Na manhã de 23 de agosto, a lavradora Maria da Consolação da Silva, 63, encontrou dezenas de peixes mortos no córrego atrás de casa. Eram traíras e piabas boiando de barriga para cima no meio de uma água cheia de espuma.
"Não sei até hoje o que matou os peixes", conta dona Maria. "Só sei que não sobrou nem um lambarizinho nessa água", diz ela, que mora há 20 anos na área e usava o córrego para pescar, lavar roupa e dar água aos animais.
Segundo o laudo do centro tecnológico Cetec, os peixes morreram de hemorragia por causa da água contaminada com amônia. O governo acredita que soda cáustica tenha sido despejada na água.
A empresa afirma estar investigando o caso e diz que o laudo não é conclusivo.
A mortandade de peixes é só o mais novo capítulo da história atribulada do maior mineroduto do mundo, o Minas Rio, projeto que o ex-bilionário Eike Batista vendeu à Anglo American em 2008.
Com cinco anos de atraso e custo US$ 10 bilhões acima do estimado, um dos maiores estouros de orçamento da história da mineração, o mineroduto começou a funcionar no fim de outubro.
Trata-se de um duto de 529 quilômetros que sai da mina e da planta de beneficiamento de minério, em Conceição do Mato Dentro (MG), passa por 32 cidades e chega ao porto do Açu (RJ), levando minério misturado com água.
O primeiro navio, com 80 mil toneladas de minério de ferro, zarpou rumo à China.
Na esteira do projeto Minas Rio, que inclui mina, mineroduto e porto, problemas se acumulam: casas próximas ao mineroduto tremem e trincam, moradores se queixam da poluição dos rios e eliminação de nascentes, técnicos disseram terem sido achacados para liberar licenças ambientais, muitos contestam a venda de suas propriedades à empresa.
Para completar, em meio a uma das piores secas que Minas Gerais já viveu, a mina e o mineroduto consomem 2.500 metros cúbicos de água por hora, quantidade suficiente para abastecer uma cidade de 220 mil habitantes.
"Há uma seca e não temos controles suficientes, essas outorgas para uso da água precisam ser revistas", diz Marcelo Mata Machado, promotor público de Conceição.
TERREMOTO
O mineroduto passa a cem metros do terreno de Rosemeire Teixeira, 50, na comunidade do Turco. Quando ligam as bombas, tudo na casa vibra. "Parece terremoto: a gente senta na cama e fica tudo tremendo, os pratos batem uns nos outros. Olha esta rachadura aqui", mostra.
No estudo de impacto ambiental (EIA-Rima), a mineradora dizia que "a localização relativa das estações de bombeamento, combinada com o nível de ruído das bombas, não trará incômodos às comunidades".
Os moradores do Turco não são considerados atingidos pela obra e não têm direito a indenização.
A Anglo admite que foi detectada vibração no mineroduto, que diz ser "fato incomum", e que "tomará as medidas cabíveis".
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