O que Lúcio Costa disse sobre outras atividades no Centro de Brasília
Tem sido objeto de diversas “interpretações” as possibilidades de funcionarem, no Centro de Brasília, portanto, na Escala Gregária, outras atividades além daquelas definidas para cada Setor, Norte e Sul: Comercial, Hoteleiro, Bancário e de Diversões, conforme se lê no Relatório do plano-piloto de Brasília – “O Partido”, Itens 4 a 8. Quanto aos usos, desde o princípio, restringiu-se para cada Setor o funcionamento exclusivo da atividade específica conforme sua denominação.
Quando da implantação do plano piloto, ocorreram as primeiras alterações ao projeto inicial, todas elencadas e esclarecidas no primeiro documento oficial elaborado sob a Coordenação do autor do projeto de Brasília, executado pelos arquitetos Maria Elisa Costa e Adeildo Viegas de Lima, sob a minha supervisão, juntamente com Luiz Alberto Cordeiro, a época Diretora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo – DAU/SVO/GDF e Diretor Técnico da TERRACAP/GDF, respetivamente. Aliás, esse documento, denominado “BRASÍLIA – 57- 85 (do plano-piloto ao Plano Piloto) “é um instrumento essencial para quem trabalha na gestão da Área Tombada, pois retrata, desde o princípio, Setor por Setor da cidade, não só as alterações quando da implantação de Brasília como, especialmente, especifica recomendações para cada um deles, sob o ponto de vista do uso do solo, da ocupação, do paisagismo e outros aspectos que o autor entendeu necessários registrar, em 1985, data de produção desse trabalho.
Neste caso, destaco a alteração referente ao acréscimo de Setores no centro da cidade, quando foram incluídos os Setores Norte e Sul Hospitalares, de Autarquias, o dos Tribunais e de Rádio e TV, não previstos originalmente. Estes Setores, portanto, constituem a Escala Gregária de Brasília, e para eles destaco as recomendações DO AUTOR, referentes ao uso do solo, ora em análise, registradas no documento “Brasília – 57 – 85”, são as seguintes:
“1. USO
- Estudar a diversificação dos usos – desde que não residenciais, com critérios específicos para cada Setor. “ (grifo meu)
Em 14 de outubro de 1987 foi publicado o Decreto Distrital no. 10.829, cuja Ementa é a de que: Regulamenta o art. 38 da Lei n° 3.751, de 13 de abril de 1960, no que se refere à preservação da concepção urbanística de Brasilia.
E ainda :
“considerando que o art. 38 da Lei n° 3.751, de 13 de abril de 1960.preserva o Plano Piloto de Brasilia, tal como apresentado por Lúcio Costa;
considerando que, para a exata aplicação do art. 38 da Lei n° 3.751, de 13 de abril de 1960, faz-se oportuna a edição de norma regulamentar que explicite o conceito do bem cultural por ela protegido,”
Esse Decreto estabelece para a Escala Gregária, o seguinte:
CAPITULO IV
Da Escala Gregária
Art. 7° — A escala gregária com que foi concebido o centro de Brasília, em torno da intersecção dos eixos monumental e rodoviário, fica configurada na Plataforma Rodoviária, e nos setores de Diversões, Comerciais, Bancários, Hoteleiros, Médico-Hospitalares, de Autarquia e de Rádio e Televisão Sul e Norte.
……..
III — Nos demais setores referidos no artigo anterior o gabarito não será uniforme, sendo que nenhuma edificação poderá ultrapassar a cota máxima de 65,00m (sessenta e cinco metros), sendo permitidos os usos indicados pela denominação dos setores de forma diversificada, ainda que se mantenham as atividades predominantes preconizadas pelo Memorial do Plano Piloto.
Como se vê, a legislação que subsidiou a inscrição de Brasília como Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO, portanto, a ser cumprida para fins de sua preservação e proteção, exclui a possibilidade de uso habitacional no Centro da cidade e permite
diversificação de usos outros, mesmo persistindo e mantendo as atividades predominantes em cada um dos Setores centrais, conforme inicialmente proposto.
Essa conceituação se consolida no documento anexo ao Decreto, denomiado “Brasília Revisitada”, onde o autor do projeto da cidade define onde poderá ocorrer expansão de Brasília para fins habitacionais.
Diante disso, o que se espera dos órgãos responsáveis pela preservação desse Patrimônio, tanto locais quanto de âmbito federal, é o cumprimento das recomendações expressas na legislação quanto ao uso do solo nos diversos Setores de Brasília e, especialmente, onde os documentos afirmam nominando onde e o que pode se instalar em cada localidade.
Vamos permitir com responsabilidade de cidadãos e humildade de profissionais da área de planejamento e urbanismo, que a cidade seja preservada como Patrimônio, já declarado e reconhecido internacionalmente. Tenhamos um mínimo de reconhecimento de que o ato de preserver patrimônio constitui construir nossa memória, nossa cultura, que transcende o tempo, as vaidades humanas e as debilidades momentâneas e circunstanciais.
Morar, em Brasília, tem lugar certo, pré-definido pelo autor do projeto da cidade e mudar isso é infringer a lei, por compromisso internacional. Aqui em Brasília Lúcio Costa instituiu um modo diferente de viver. Em superquadras, com aacesso único para veículo, com número determinado de pavimentos, com pilotis (pisos do pavimento térreo das projeções) livers para trânsito de pedestres, com acesso a pé aos serviços de primeira necessidade situados nos comércios locais e nas entrequadras. Resguardando a escala humana”. Tudo ao longo do Eixo Rodoviário da cidade.
Os problemas que Brasília vive hoje não são do projeto urbano, mas da inexistência do planejamento regional, que deveria ter sido elaborado pelas Instituições locais e federais. Estão com atraso de 58 ( cinquenta e oito) anos.
O candidato que se comprometer a respeitar e proteger Brasília, a promover um planejamento regional em conjunto com as demais unidades da federação, com a participação efetiva da sociedade civil, assegurada por lei, redirecionando Brasília para sua função principal de Capital da República terá, certamente, reconhecinhento de todos os brasilienses que acompanham essa luta permanente pelo respeito ao Patrimônio e à preservação da memória de Brasília.
Nenhum comentário:
Postar um comentário