RENATO GRANDELLE
Bloco de países insulares liderados por Fiji aumenta pressão por verbas contra catástrofes
A COP-23, do clima, é presidida por Fiji, país ameaçado pela alta do nível do mar. Um país de 890 mil habitantes distribuídos por 300 ilhas e atóis assumiu a presidência da Conferência do Clima de Bonn (COP-23), aberta ontem na Alemanha. Localizado no Pacífico Sul e sentenciado ao desaparecimento até o final do século, diante do aumento do nível do mar, Fiji reforçou seu pedido por financiamento para adaptação às mudanças climáticas e metas nacionais mais ambiciosas contra a emissão de poluentes. Os compromissos apresentados pela comunidade internacional para o Acordo de Paris resultariam em um aumento da temperatura global de 3 graus Celsius. Estados insulares como Fiji defendem que este índice seja cortado pela metade.
Harjeet Singh, líder global da ActionAid International em mudanças climáticas, ressalta que os eventos climáticos extremos são cada vez mais frequentes e testam a vulnerabilidade dos países menos desenvolvidos, que recebem recursos insuficientes das nações ricas.
— A presidência de Fiji tem a responsabilidade moral de assegurar que faremos um grande progresso relacionado ao financiamento climático — ressalta. — Precisamos que as negociações tragam resultados tangíveis. Não podemos ir embora e dizer para as pessoas que serão afetadas pelos desastres: “desculpem, vocês estão sozinhos”.
SUCESSÃO DE TRAGÉDIAS
O aumento do nível do mar, aliado ao crescente aquecimento das águas do Pacífico durante o fenômeno El Niño, aumentaram a suscetibilidade de Fiji a enfermidades relacionadas à água e aos alimentos. O país registrou surtos de diarreia em 2011, leptospirose após uma inundação em 2012 e dengue no ano seguinte. Também foi afetado em 2016 pelo ciclone Winston, que atingiu as casas de 40% da população e provocou um prejuízo de US$ 1,4 bilhão. A acidificação do oceano compromete a integridade dos recifes de corais.
Os mesmos problemas são vistos na maioria dos membros da Associação dos Pequenos Países Insulares (Aosis), um grupo de 44 nações costeiras de baixa altitude que, nas conferências climáticas, reivindicam que a elevação dos termômetros seja limitada a, no máximo, 1,5 grau Celsius, meta que muitos cientistas já consideram impraticável. A aliança encomendou um estudo, que será divulgado no ano que vem, detalhando como será o planeta se o aquecimento for restrito à marca que defendem.
Para Thelma Krug, vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, a ameaça à existência dos países insulares demonstra precisamente a urgência para conter os eventos extremos.
— Trata-se de uma nação tão pequena que não tem sequer a infraestrutura para hospedar a COP em seu território — conta. — Se a emissão e concentração de gases-estufa forem mantidas nos níveis atuais, não poderemos esperar que os países revejam suas metas climáticas apenas em 2023, como é previsto no Acordo de Paris. A expansão térmica do nível do mar e o derretimento das geleiras já motivam alguns Estados insulares a investir em planos de evacuação.
O avanço do oceano e a destruição de terras agrícolas levaram Tuvalu e Kiribati, outros países-ilhas, a comprar terras em Fiji para transferir sua população.
Coordenador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Jean Ometto considera que entregar o comando da COP-23 a Fiji é uma “ação emblemática”:
— Os países precisarão assumir compromissos mais contundentes para evitar que as ilhas percam território. É uma missão complicada, que tornou-se ainda pior quando os EUA, uma economia forte e poluente, decidiram cancelar o financiamento de operações que lutam contra eventos climáticos extremos.
Já Suzana Kahn, presidente do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, acredita que a presidência de Fiji é apenas uma “questão simbólica”:
— Não tem um efeito prático. Seria melhor se as delegações internacionais se dessem conta do impacto econômico causado em todo o planeta pela sucessão de eventos como furacões e tempestades. Alguns anos atrás, criou-se um fundo que receberia US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 em doações de países ricos direcionados àqueles que estão em desenvolvimento, mas ainda há poucos recursos e não temos regras definidas sobre a forma como devem ser administrados.
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