O pesadelo do tiranete
Não adianta Lula espernear. A culpa por "tudo isso que está aí" é dele.
No processo de destruição do país, Dilma foi mera coadjuvante. Editorial
do Estadão:
“Não estou numa fase muito boa”, teria repetido o ex-presidente Lula
nas conversas que manteve na sexta-feira em Brasília. Poderia ser um
tardio reconhecimento das consequências do que fez ou deixou de fazer
nos últimos 12 anos. Afinal, se o País vai de mal a pior, o grande
responsável por essa situação não poderia sentir-se de modo diferente.
Mas não se imagine que Lula está preocupado com os destinos do País. O
que o incomoda são as perspectivas sombrias que se abatem sobre seu
próprio futuro político.
A crise que levou o País à retração econômica não é, como tenta
justificar a presidente Dilma Rousseff, consequência da conjuntura
internacional desfavorável, mas resultado de erros do governo do PT. É a
prova mais evidente do esgotamento de um modelo que era viável enquanto
o País surfava nas ondas de um mercado internacional favorável a
economias cujo crescimento depende das exportações de matérias-primas,
como a brasileira. Enquanto foi possível, o governo petista
irresponsavelmente estimulou a gastança interna, elevando as despesas
públicas e ampliando o consumo. Investimentos ambiciosos foram
prometidos pelo governo. Dispondo de emprego e tendo acesso a crédito
abundante, a classe média foi às compras, iludida pela propaganda
oficial que lhe prometia quase o paraíso.
O sonho acabou. Agora, faltam salário e crédito para comprar
eletrodomésticos, casa própria e automóvel, e não há recursos públicos
para investir em bens sociais e em infraestrutura. O governo tenta
cortar na própria carne – e na dos assalariados – para botar ordem nas
suas contas e evitar a completa perda de credibilidade.
O PT colhe o que plantou. E o dono do PT paga o preço da soberba, da
ambição e da autoconfiança desmedidas que o levaram a tratar o Brasil
como sua propriedade por oito anos e ao erro fatal, do qual já se deu
conta, de se valer de sua popularidade para escolher uma sucessora que
lhe garantisse sua volta triunfal ao Planalto – se fosse possível, já em
2014.
O erro de Lula em 2010 foi imaginar que Dilma Rousseff permaneceria
docilmente submetida à sua vontade de todo-poderoso Pai da Pátria – e,
claro, do PT. Muito menos “pragmática” do que ele, cega pelo mesmo
radicalismo dogmático dos grupos nos quais militou durante a ditadura
militar, Dilma não se deu conta da encruzilhada em que o País se
encontrava quando assumiu o poder e assim colocou, ela e o País, no
caminho errado.
Em seus dois últimos anos na Presidência, Lula lograra minimizar os
efeitos da crise internacional sobre o Brasil. Mas a crise impunha ao
País a necessidade de se ater aos fundamentos macroeconômicos herdados
da era FHC. Lula até que os preservara, mas começou a afrouxá-los,
iludido pelos resultados positivos da economia brasileira. Por isso,
quando a crise de 2008 se abateu sobre o mundo globalizado, países com
finanças públicas mais organizadas e governos mais atentos e fiscalmente
responsáveis escaparam dos seus efeitos com relativa rapidez, mas o
Brasil não.
Ao chegar à Presidência, em 2011, Dilma ampliou a intervenção do
Estado na economia. Reelegeu-se prometendo exatamente o contrário do que
era necessário e urgente fazer. Atolou-se e levou junto o PT ao pântano
do descrédito popular em que se encontra. Enquanto o País, acéfalo,
fica nas mãos do mais puro oportunismo político encastelado no comando
do Congresso Nacional, o PT e Lula falam em “repactuar” o partido, seja
lá o que isso signifique.
Não adianta Lula declarar-se incomodado, tentar reformular o PT
mudando toda a direção nacional, convocar personalidades de seu círculo
de relações para encontrar uma saída para o beco em que se meteu. A
culpa por “tudo isso que está aí” – como ele gostava de proclamar antes
de 2002 para apontar o alvo de sua fúria oposicionista – é dele, Luiz
Inácio Lula da Silva. Dilma é apenas uma coadjuvante desmoralizada
politicamente ao ser apanhada nas mentiras do marketing político que a
reelegeu. Foi praticamente abandonada pelo próprio partido, que hesita
em apoiá-la nas medidas de ajuste fiscal.
A presidente ainda tem três anos e meio de mandato. É impossível
prever o que virá, mas talvez lhe esteja reservado o papel involuntário
de eliminar, com seus desacertos, qualquer possibilidade de volta de
Lula ao poder.
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