sexta-feira, 7 de março de 2014

Ser doador de órgãos no Brasil é colocar a vida em risco.



Enquanto Alagoas realiza com sucesso 33º transplante de coração, a familia de Paulinho não se conforma com sua morte provocada com a retirada de seus orgãos enquanto o garoto estava vivo.




Cinco horas depois, transplantado pelo SUS já respirava sem aparelhos

Publicado: 7 de março de 2014 às 12:23 -

Dr. José Wanderley Neto (o 4º, da esq. para a dir.) e sua equipe, com o paciente já na recuperação da UTI
Dr. José Wanderley Neto (o 4º, da esq. para a dir.) e sua equipe, com o paciente já
na recuperação da UTI

paciente de transplante
O paciente já na UTI. Agora, já respira sem aparelhos

A equipe chefiada pelo cirurgião José Wanderley Neto realizou seu 33º transplante de coração. A cirurgia ocorreu entre as 2h e 4h da madrugada desta sexta-feira (7), em Maceió, e com sucesso: menos de cinco horas depois, pelas 9h, o paciente, um homem de 49 anos, já se comunicava e respirava sem ajuda de aparelhos. A cirurgia foi realizada pelo SUS.

O paciente é um homem simples, morador do município de São Miguel dos Campos, a 120km de Maceió. Motorista, ele atua no transporte de cana-de-açúcar, entre as fazendas  e as usinas e destilarias da região. Ele era portador da doença de Chagas e sua única esperança de sobrevivência era o transplante, que afinal foi viabilizado por um doador de 52 anos, que morreu vítima de hemorragia cerebral.

Alagoano de Cacimbinhas, o médico José Wanderley Neto foi escolhido pelos próprios colegas como o mais admirado cirurgião cardiovascular do Brasil, segundo levantamento do anuário Análise, publicado em São Paulo e distribuído nacionalmente.

Ele e sua equipe implantaram há anos, em Alagoas, um importante centro de cirurgia cardiovascular, na Santa Casa de Misericórdia de Maceió, onde o transplante de hoje também foi realizado. Essa equipe é responsável por cerca de 30 mil  implantes de pontes de safena e cirurgias cardíacas, ao longo de três décadas.


16.02.2014 - 17h49

Tráfico de Órgãos – uma tragédia silenciosa

Além da violência crescente e da corrupção, o Brasil vive de algumas tragédias silenciosas. Uma delas está relacionada diretamente com algo que deveria salvar vidas, a doação de órgãos. Pela simples natureza de falta de controles, corrupção, sistema ineficaz, além da natureza maldosa do ser humano, muitas famílias têm suas vidas destruídas pela simples ganância do ser humano.

O Tráfico de Órgãos está relacionado como o novo crime internacional do século XXI. O crime atinge praticamente todos os países, mas alguns têm maiores incidências, por exemplo China, Índia, Paquistão, Rússia e Brasil. Mas é óbvio que em todos os países o crime acontece, mas em alguns, em função de “facilidades” políticas e de baixa fiscalização e investigação, acontece com mais relevância.

No caso brasileiro, parece que o olhar fechado das autoridades gera uma letargia no desenvolvimento de investigações. Segundo a OMS, de todos os transplantes realizados no mundo, 5% estão relacionados diretamente com o tráfico de órgãos.

O tema ainda parece um grande mistério, tanto para autoridades, como também para a mídia internacional. Como a busca do “Santo Graal”, o mundo parece não saber o que acontece. Mas pelos diversos relatórios internacionais de organismos que investigam o crime, como da própria Interpol, a estrutura por trás do tráfico de órgãos é extremamente inteligente e organizado, como uma verdadeira máfia envolta em sigilo, e com “peixes” muito grandes da política, da medicina e de outros grupos criminosos. 

Em especial no caso da China, é evidente que políticos estejam envolvidos, pois muitas das vítimas são condenados na justiça, e os condenados à morte, “são” literalmente, “aproveitados” para alimentar este nefasto comércio.


Engraçado que em uma pesquisa simples no site da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República do Brasil, o tema “tráfico de órgãos” não aparece em nenhum tópico e pesquisa. Por quê? Mesmo considerando que apareça o tema “tráfico de pessoas”, é de se imaginar que o mesmo tráfico possa alimentar o tráfico de órgãos.

E para piorar o problema, muitas autoridades, inclusive políticos, tratam o tema como uma grande “lenda urbana”, mas a Secretaria Nacional de Justiça, publicou em 2013 um documento referente ao tráfico de seres humanos (Cartilha Tráfico de Pessoas), e no documento consta efetivamente os problemas de tráfico de órgãos e seus impactos no Brasil e no mundo.

O Blog EXAME Brasil no Mundo conversou com o brasileiro, residente em Londres, Paulo Pavesi que sofre na “pele” a tragédia do crime de tráfico de órgãos. Seu filho, Paulo Veronesi Pavesi, o Paulinho, na época com 10 anos, sofreu um acidente no playground do prédio que morava. Depois de diversos exames, foi constatado morte encefálica, e a família resolveu doar os órgãos. 

