quinta-feira, 2 de julho de 2015

Dilma diz que não respeita delator, mas foi ela quem sancionou a lei da “Delação Premiada” – e até se gabou disso num debate

30 de junho de 2015

A presidente fez um ataque vil e covarde a quem recorre à Delação Premiada, por conta do depoimento de Ricardo Pessoa, da UTC, no qual seu nome e o de sua campanha, além de mais dois ministros e até mesmo Lula e Haddad. Mas foi Dilma Rousseff quem sancionou a lei que regula isso.


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Quando o assunto é Dilma, nunca se sabe ao certo o que exatamente é burrice e o que é a mais pura má-fé. Muitos atos parecem reunir esses dois atributos numa mistura quase macabra e invariavelmente tragicômica. A última da presidente foi atacar o instituto da Delação Premiada.


Ela disse: “não respeito delator”, chegando a ponto de comparar o procedimento legítimo da Delação Premiada ao traidor da Inconfidência Mineira ou mesmo à resistência a regimes de exceção. Foi uma lambança, falamos disso aqui.


Mas a coisa é ainda pior (com Dilma, sabemos, a coisa é sempre pior). O absurdo da vez é que foi justamente ela quem sancionou a lei reguladora do instituto da Delação Premiada (Lei 12850/2013).


Vale comentar algumas partes desse dispositivo – repita-se: sancionado por Dilma! – cujo conteúdo parece ainda desconhecido de boa parte da classe política e certa parcela da mídia (os excertos a seguir constam do Capítulo II, Seção I – “Da Colaboração Premiada”):

“Art. 4o O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:


I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV – a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;
V – a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.”

Notem que a concessão do benefício é atrelada à identificação de demais autores dos delitos, revelação da estrutura da organização, entre outros requisitos. Não basta simplesmente contar uma história às autoridades, é preciso que ela tenha consistência, que obviamente será checada antes de qualquer decisão favorável ao delator.
Sigamos:
“§ 1o Em qualquer caso, a concessão do benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a eficácia da colaboração.
§ 2o Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).”
A lei ainda leva em consideração gravidade do fato criminoso, personalidade do colaborador e a EFICÁCIA da colaboração (ou seja: uma delação inócua não garante benefício, é preciso que resulte no esclarecimento efetivo dos fatos criminosos denunciados). O perdão resulta da “relevância” da colaboração.


Não se trata, portanto, de uma pura e simples “caguetagem”, mas sim depoimento que PRECISA ser corroborado por fatos e indícios, além de ter EFICÁCIA no esclarecimento dos crimes praticados pela quadrilha.


Como sabemos, e para tanto basta recorrer à triste história recente do país, algumas práticas criminosas mais complexas são de difícil possibilidade de descoberta natural, a menos que uma das partes faça a delação, explicando às autoridades o que de fato acontecia e, assim, levando-as a juntar provas até então bem protegidas.
Dilma, ontem, disse não respeitar a delação premiada (como se coubesse a ela a prerrogativa desse respeito). Mas o curioso é que, na campanha para a reeleição, a presidente ainda por cima se gabou da lei sancionada por ela própria:
“A candidata destacou que sua determinação de punir os culpados é “total”. “Duas leis aprovadas no meu governo são fundamentais para isso. Uma é a lei 12.830, que garante a independência do delegado…” (grifo nosso)
Sim, vocês acabaram de ler alguns artigos da Lei 12.830. É justamente o dispositivo legal que regula a Delação Premiada, agora atacada por Dilma – coincidentemente, quando sua campanha, alguns outros ministros e até Lula e Haddad são citados.


Para (em vão) tentar escapar, Dilma ataca até mesmo uma lei que ela própria sancionou e da qual contou vantagem num debate televisivo. Como já disseram, e comprova-se isso, são capazes de fazer o diabo.

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