O GLOBO
Coluna Marco Antônio Villa
05/01/2016 0:00
Revolução Industrial não é citada uma vez sequer, assim como a Revolução Francesa ou as revoluções inglesas do século XVII
O
Ministério da Educação está preparando uma Revolução Cultural que
transformará Mao Tsé-Tung em um moderado pedagogo, quase
um “reacionário burguês.” Sob o disfarce de “consulta pública”,
pretende até junho “aprovar” uma radical mudança nos currículos dos
ensinos fundamental e médio — antigos primeiro e segundo graus. Nem a
União Soviética teve coragem de fazer uma mudança tão
drástica como a “Base Nacional Comum Curricular.”
No
caso do ensino de História, é um duro golpe. Mais ainda: é um crime de
lesa-pátria. Vou comentar somente o currículo de
História do ensino médio. Foi simplesmente suprimida a História Antiga.
Seguindo a vontade dos comissários-educadores do PT, não teremos mais nenhuma aula que trata da Mesopotâmia ou do Egito. Da herança greco-latina os nossos alunos nada saberão. A filosofia grega para que serve? E a democracia ateniense? E a cultura grega? E a herança romana? E o nascimento do cristianismo? E o Império Romano? Isto só para lembrar temas que são essenciais à nossa cultura, à nossa história, à nossa tradição.
Seguindo a vontade dos comissários-educadores do PT, não teremos mais nenhuma aula que trata da Mesopotâmia ou do Egito. Da herança greco-latina os nossos alunos nada saberão. A filosofia grega para que serve? E a democracia ateniense? E a cultura grega? E a herança romana? E o nascimento do cristianismo? E o Império Romano? Isto só para lembrar temas que são essenciais à nossa cultura, à nossa história, à nossa tradição.
Mas
os comissários-educadores — e sua sanha anticivilizatória — odeiam
também a História Medieval. Afinal, são dez séculos
inúteis, presumo. Toda a expansão do cristianismo e seus reflexos na
cultura ocidental, o mundo islâmico, as Cruzadas, as transformações
econômico-políticas, especialmente a partir do século XI, são
desprezadas.
O Renascimento — em todas as suas variações — foi simplesmente ignorado. Parece mentira, mas, infelizmente, não é. Mas tem mais: a Revolução Industrial não é citada uma vez sequer, assim como a Revolução Francesa ou as revoluções inglesas do século XVII.
O Renascimento — em todas as suas variações — foi simplesmente ignorado. Parece mentira, mas, infelizmente, não é. Mas tem mais: a Revolução Industrial não é citada uma vez sequer, assim como a Revolução Francesa ou as revoluções inglesas do século XVII.
O
apagamento da História, ao estilo Ministério da Verdade de “1984,” não
perdoou a história dos Estados Unidos — neste caso,
abriu exceção somente para a região onde esteve presente a escravidão.
Do século XIX europeu, tudo foi jogado na lata de lixo: as unificações
alemã e italiana, as revoluções — como a de 1848 —, os dilemas
político-ideológicos, as mudanças econômicas, entre
outros temas clássicos e indispensáveis à nossa História.
Os
policiais da verdade não perdoaram também a História do Brasil. Os
movimentos pré-independentistas — como as Conjurações
Mineira e Baiana — não existiram, ao menos no novo currículo. As
transformações do século XIX, a economia cafeeira, a transição para a
industrialização foram desconsideradas, assim como a relação entre as
diversas constituições e o momento histórico do país,
isto só para ficar em alguns exemplos.
Mas,
afinal, o que os alunos vão estudar? No primeiro ano, “mundos
ameríndio, africanos e afro-brasileiros.” Qual objetivo?
“Analisar a pluralidade de concepções históricas e cosmológicas de
povos africanos, europeus e indígenas relacionados a memórias,
mitologias, tradições orais e a outras formas de conhecimento e de
transmissão de conhecimento.”
