou de Brumadinho, os moradores do município estão assustados com as suspeitas de que a mineradora Kinross Gold Corporation, empresa canadense, esteja contaminando afluentes do local com arsênio, um semi-metal altamente tóxico. Além de ser cancerígeno, também é causador de diversas doenças.
O geólogo da Faculdade Noroeste de Minas Gerais Márcio José dos Santos, morador do local, chegou a analisar, em 2015, o nível de arsênio em 37 moradores da comunidade Santa Rita. O povoado tem um total de 112 pessoas e está localizada em uma região mais próxima da mineradora. Segundo o estudo, que analisou a urina dos moradores, e foi apresentado no Terceiro Congresso da Sociedade de Análise de Risco Latino Americano, no ano seguinte, o índice médio da substância tóxica no corpo era de 14,7 microgramas por litro. Porém, o maior indicador chegou a 32,5.
Acredita o pesquisador que a população, em especial, da região, contraiu o elevado índice de arsênio por meio da água. Segundo ele, quando a empresa quebra as rochas para buscar o ouro, material explorado pelo local, uma quantidade de arsênio é exposto, no entanto, neste primeiro momento não é prejudicial ao corpo humano. Porém, ao ser depositado junto com os dejetos, se torna altamente tóxico. O problema, explicou o estudioso, é que existe a suspeita de que a substância esteja permeando o solo e contaminando a água da região.
Como a população vizinha à represa consome uma quantidade de água de poços artesanais, além de criarem animais com a mesma água, a suspeita de Márcio José dos Santos é de que os poços estejam contaminados. O pesquisador também avaliou a quantidade de arsênio em alguns córregos perto da mina e constatou que há a existência da substância. “O ser humano se impressiona quando acontece a catástrofe, mas ninguém se importado com a tragédia que está ocorrendo todos os dias na região”, lamentou.
Segundo o médico e professor de oncologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), André Murad, o limite estabelecido pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) é de 10 microgramas por litro, medição também utilizada pela Justiça do Trabalho para estipular limites de riscos aos funcionários. No caso de intoxicação crônica, quando a substância é muito absorvida, o tecido interno é afetado.
Na opinião do professor do Departamento de Saúde Mental da UFMG Frederico Garcia, o risco de contaminação com rejeitos de minas é alto. “O problema é que vão se acumulando na cadeia alimentar. Os peixes pequenos comem, são comidos por peixes grandes que o homem vai lá e come. Então, nós acabamos consumindo essas substâncias que, no longo prazo, são muito prejudiciais à saúde pelo acúmulo”, destacou.
Outro lado
Procurados, a Kinross informou que “segue práticas de mineração bem-estabelecidas para operar de forma sustentável com respeito às pessoas e ao meio ambiente”. Explicam também que, durante o processo de mineração, o material contendo arsênio é “descartado em instalações duplamente revestidas e projetadas especificamente para sua contenção, chamadas “tanques específicos”. Estes tanques, explicou a multinacional, “são selados com argila férrica e com um revestimento impermeável de plástico (geomembrana de PEAD — polietileno de alta densidade)”.
Eles também defenderam que as atividades da empresa são “controladas e monitoradas”, além de reforçarem que estão em conformidade com a lei. “O rejeito direcionado para as barragens da empresa durante todo seu ciclo produtivo é considerado não perigoso de acordo com norma técnica vigente”, informou.
Sobre as pesquisas levantam a suspeita de que as operações da mineradora elevaria os problemas de saúde de moradores, a Kinross afirmou que os níveis de exposição em Paracatu “foram semelhantes aos de outras cidades no estado de São Paulo e inferiores aos níveis médios encontrados nos EUA”.
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