Os Doces Bárbaros
Ruy FabianoOs tempos são de barbárie. Quando os rolés – a banalização da arruaça – se tornam o tema central da política brasileira, alçados ao patamar de luta social legítima e progressista contra a discriminação, alguma coisa está fora da ordem.
Pior: continuará. A proximidade da Copa do Mundo, contestada no país do futebol, e das eleições gerais, faz prever novas e sempre violentas manifestações.
Os governadores temem perder prestígio eleitoral com a ação da polícia e ela continuará intimidada no cumprimento do dever, pois a eles estão submetidas.
Não bastasse, o Brasil deve ser o único país do mundo em que a polícia faz greve. Em Brasília, não apenas fez, como espalha cartazes informando ao público – e aos bandidos – que não está disponível. Resultado óbvio: aumento da criminalidade.
Não estranha que tal país exiba, há mais de uma década, o índice de mais de 50 mil homicídios por ano. Índice de guerra civil. Barbárie pura. Sabe-se que tais índices decorrem em sua quase totalidade do narcotráfico, instalado nas periferias, que imola sobretudo jovens pobres.
Ali está a discriminação, a violência e a exclusão. Não nos shoppings centers, que se tornaram um dos raros espaços recreativos nessas mesmas periferias.
O narcotráfico age com conhecida desenvoltura – e não exatamente por competência, mas por consentimento. As atas do Foro de São Paulo, disponíveis na internet, registram a parceria dos governos do continente com organizações como as Farc, que tem no Brasil um parceiro seguro.
O Foro foi criado em 1990 por Lula e Fidel Castro, com o propósito de “tornar a América do Sul vermelha”. Dirigentes das Farc já foram recebidos, por exemplo, no Palácio do Piratininga, em Porto Alegre, pelos governadores Olívio Dutra e Tarso Genro. Gente amiga. A presidente Dilma, quando chefe da Casa Civil de Lula, deu emprego à esposa de um dirigente das Farc.
Não há fenômeno social maior que essa matança anual de jovens pobres. O tema, no entanto, está – e não se sabe por quanto ainda estará - ausente dos discursos políticos, quer do governo, quer da oposição. É quase certo que teremos mais uma campanha eleitoral em que os candidatos driblarão o assunto.
Mas os rolés estão na ordem do dia. Caetano Veloso disse à Folha que os rolés “são a sociedade brasileira se mexendo”. E os Black Blocks “têm a ingenuidade dos rebeldes sessentistas”, com os quais, diz ele, “me identifiquei no ato na segunda metade dos anos sessenta”. Essa maneira ligeira de diagnosticar questões graves diz muito do modo como agem intelectuais fora da zona de perigo, que querem exibir índole solidária e participativa.
É como o torcedor na plateia de uma luta de box, incitando o seu lutador a desferir golpes no adversário. Dando certo ou não, volta para casa sem nenhum hematoma, satisfeito ou frustrado com o resultado, mas absolutamente distante da dor alheia.
Os Black Blocks, como se sabe, têm sido o componente de arruaça e vandalismo das manifestações, tornando-as perigosas, sobretudo para os que ingenuamente as supõem espontâneas e fornecem-lhes, com sua presença, o peso demográfico que lhes dá realce. No dia seguinte, está nos jornais: ”As manifestações começaram pacíficas, mas depois os vândalos estragaram tudo”.
Os vândalos, mal sabem os manifestantes sinceros, são a azeitona desse pastel. O mesmo comando que convoca as pessoas com slogans cívicos pela internet organiza os vândalos, “os rebeldes sessentistas de Caetano Veloso”.
Desafiam a polícia porque a sabem manietada em função das eleições. São poucos os detidos, que, a seguir, são liberados, prontos para outras. Nenhuma manifestação começa violenta. Faz parte de sua logística aguardar o acúmulo de pessoas, a ocupação plena das ruas, para só então dar o seu recado.
Os rolezinhos também não são espontâneos. São convocados nas redes sociais exatamente para provocar tumulto e fornecer aos ativistas um discurso artificial antidiscriminação.
Os jovens comparecem supondo que defendem algum direito, numa sociedade que baniu os deveres e faz supor que democracia é o regime do vale-tudo. Não é: é o regime da lei.
Invadir propriedade privada não é novidade, nestes tempos de barbárie, em que sem-terra, índios e sem-teto figuram como massa de manobra de ideólogos que os manipulam à distância.
São instrumentos de um projeto revolucionário que quer abolir a propriedade e dar ao Estado mais poder para intervir na vida do cidadão. Em tal contexto, quem quer saber dos 50 mil jovens pobres assassinados do ano passado, do retrasado e assim por diante?
A Era PT já passou dos onze anos. São, portanto, 550 mil mortos no local do crime, fora os que morrem nos hospitais.
Não começou agora, é verdade. Mas, para quem prometia ao povo a redenção social – e a acena agora com rolezinhos e Black Blocks -, já era tempo de alguma mudança nesses números.
Ruy Fabiano é jornalista.
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