Governo de SP revoga regras para recuperar floresta uma semana após publicação
Giovana Girardi - O Estado de S. Paulo
20 Janeiro 2016 | 21h 02
Resolução que limitava compensação fora do Estado foi criticada por ruralistas
SÃO PAULO - Apenas uma semana após
publicar as regras para a regularização ambiental de proprietários de
terra que desmataram ilegalmente, o governo do Estado de São Paulo
voltou atrás. A Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo, responsável
pela resolução, publicou sua revogação nesta terça-feira, 19, no Diário
Oficial do Estado.
Resolução
previa que plantio poderia ser feito fora do Estado somente nos casos
em que a área se encontra em bacia hidrográfica que atende São Paulo
O documento detalhava como devem ser feitas as ações de
restauração florestal previstas num decreto do governador, também
publicado na semana passada, que institui o Programa de Regularização
Ambiental (PRA). Este, por sua vez, é uma definição para que os
proprietários de terra possam se adequar ao Código Florestal, lei
federal que foi reformulada em 2012.
No entendimento de ambientalistas que acompanharam as
discussões, o decreto sozinho era muito vago e demandava
esclarecimentos. A Secretaria do Meio Ambiente assumiu a tarefa e
publicou a resolução agora derrubada.
O texto estabelecia, por exemplo, que se o dono de terra não
respeitou a Reserva Legal (área de 20% de floresta que tem de ser
protegida dentro de propriedades rurais do Estado) e por algum motivo
não pode fazer o replantio na sua própria terra, ele tem a possibilidade
de compensar isso plantando fora de São Paulo, desde que seja numa
bacia hidrográfica que atende o Estado. Por exemplo, no sul de Minas ou
no Rio de Janeiro.
A preocupação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente era que
um dos principais serviços ambientais das florestas – que é justamente
proteger corpos d’água e garantir a segurança hídrica – não se perdesse.
Isso aconteceria se a compensação ambiental ocorresse em qualquer lugar
mais longe, como na Bahia, por exemplo.
Logo que a resolução foi publicada, grupos ruralistas
criticaram o texto alegando que ele dificultaria a adesão dos
proprietários de terra ao PRA. Sites voltados para o agronegócio
divulgaram as queixas.
Conforme o Estado apurou junto a
grupos que acompanharam de perto as discussões tanto na Secretaria do
Meio Ambiente quanto na de Agricultura, essa pressão teria levado à
revogação.
Aurélio Padovesi, vice-coordenador do Pacto pela Restauração
da Mata Atlântica, explica que, pelos termos da resolução, se o
proprietário de terra apresentasse como proposta de recuperação algo não
condizente com o que mandava a resolução e tivesse o projeto reprovado
duas vezes, ele teria obrigatoriamente de fazer o reflorestamento em sua
própria terra. Isso foi motivo de críticas.
Mas para ambientalistas, a resolução garantia o mínimo de
proteção ao meio ambiente. “O decreto sozinho já era bem favorável aos
ruralistas”, comenta Roberto Resende, da Iniciativa Verde. Para ele, ao
revogar a resolução, o governo diminuiu a parcela de restauração que
será feira dentro de São Paulo ou atendendo ao Estado.
Para ele, isso é contraditório em relação a promessas feitas
pelo governo durante a Conferência do Clima da ONU, realizada em
dezembro, em Paris. Ali foi assumido um compromisso de promover a
restauração de 300 mil hectares até 2020. “O governo assume que quer
reflorestar no Estado, mas na hora de criar o comando legal para isso,
que era o que existia na resolução, volta atrás. Sem isso, não sei como e
que vai ter restauração no Estado.”
A secretária do Meio Ambiente, Patrícia Iglecias, esteve
reunida nesta quarta-feira no final da tarde com o governador Geraldo
Alckmin e entre os assuntos discutidos esteve a resolução. Por meio de
sua assessoria de imprensa, ela informou que nesta quinta haverá uma
reunião entre ela, o secretário de Agricultura, Arnaldo Jardim, e o
governador para definir os próximos passos. Segundo ela, a resolução foi
revogada para que possa ser construída junto com a Agricultura.
Polêmica. Conforme o Estado
informou na semana passada, uma das polêmicas do PRA é a recuperação do
Cerrado. Apesar de a maior parte da cobertura vegetal original de São
Paulo ser de Mata Atlântica, cerca de 20% era de Cerrado.
O decreto deixa margem para diferentes interpretações sobre o
momento em que houve a inclusão desse bioma no Código Florestal. Alguns
consideram que ele só foi incluído nas regras da Reserva Legal em 1989 –
em vez de em 1934 (ano da primeira versão da lei). Assim, proprietários
com terras em área de Cerrado e que desmataram antes de 1989 poderiam
ficar isentos de recompor. Como a maior parte do desmatamento em São
Paulo é anterior a essa data, esse poderia ser o caso.
O decreto do PRA definiu que caberá à Secretaria de
Agricultura arbitrar sobre essa questão. É o órgão que vai analisar como
se deu a ocupação da terra em cada propriedade e dizer se ela ocorreu
conforme a lei ou não. Ambientalistas que acompanharam as negociações em
torno do decreto disseram que é como colocar a raposa cuidando do
galinheiro. Segundo o Estado apurou, a pasta é mais
favorável à leitura de que o Cerrado só foi incluído no Código Florestal
em 1989, ao contrário do que seria entendimento da secretaria do Meio
Ambiente.
Na semana passada, Patricia Iglecias tentou minimizar que
houvesse divergência entre as secretarias, mas reconheceu que a questão
poderia vir a ser questionada na Justiça. “Esse é um dilema jurídico de
forma geral. Existem posicionamentos diferentes, pode ser uma questão
que tenha talvez de ser decidida no Judiciário”, disse.
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