terça-feira, 7 de novembro de 2017

Conferência do Clima da ONU alerta para recordes de desastres climáticos

ANA CAROLINA AMARAL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BONN (ALEMANHA)

O planeta está batendo recordes seguidos das maiores temperaturas da história, de aumento do nível do mar, do número de tempestades, secas, inundações, incêndios, furacões e ciclones.
É o que afirma o relatório apresentado na plenária de abertura da COP-23, a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, que acontece até o final da próxima semana em Bonn, na Alemanha.
O documento da OMM (Organização Meteorológica Mundial) –agência da ONU para questões de clima, tempo e água- compila dados de diversas agências sobre a ocorrência de eventos climáticos extremos no mundo e revela um 2017 de recordes absolutos na frequência e na intensidade desses fenômenos.

O aumento da ocorrência de eventos extremos acompanha a curva de crescimento das emissões de gases-estufa e do aumento da média de temperatura global, como mostra o relatório.
De 2015 a 2016, a taxa de emissões de gases-estufa foi a maior já registrada, chegando a um total de 403,3 partes por milhão na atmosfera. Já a média de cinco anos, de 2013 a 2017, é 1,03°C acima do período pré-industrial e também a mais quente já registrada.

O nível do mar, no entanto, está retornando a valores mais próximos da tendência de longo prazo, depois de um pico em 2016 com aumento de 10 mm acima da média da última década -influenciada pelo último El Niño.

Os oceanos seguem, mesmo assim, entre as três maiores médias de temperatura já registradas, o que vem aumentando a destruição de corais e a acidificação das águas. As geleiras do Ártico e da Antártica também batem recordes negativos: as cinco extensões máximas mais baixas ocorreram de 2006 para cá.

EVENTOS EXTREMOS
Secas e tempestades aparecem no relatório da OMM como os eventos extremos com mais danos calculados. Na China, as perdas pela inundação na bacia do rio Yangtze, em 2017, somaram U$ 5 bilhões e 56 mortes.

Em Bangladesh, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), mais de 13 mil casos de doenças transmitidas pela água e infecções respiratórias foram relatados durante as ocorrências de tempestades com inundações e deslizamentos de terra neste ano.

Fortes chuvas também causaram desastres em Serroa Leoa, Colômbia, Nepal, Índia, Peru e Inglaterra. Entre outros recordes, o último inverno nos EUA foi o mais chuvoso registrado para Nevada e o segundo mais úmido para a Califórnia.

Já a severidade das secas castiga com mais danos os países mais pobres.
Com os rebanhos reduzidos em até 60% desde dezembro de 2016, a Somália tem hoje o dobro de pessoas à beira da fome: já são mais de 800 mil afetadas pelos prejuízos na agricultura e a redução de rebanhos, segundo o Programa Mundial de Alimentos da ONU.

As ondas de calor também chegaram a novos limites, passando de 54°C em vários locais do Oriente Médio e chegando a 43,5°C em janeiro em Puerto Madryn, na Argentina -a maior temperatura já registrado tão ao sul da Terra.

Os dados da OMM também mostram que o calor extremo e a seca contribuíram para incêndios florestais destrutivos recentes no Chile, Brasil, Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, Portugal, Espanha, Croácia, Itália e França.

Mas o extremo mais impressionante foi a série de furacões neste ano no Atlântico Norte.
Foi a primeira vez que dois furacões da Categoria 4 (Harvey e Irma) atingiram a terra no mesmo ano nos EUA. Irma teve ventos de 300 km/h por 37 horas -o mais longo no registro de satélite naquela intensidade, tendo passado três dias consecutivos como um furacão de Categoria 5, também o mais longo registrado.

Maria também atingiu a categoria 5 e causou grandes destruições. Para a OMM, "é provável que a mudança climática induzida pelo ser humano torne as taxas de precipitação mais intensas e que o aumento contínuo do nível do mar exacerbem os impactos das ondas de tempestade."

NEGOCIAÇÃO
É a primeira vez que um pequeno país insular preside a COP do Clima: Fiji, uma das ilhas mais vulneráveis à mudança climática, conduz as negociações da COP-23, que acontece na Alemanha por falta de condição de Fiji receber seus participantes. A ilha, que corre risco de extinção, podendo ficar totalmente submersa, foi devastada no ano passado pelo ciclone Winston, que matou 44 pessoas e destruiu um terço do PIB do país.

Com as negociações conduzidas pelos que mais dependem do seu sucesso, a expectativa é que o mecanismo de perdas e danos e as finanças para a adaptação aos impactos das mudanças climáticas ganhem maior importância na mesa.

Apesar da situação de vulnerabilidade, a presidência de Fiji pretende conduzir a COP com o que esse país chama de "Espírito Bula": com inclusão, simpatia e solidariedade. "Não se trata de apontar o dedo e culpar, mas de ouvir e aprender uns com os outros, compartilhar histórias, habilidades e experiências".

"Ao se concentrar nos benefícios da ação, esse processo movimentará a agenda global do clima", afirmou à imprensa o presidente da COP-23 e primeiro-ministro de Fiji, Frank Bainimarama.

Para o climatologista da USP Paulo Artaxo, a presidência de Fiji bate em uma tecla fundamental para o funcionamento do Acordo de Paris. "Mecanismos de compensação e transferência de tecnologia precisam sair de baixo da mesa para o centro da negociação", afirma.

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