Por Eduardo Gonçalves, na VEJA.com. Ainda voltarei ao tema.
Nunca antes na história os movimentos sem-teto tiveram tanto protagonismo na cidade de São Paulo como nos dois primeiros anos de administração do prefeito Fernando Haddad.
Pela
primeira vez, os grupos de sem-teto participaram ativamente da
elaboração do Plano Diretor Estratégico, que traça diretrizes para o
crescimento urbano da capital paulista nos próximos dezesseis anos –
cercaram inclusive a Câmara Municipal para pressionar vereadores.
Também
emplacaram um assessor na presidência da Companhia Metropolitana de
Habilitação (Cohab). Os números são elucidativos: dados da Secretaria de
Segurança Pública do Estado apontam que as invasões a imóveis
praticamente triplicaram nos últimos dois anos em relação aos dois
anteriores – de janeiro de 2013 a novembro de 2014, foram registradas
681 invasões, ante 257 em 2011 e 2012, conforme revelou o jornal Folha
de S. Paulo.
O
crescimento tem um preço: ao longo do ano, a maior metrópole do país
passou a conviver com uma rotina de manifestações promovidas por
sem-teto, algumas marcadas por atos de vandalismo e depredações, que
provocam o caos no trânsito com o bloqueio de artérias centrais da
cidade e prejudicam o comércio.
Em 2014, o paulistano conheceu o poder
de fogo do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), liderado por
Guilherme Boulos, que profissionalizou a baderna e montou uma indústria
de invasões a terrenos. Em julho, Ministério Público Estadual acionou a
Justiça contra os supostos privilégios concedidos pela gestão Fernando
Haddad ao movimento de Boulos.
Apesar de
ser hoje o mais barulhento dos movimentos, o MTST não é o único.
A Frente de Luta por Moradia (FLM) congrega ao menos outros dez
movimentos e ocupa treze prédios no Centro da capital. Recentemente, um
grupo decidiu romper com a FLM e fundou o Movimento Sem Teto de São
Paulo (MSTS), responsável por sete prédios invadidos na cidade. É do
novo MSTS que partem as principais críticas à relação estabelecida entre
a administração municipal e os grupos de sem-teto.
Na última
semana, o MSTS invadiu um edifício do antigo INSS, reformado com
recursos da Caixa Econômica Federal, que seria entregue a famílias
associadas à Unificação das Lutas de Cortiços e Moradia (ULCM), um dos
grupos que formam a FLM. A reforma do prédio havia sido viabilizada pelo
programa federal Minha Casa, Minha Vida Entidades, que repassa dinheiro
a associações habilitadas no Ministério das Cidades para a construção
de moradia popular — respeitando alguns critérios pré-estabelecidos,
como o limite de renda, os grupos ganham o direito de indicar os
beneficiários.
O líder do
MSTS, Robinson Nascimento dos Santos, classificou a invasão como uma
“forma de protestar e cobrar” da prefeitura o mesmo tratamento que os
outros movimentos recebem. Segundo ele, há uma “perseguição política”
por parte da gestão Haddad por ele ter se desfiliado do PT. “Nós
queremos mostrar para o prefeito que também temos direito. A partir do
momento que eu passei para o PSDB, ele não quer mais atender a gente”,
afirmou Santos.
O
secretário-geral do MSTS, Wladimir Ribeiro Brito, lembrou as ações
violentas promovidas pela FLM durante a reintegração de posse do antigo
Hotel Aquarius, no dia 16 de setembro, que transformou o Centro de São
Paulo em um campo de batalha. “Os outros colocam fogo em ônibus, fazem
tudo o que fazem e ganham os benefícios. Eles recebem a cereja do bolo e
a gente só fica com a raspa do tacho. Tem que ser dividido igual. Se
eles têm o direito a um real, nós também queremos um real, se eles têm
direito a 1.000 reais, nós também queremos 1.000 reais”, disse Brito.
