domingo, 14 de setembro de 2014

Convicções-- Merval Preira

Embora os ativistas da campanha da presidente Dilma tenham querido transformar os números da pesquisa Ibope divulgada ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em uma demonstração de que a adversária Marina Silva está sendo deixada para trás na corrida presidencial, eles são semelhantes aos números prévios de pesquisa do Banco Central que mostrou um crescimento mais forte do PIB no mês de julho: a tendência não é o PIB se recuperar no segundo semestre, assim como a disputa presidencial está no mesmo ponto em que começou a semana, com um empate técnico das duas candidatas, embora a tendência seja favorável a Dilma neste momento da campanha.

Isso por que a pesquisa do Ibope foi realizada antes da pesquisa do Datafolha, divulgada um dia antes, que dava Dilma com 36% e Marina com 33%. Os números do Ibope variam na margem de erro em relação à sua pesquisa anterior, registrando uma tendência de alta da presidente Dilma, mas nada que tire a competitividade de Marina.

É bom registrar, por verdadeiro, que não partiu da presidente Dilma a comemoração dos resultados, ao contrário. Ela recebeu com frieza a informação sobre a nova pesquisa do Ibope durante nossa entrevista no Palácio da Alvorada e não moveu um músculo. “Eu não me empolgo com pesquisas, mas também não me abato”, disse a presidente, que se mostrou durante todo o debate com os colunistas do Globo de muito bom-humor, a ponto de ter feito uma brincadeira conosco quando teve que repetir um comentário por que houve uma falha no sistema de som: “Quer dizer que houve um apagão no Globo”, disse ela rindo, pois havia sido questionada sobre os problemas da política energética de seu governo.

Muito convicta de suas razões, conseguiu driblar todas as perguntas relacionadas ao PT e ao seu governo, sobretudo nas negociações com os partidos da base aliada, parte mais frágil do seu governo do ponto de vista institucional. É a prática da velha política, o debate que vai pautar o segundo turno.

Ela não conseguiu explicar, por exemplo, a impossibilidade prática de governar-se apenas “com os bons”, quase que admitindo que para garantir a governabilidade, é preciso aceitar certos desvios. Fez uma defesa dos partidos políticos, mas não criticou o toma-lá-dá-cá que os desmoraliza, aproveitando para criticar Marina indiretamente, quando disse que quem chega no governo sem disposição de negociar está no mau caminho: “Eu não acho que a democracia possa prescindir de partidos. Toda vez que isso aconteceu, nós caímos na mais negra ditadura. Ou tem alguém muito poderoso por trás disso”.

A questão da corrupção incomoda a presidente Dilma, embora ela esteja sempre disposta a afirmar que o que aumentou em seu governo foi o combate a ela. Mas quando se refere à Petrobras, fonte de inúmeras denúncias de corrupção nos últimos anos, ela procura banalizar o ocorrido, afirmando que “há corrupção em todas as empresas, públicas ou privadas. A Petrobras tem órgãos internos e externos de controle”. 

Sobre o fato de que durante vários anos o ex-diretor Paulo Roberto Costa comandou um esquema de negociatas sem ser descoberto, Dilma tergiversa, alegando que a Polícia Federal foi que descobriu, como se a descoberta se devesse a uma atuação de seu governo, e não de um órgão do Estado brasileiro, acima dos governos.

Ela não disse ontem, mas o espírito é o mesmo de quando disse que seu “telhado de vidro” estava protegido pela Polícia Federal e pelo Ministério Público, quando essas instituições pertencem ao Estado brasileiro, e não ao seu governo.

Ao dizer que demitiu Paulo Roberto Costa por não ter nenhuma afinidade com ele, a presidente procurou dar à demissão um caráter rotineiro, como se a nomeação ou demissão de uma empresa como a Petrobras dependesse da empatia entre os comandantes da empresa e seus dirigentes, e não da competência e da probidade da atuação.

Os argumentos da presidente Dilma são falhos na maior parte das vezes, e seu governo é uma prova viva dessa fragilidade, mas ela tem disposição de defendê-los. A tal ponto que reluta em anunciar mudanças num eventual segundo mandato. Caberá provavelmente a Marina Silva a tarefa de desconstruí-los no debate que travarão de igual para igual no segundo turno.

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