quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Gregorio Duvivier: “Festa estranha, gente esquisita”


Contribuição da assistente social e ambientalista, Marta Paiva

*Artigo do ator e escritor Gregório Duviver, originalmente publicado na edição desta segunda-feira (21/12) da Folha de São Paulo.


Você também já deve ter se perguntado: “Por que o Congresso brasileiro é tão conservador?”. Eduardo Cunha costuma responder pra você e pra quem quiser ouvir que o Congresso foi eleito pelo povo, logo o conservadorismo do Congresso reflete o conservadorismo do povo. Imagino que ele só tenha enviado milhões não declarados para a Suíça porque é isso que todo brasileiro faz. A culpa é do povo, sempre.

Cunha: tira o povo dessa roubada. Se tem alguém que não está presente no Congresso nacional (além dos deputados que, de modo geral, preferem trabalhar de casa) é o povo brasileiro.

As mulheres são quase 52% da população. No entanto, você consegue encontrar mais mulheres jogando rúgbi do que na Câmara dos Deputados. O povo brasileiro se declara, em sua maioria, negro ou pardo (53%). O Senado brasileiro tem menos negros que o Senado da Suécia (não é uma expressão, é um fato). Quanto aos jovens, melhor procurar num jogo de bocha. Jovens com até 34 anos são 39% do eleitorado e 10% do Congresso.

O mesmo vale para os gays: apenas um deputado entre os 513 se declara gay. Já os transexuais e a população indígena não tem a mesma sorte. Nenhuma das duas minorias tem sequer um deputado federal ou senador. Em compensação, os empresários, apenas 4% da população, são 43% dos deputados. Sim: proporcionalmente, a Câmara dos Deputados tem dez vezes mais empresários do que o Brasil.

Muito se fala sobre a tal festa da democracia. Que festa estranha com gente esquisita. Eu não tô legal. O Congresso brasileiro para o salão de jogos do Country Club: uma versão mais masculina, mais branca, mais hétero, mais velha e mais empresária do Brasil. Mas por quê? Será que o brasileiro só confia em homem branco hétero velho empresário?

Uma rápida pesquisa revela que eleger um deputado custa, em média, R$ 6 milhões. Uma rápida pesquisa revela que quem tem R$ 6 milhões no Brasil é homem branco hétero velho empresário. O Congresso brasileiro não é a cara do Brasil. Ele é a cara da elite do Brasil. Não é o povo brasileiro que é conservador. É o dinheiro brasileiro que é conservador.

Pense no lado bom: talvez o Brasil não seja um país intrinsecamente corrupto ou reacionário. Ou talvez seja. Isso a gente ainda não sabe. Pra isso seria preciso uma coisa inédita: democracia. Por enquanto, pra participar da festa, só com pulseirinha VIP de R$ 6 milhões (mas relaxa que tem consumação).


 

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