Mas o Paulo Pavesi desconfiou da conta hospitalar e dos procedimentos realizados, e a partir daí começou, com faro investigativo, uma das maiores batalhas de sua vida. O caso de Paulo Pavesi e de seu filho Paulinho, é mais um entre muitos da tragédia silenciosa que acontece diariamente no mundo e no Brasil.

 Os médicos envolvidos no caso de Paulinho estão presos. Os mesmos foram condenados pela justiça, mas absolvidos pelo Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, onde o caso ficou conhecido como o caso de “Poços de Caldas”.

Paulo Pavesi escreveu o livro “Tráfico de Órgãos no Brasil – O que a máfia não quer que você saiba”, e também mantém o blog “Tráfico de Órgãos no Brasil” http://ppavesi.blogspot.com.br para contar a história de Paulinho, e de todas as tragédias silenciosas que acontecem sobre o tema, diferente do que as autoridades acham. 

Na verdade é uma tragédia urbana, e não uma lenda urbana.

Hoje, dia 16/02/2014, o cantor Lobão fará seu Hang Out com Paulo Pavesi sobre o caso “Paulinho” e sobre o tema Tráfico de Órgãos. A entrevista ao vivo será às 22hs . 

http://lobaoentrevista.blogspot.com.br/2014/02/lobao-e-paulo-pavesi-trafico-de-orgaos.html .

Hoje, Paulinho teria 24 anos.
Paulo Veronesi Pavesi - Paulinho
Paulo Veronesi Pavesi – Paulinho

Brasil no  Mundo: O tráfico internacional de órgãos é uma realidade mais do que presente  no Brasil. Por que o Brasil pouco fala sobre isso?

Paulo Pavesi: A imprensa é pressionada a não divulgar casos como o do meu filho, com o argumento de que pode atrapalhar a  doação de órgãos. No entanto, as pessoas que  pressionam a imprensa hoje, são justamente as que estão envolvidas com o  comércio ilegal de órgãos há décadas, e nunca são investigadas.

Esta pressão foi confirmada  durante a CPI do tráfico de órgãos em 2004, por delegados de policia federal. Órgãos estão sendo removidos de  pacientes em coma, para servir à hospitais públicos. Existe todo um processo  que estou detalhando no meu segundo livro.

Brasil no  Mundo: Você é uma vítima direta do tráfico internacional de órgãos. Seu filho  Paulinho, foi vítima desta atrocidade. Conte-nos um pouco de sua história.

Paulo Pavesi: É muito difícil para mim, como pai, resumir estes 13  anos. Até mesmo para escrever o livro foi difícil, pois tive que cortar muitas coisas. Tudo o que apurei é importante. Mas o que posso dizer é que  esbarrei em uma máfia que jamais imaginei existir. Não conheço nada tão sofisticado como o funcionamento desta organização. Tudo funciona perfeitamente como um relógio. Há muito dinheiro envolvido.

Brasil no Mundo: De tempos em tempos vemos notícias sobre o tráfico de órgãos no Brasil. Na sua visão, por quê a mídia não noticia de forma mais contundente?

Paulo Pavesi: Quando é trafico internacional, como o caso de Pernambuco, a imprensa fala amplamente. O que a imprensa não fala é sobre o que esta acontecendo dentro do Brasil.
Para você ter uma idéia de como eles estão infiltrados e estabelecidos, a justiça brasileira tem um programa chamado “doar é legal”. Você entra em qualquer site da justiça, de qualquer Estado, e vai encontrar um link para se tornar um doador de órgãos, emitindo um  certificado imediatamente. Nestes sites, a justiça  explica que o tráfico de órgãos não existe, e que tudo não passa de lenda urbana.

Quando eu ainda morava em São Paulo, as viaturas da polícia militar possuíam um adesivo no vidro traseiro dizendo “doe órgãos”.  Em redes sociais, você pode informar ao mundo todo que você é  doador de órgãos. As universidades estão recebendo com freqüência, médicos renomados que fazem palestras visando plantar a semente da doação nos jovens. Quando alguém se diz contrário é agressivamente repreendido, chamado de egoísta e ridicularizado. A doação deixou de ser uma ação de bondade, e está se tornando uma obrigação. A mídia tem colaborado muito para isso. O outro lado  da história – a verdade sobre os transplantes – está sendo censurada.

Brasil no Mundo: Como está sendo a sua luta contra o tráfico  internacional de órgãos?

Paulo Pavesi: Trata-se de uma batalha impossível. Você avança um  passo e eles te empurram outros três para trás. A luta não se limita a combater e denunciar os médicos envolvidos. Você precisa combater diversas frentes, como por exemplo o Ministério Público. Durante a CPI ficou evidente que TODOS os casos levados  ao Ministério Público, e analisados pela comissão, foram arquivados sem nenhuma investigação ou informação aos denunciados. 

Casos e mais casos comprovados de tráfico de órgãos, simplesmente, são ignorados inexplicavelmente. A máfia foi descoberta na década de 1980 em Taubaté, onde vários doadores tiveram os órgãos  retirados quando ainda estavam vivos. O processo de homicídio dos médicos de Taubaté levou 23 anos para ser julgado, e quase foi arquivado antes disso. Em  2011, estes médicos foram condenados a 17 anos de prisão, saíram pela porta da frente do fórum, continuam trabalhando normalmente e foram  inocentados pelo conselho regional de medicina. 