O líder da
ULCM, Sidnei Pita, faz campanha para o PT em sua página no
Facebook. Seu movimento tem uma associação cadastrada no Ministério das
Cidades para receber projetos do Minha Casa, Minha Vida Entidades. Além
do prédio do antigo INSS que foi tomado pelo MSTS, o movimento recebeu
da Secretaria do Patrimônio da União o edifício Ipiranga, que também
passa por uma reforma financiada pela Caixa. O imóvel foi cedido ao
grupo em uma cerimônia que teve a participação do ex-presidente Lula, em
2009. Pita nega favorecimento: “A prefeitura não dá privilégio para
ninguém. A questão é ser organizado”, disse.
A invasão
ao imóvel do antigo INSS não é a maior preocupação de Haddad em relação
ao MSTS. Desde novembro do ano passado, o grupo mantém uma das maiores
invasões no Centro de São Paulo, a do antigo Cine Marrocos, que abriga
mais de 700 famílias, segundo o movimento. A prefeitura havia comprado o
imóvel com a intenção de transformá-lo na nova sede da Secretaria
Municipal de Educação. A prefeitura já acionou a Justiça
pela reintegração de posse, cuja data ainda não foi agendada.
Outra
reclamação da liderança do MSTS é ter que se encontrar com um dos
maiores líderes da FLM Osmar Silva Borges nas reuniões com o secretário
municipal de Habitação, José Floriano Marques. Borges foi indicado a um
cargo comissionado de assessor de superintendência na presidência da
Companhia Metropolitana de Habilitação (Cohab).
Em nota
enviada ao site de VEJA, a administração municipal afirmou que “não faz
mediação” entre os movimentos e repudiou as invasões a imóveis públicos.
“A prefeitura de São Paulo condena as invasões de prédios e terrenos
públicos destinados a programas habitacionais. A administração mantém
diálogo com entidades e movimentos e reafirma que não aceita pressões
nem faz mediações entre grupos.”
Plano Diretor
Na última semana, o prefeito Fernando Haddad alterou um decreto com respaldo no novo Plano Diretor para liberar a construção de mais de 3.000 moradias em uma área de manancial próxima à represa de Guarapiranga, na Zona Sul de São Paulo. O terreno abriga uma das maiores invasões do MTST, chamada de Nova Palestina. Em outra lei, sancionada em agosto, o prefeito regularizou a moradia em uma invasão na Zona Leste, conhecida como Copa do Povo, também do MTST. A expectativa é que os dois conjuntos habitacionais sejam feitos em parceria com o movimento.
Na última semana, o prefeito Fernando Haddad alterou um decreto com respaldo no novo Plano Diretor para liberar a construção de mais de 3.000 moradias em uma área de manancial próxima à represa de Guarapiranga, na Zona Sul de São Paulo. O terreno abriga uma das maiores invasões do MTST, chamada de Nova Palestina. Em outra lei, sancionada em agosto, o prefeito regularizou a moradia em uma invasão na Zona Leste, conhecida como Copa do Povo, também do MTST. A expectativa é que os dois conjuntos habitacionais sejam feitos em parceria com o movimento.
Com a
proposta de construir 55.000 unidades habitacionais até o fim do
mandato, Haddad conseguiu o apoio quase majoritário dos sem-teto durante
a campanha eleitoral, em 2012. No final deste ano, em mais um aceno
favorável aos grupos alinhados ao PT, ele prometeu entregar 20% dessas
55.000 casas (11.000) às associações ligadas aos sem-teto por meio do
Minha Casa, Minha Vida Entidades.
Mais uma vez o Ministério Público
reagiu e instaurou na sexta-feira um inquérito para investigar o caso.
Segundo a ação, a proposta da prefeitura “pode ferir o princípio de
isonomia” novamente ao privilegiar os movimentos de sem-teto em
detrimento das pessoas que estão na fila esperando por moradia.
Mais do
que uma iniciativa positiva, a construção de moradias populares é dever
de todo bom gestor público. E não causa surpresa que movimentos sociais
tenham mais espaço e interlocução na atual administração municipal dada a
histórica ligação deles com o Partido dos Trabalhadores. O problema é
quando os interesses vão muito além de unidades habitacionais. São
políticos
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