E também: “interpretar os movimentos sociais negros e quilombolas no Brasil contemporâneo, estabelecendo relações entre esses movimentos e as trajetórias históricas dessas populações, do século XIX ao século XXI.” Sem esquecer de “valorizar e promover o respeito às culturas africanas, afro-americanas (povos negros das Américas Central e do Sul) e afro-brasileiras, percebendo os diferentes sentidos, significados e representações de ser africano e ser afrobrasileiro.”
E também: “interpretar os movimentos sociais negros e quilombolas no Brasil contemporâneo, estabelecendo relações entre esses movimentos e as trajetórias históricas dessas populações, do século XIX ao século XXI.” Sem esquecer de “valorizar e promover o respeito às culturas africanas, afro-americanas (povos negros das Américas Central e do Sul) e afro-brasileiras, percebendo os diferentes sentidos, significados e representações de ser africano e ser afrobrasileiro.”
No
segundo ano — quase uma repetição do primeiro — o estudo é sobre os
“mundos americanos.” Objetivo: “analisar a pluralidade
de concepções históricas e cosmológicas das sociedades ameríndias a
memórias, mitologias, tradições e outras formas de construção e
transmissão de conhecimento, tais como as cosmogonias inca, maia, tupi e
jê.”
Ao imperialismo americano, claro, é dado um destaque especial. Como contraponto, devem ser estudadas as Revoluções Boliviana e Cubana; sim, são exemplos de democracia. E, no caso das ditaduras, a sugestão é analisar o Chile de Pinochet — de Cuba, nem tchum.
Ao imperialismo americano, claro, é dado um destaque especial. Como contraponto, devem ser estudadas as Revoluções Boliviana e Cubana; sim, são exemplos de democracia. E, no caso das ditaduras, a sugestão é analisar o Chile de Pinochet — de Cuba, nem tchum.
No
terceiro ano, chegamos aos “mundos europeus e asiáticos.” Se a Guerra
Fria foi ignorada, não foi deixado de lado o estudo
da migração japonesa para o Paraguai na primeira metade do século XX
(?). O panfletarismo fica escancarado quando pretende “problematizar as
juventudes, discutindo massificação cultural, consumo e pertencimentos
em diversos espaços no Brasil e nos mundos europeus
e asiáticos nos séculos XX e XXI.”
Ou quando propõe “relacionar as sociedades civis e os movimentos sociais aos processos de participação política nos mundos europeus e asiáticos, nos séculos XX e XXI, comparando-os com o Brasil contemporâneo.”
Ou quando propõe “relacionar as sociedades civis e os movimentos sociais aos processos de participação política nos mundos europeus e asiáticos, nos séculos XX e XXI, comparando-os com o Brasil contemporâneo.”
Quem
assina o documento é o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro,
um especialista brasileiro em Thomas Hobbes. Porém,
Hobbes ou o momento em que viveu (o século XVII inglês) são
absolutamente ignorados pelos comissários-educadores. Para eles, de nada
vale conhecer Hobbes, Locke, Platão, Montesquieu, Tocqueville,
Maquiavel, Rousseau ou Sócrates. São pensadores do mundo europeu.
O que importa são as histórias ameríndias, africanas e
afro-brasileiras.
O
documento está recheado de equívocos, exemplos estapafúrdios, de
panfletarismo barato, de desconhecimento da História. Os
programas dos cursos universitários de História foram jogados na lata
de lixo e há um evidente descompasso com a nossa produção
historiográfica.
A proposta é um culto à ignorância. Nenhuma democracia no mundo ocidental tem um currículo como esse. Qual foi a inspiração? A Bolívia de Morales? A Venezuela de Chávez? A Cuba de Castro? Ou Lula, aquele que dissertou sobre a passagem de Napoleão Bonaparte pela China?
Marco Antonio Villa é historiadorA proposta é um culto à ignorância. Nenhuma democracia no mundo ocidental tem um currículo como esse. Qual foi a inspiração? A Bolívia de Morales? A Venezuela de Chávez? A Cuba de Castro? Ou Lula, aquele que dissertou sobre a passagem de Napoleão Bonaparte pela China?
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