Estão aguardando o julgamento em segunda instância há três anos, e não há prazo para serem julgados. Os médicos  envolvidos no caso de Poços de Caldas, já foram condenados duas vezes por tráfico  de órgãos, e da mesma forma foram absolvidos pelo conselho regional de  medicina. Em ambos os casos, é possível identificar um mesmo núcleo que  funciona em São Paulo. 

Não por coincidência, nos últimos anos duas auditorias  do TCU (Tribunal de Contas da União) comprovaram que a fila de espera em São Paulo é sujeita a fraudes.  

Outro fator que chama a atenção, é que mesmo condenados, os médicos passam a  ser protegidos por diversos setores da sociedade, e ignoram as sentenças  judiciais, alegando inocência. 

No caso do meu filho, os médicos insistem em  dizer que tudo é uma grande mentira, apesar das inúmeras provas  existentes.

Brasil no Mundo: Quais os últimos resultados em  relação ao caso do seu filho?

Paulo Pavesi: O processo tem duas vertentes. Na primeira, quatro médicos respondem pelo artigo 121 do código penal, homicídio doloso qualificado por motivo torpe. 

Este deve ir a júri popular em breve, sem data marcada. Na segunda, três médicos responderam pela retirada ilegal dos órgãos em paciente vivo que resultou em morte (homicídio também), e estão condenados em primeira instância. 

Como estes mesmos médicos já foram condenados em outro caso,  tiveram a prisão decretada e continuam presos até o momento.

Brasil no Mundo: Em um texto seu publicado no seu blog “A verdade. Nada mais que a verdade”, você comenta sobre o modelo nazista. Você acredita que esta filosofia ainda se instala no Brasil?

Paulo Pavesi: Nunca foi tão real. Nos estamos vivendo um círculo vicioso e perigoso na saúde pública. Não temos leitos de UTI suficientes para  todos que precisam. 

Brasileiros estão tendo de recorrer à defensoria publica para conseguir uma vaga. Para que esta vaga apareça, não existe milagre. Alguém precisa desocupar. Com a ordem judicial, sem perceber, a justiça está condenando pacientes em coma à morte. 

Ao mesmo tempo, existe dezenas de casos que estou acompanhando onde um leito de UTI é negado, a pessoa tem a morte encefálica diagnosticada por não receber o tratamento adequado, e em seguida é levada para a UTI para que os órgãos sejam mantidos para transplantes. Esta matemática é bastante estranha. 

O mesmo  Estado que está dizendo que precisamos salvar vidas doando órgãos, está negligenciando o atendimento de pacientes que poderiam ser salvos, transformando-os em doadores. 

Uma solução de mau gosto. Em uma única ação eles liberam leitos de UTI e obtêm órgãos para transplantes. Infelizmente, parece  que o brasileiro não consegue entender esta situação, e acredita que o que acontece nos hospitais “é assim mesmo”.

Brasil no Mundo: Considerando todo o seu  esforço investigativo, como o Brasil é visto no mundo em relação ao tema de  tráfico internacional de órgãos?

Paulo Pavesi: O Brasil é citado em várias publicações internacionais como fonte fácil para obtenção de órgãos. Há um hospital em São Paulo, em que você pode encontrar pessoas com problemas renais, e com um certo poder econômico, vindas de países vizinhos como Paraguai,  Argentina, Peru e Colômbia, e aguardando um órgão para transplante. 

O único lugar onde não se pode falar que o Brasil tem tráfico de órgãos é  dentro do próprio Brasil. Cito um exemplo muito interessante. Há alguns anos, um filme de ficção chamado “Turistas, Go home!” em que retratava o tráfico de  órgãos no Brasil foi amplamente criticado, e quase teve sua exibição suspensa pela Embratur. O Brasil vive de aparências. A realidade é muito diferente.

Brasil no Mundo: Que orientações você daria para as  famílias brasileiras?

Paulo Pavesi: Simples. Não doe órgãos. É muito  difícil dizer isso, e quero lembrar que eu doei os órgãos espontaneamente, acreditando no sistema. Mas diante do que está acontecendo, não podemos tomar uma decisão séria como esta, sem segurança. Nem mesmo médicos confiam no sistema.

Quando foi implantada a lei de doação presumida, apenas 2% dos médicos brasileiros colocaram a frase “doador  de órgãos e tecidos” em seus documentos. Chegamos num ponto em que os  conselhos de medicina estão contrariando suas próprias regulamentações para  defender condenados por tráfico de órgãos.

O presidente da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), é testemunha de defesa de vários acusados. 

Aliás, um irmão do principal acusado no caso Paulinho já foi presidente da ABTO.   

Enquanto o Brasil não enfrentar  este problema seriamente, ser doador no Brasil é colocar a vida em risco. Protocolos criados pelo próprio Conselho de Medicina estão sendo ignorados para produzir doadores, com o apoio do próprio conselho.

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