Em 30 de novembro de 2010, o repórter do Estadão que
acompanhava Lula na visita à usina hidrelétrica estreita quis saber se a
última viagem ao Maranhão como presidente “era uma forma de agradecer o
apoio recebido durante oito anos da oligarquia Sarney”. Talvez por
ignorar que oligarquia (do grego oligarkhía, cujo significado
literal é “governo de poucos”) é a palavra que costuma designar um
sistema político que concentra o poder nas mãos de um pequeno grupo
pertencente à mesma família ou ao mesmo partido, Lula achou a pergunta
insultuosa. Ao lado da governadora Roseana Sarney, virou-se para o
jornalista e desandou no palavrório eternizado no vídeo de 1:37:
“Agradeço, agradeço. A pergunta
preconceituosa tua é grave pra quem tá oito anos cobrindo cobrindo
Brasília. Significa que você não evoluiu nada do ponto de vista do
preconceito, que é uma doença. Sabe… O presidente Sarney é presidente do
Senado… O Senado é uma instituição com autonomia diante do Poder
Executivo, da mesma forma que o Poder Judiciário. E o Sarney colaborou
muito para que a institucionalidade fosse cumprida. (Ouve-se em off a voz de Roseana: ‘Eu fui eleita pelo voto popular’.) “E
demais é o seguinte: o Sarney foi eleito pelo povo do Amapá. Eu não sei
por que esse preconceito contra o Sarney. Você tem de se tratar, fazer
um curso. Quem sabe fazer psicanálise para diminuir um pouco o seu
preconceito”. (“Preconceito contra a mulher também, contra a
mulher”, aparteia Roseana. “Eu fui eleita governadora do Maranhão no
primeiro turno. Voto direto do povo”).
Percebe, eu sinceramente acho gravíssimo esse preconceito. Eu lamento
que não tenha havido nenhuma evolução com tudo o que aconteceu neste
país. O Sarney não é o meu presidente. Ele é o seu presidente do Senado,
ele é o presidente do Senado deste País. Então, se você você tiver que
fazer algum protesto você vai pro povo do Amapá e protesta porque elegeu
o Sarney. Vá pro povo de São Paulo e protesta porque elegeu… sabe… o
Tiririca. Vá protestá contra as pessoas que foram votadas no Rio e que
você não gostou. Mas na medida que a pessoa é eleita e toma posse, ela
passa a ser uma instituição e tem que ser respeitada por ser essa pessoa
da instituição”.
Quer dizer que Lula virou amigo de infância do inimigo que
considerava “o maior ladrão do Brasil” por ter-se livrado, com a ajuda
de algum psicanalista, da doença que impede tanta gente de reconhecer
que o Maranhão é uma Califórnia nordestina? Quer dizer que só na
imaginação de quem não respeita uma instituição existem os presos
decapitados de Pedrinhas, a imensidão de analfabetos, as multidões de
miseráveis e outros tumores que que infestam a capitania hereditária?
Haja cinismo. O vídeo em que Lula garante que criticar Sarney é um
preconceito que tem cura só reafirma que não há remédio para a pouca
vergonha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário