- segunda-feira, 19 outubro 2015 17:42
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Na verdade, como diz o próprio autor no seu artigo incluído na Veja - que é baseado em outro publicado no National Geographic -, naqueles dias dos anos 1965 e 1969 em que ele passou algum tempo nos estados de Pará e Amazonas, a Amazônia em geral e a brasileira em particular era quase intocada mexida e o desmatamento mínimo.
Hoje, alcança provavelmente mais de 20% e a degradação das florestas que subsistem é enorme. Ou seja, uma parte da tão badalada diversidade biológica da região já se perdeu e muito dos serviços ambientais que se esperam dela estão comprometidos, como tantos cientistas têm demonstrado.
O otimismo sobre a situação das selvas amazônicas parece derivar em especial da afirmação de que atualmente 51% da Amazônia estariam protegidos em terras indígenas e unidades de conservação.
Não cabe negar que os esforços de conservação da biota amazônica têm dado frutos muito importantes e que, em certa medida, foram respostas aos dedicados a acessá-la mediante estradas e ferrovias e a explorá-la, especialmente para expansão agropecuária, madeira, mineração e geração de energia.
O detalhe é que deixando de lado o espaço que parece favorecer a conservação (51%) versus 49% para seu aproveitamento não há muito que comemorar nem sustentar tanto otimismo. O desmatamento já realizado e o mau uso dos recursos, inclusive seu desperdício, são mais que suficientes para desestabilizar o funcionamento do bioma todo, como evidências científicas e empíricas apontam.
Pior ainda, a tendência é muito mais desmatamento e destruição sem necessidade e os problemas ambientais cada vez maiores, como as secas e inundações extremas, a falta de água em outras regiões que dependem da transpiração das florestas, a emissão crescente de carbono na atmosfera, o incremento de todas as formas de contaminação, perda da biodiversidade, etc.
E, sempre para acalmar o entusiasmo, é fundamental lembrar que desses 51% “protegidos” mais da metade é terra indígena que pode ser explorada em certa medida por eles mesmos e; que mais dos 40% restante são unidades de conservação de “uso sustentável”, ou seja que nelas se pode explorar os recursos naturais e inclusive desmatar, que incluem, dentre outras, as Áreas de Proteção Ambiental (APAs), a maior parte das quais não protege nada.
Ou seja, apenas 10% ou pouco mais estão realmente protegidos da atividade e da cobiça humana. Ainda assim, estão muito ameaçadas por toda classe de reivindicação e por falta de manejo efetivo.
“(...) não se pode exagerar tanto e, menos ainda, dar a falsa ilusão de
que já passou o perigo para a Amazônia e que o futuro será só
felicidade de agora em diante”.
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Ele é um otimista e isso é bom. A sociedade e os políticos gostam. Mas, não se pode exagerar tanto e, menos ainda, dar a falsa ilusão de que já passou o perigo para a Amazônia e que o futuro será só felicidade de agora em diante.
Sem renegar os progressos duramente obtidos, não se pode baixar a guarda. A luta por um futuro melhor deve continuar e mais vale, nesses casos, ser precavido e pessimista do que otimista.
O artigo e os títulos da Veja também chamam a atenção sobre outro aspecto. Pelo visto, uma vez mais, a Amazônia foi salva por um estrangeiro. Méritos sobram ao Lovejoy e ele é inquestionavelmente um bom amigo da Amazônia e do Brasil.
Mas, lendo o artigo, não consegui uma vez mais evitar sentir pena e raiva pelo esquecimento constante, reiterado e onipresente de milhares de brasileiros e cidadãos dos países amazônicos, que não escrevem nem falam em inglês, mas que no dia a dia e por esses mesmos 50 anos fizeram, com os seus intelectos e por suas mãos, essas obras que permitem todo o entusiasmo.
Onde está o reconhecimento aos que com lutas intermináveis e riscos enormes conseguiram estabelecer territórios indígenas e unidades de conservação?
Onde ficam os incansáveis funcionários que ano a ano lutam para criar essas áreas protegidas e para obter e usar magros orçamentos para cuidar delas? Por que, finalmente, nós mesmos parecemos achar bom propalar que as iniciativas para conservar a Amazônia sempre nasceram nos EUA ou em outro canto do mundo desenvolvido?
Até quando seremos os depreciadores dos nossos próprios méritos?
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