Quem
me acompanha aqui sabe que já discordei de Joaquim Barbosa, ex-ministro
do Supremo, muitas vezes. E já concordei com ele também. E nem sempre o
PT estava em pauta. Eu não critico ou aplaudo pessoas, mas sua atuação
pública e suas opiniões. Barbosa voltou a ser alvo da fúria dos
petralhas porque, há quatro dias, postou esses dois comentários em sua
conta no Twitter — eu os reproduzo também em texto para facilitar a vida
de quem replica meus posts.
1) “Nós, brasileiros honestos, temos o direito e o dever de exigir que a Presidente Dilma demita imediatamente o Ministro da Justiça.”
2) “Ajuda à memória coletiva: pesquisem sobre 1 controvertida decisão do TCU de jun/jul 2012, pouco antes do início do julgamento da Ap 470.”
Vamos
entender o que ele escreveu. Barbosa se referia à reportagem da mais
recente edição da revista VEJA, informando que o ministro da Justiça,
José Eduardo Cardozo, fez uma reunião, em seu gabinete, com o advogado
Sérgio Renault, defensor da empreiteira UTC, que pertence ao empresário
Ricardo Pessoa, preso desde novembro pela Operação Lava-Jato. O
ex-deputado e advogado petista Sigmaringa Seixas também estava presente.
Pessoa é visto pelo Planalto como homem-bomba. Amigo pessoal de Lula,
considera que foi abandonado pelo petismo e já deixou registrado num
manuscrito que a dinheirama financiou os companheiros, inclusive a
candidatura de Dilma. É claro que há aí uma senda para o impeachment,
daí o pânico.
Cardozo
primeiro negou o encontro. Ao perceber que era inútil, admitiu o que
seria uma conversa informal — parte de suas atribuições, segundo disse. O
estranho é que a audiência não estava em sua agenda. Mais estranhas
ainda foram as, digamos, garantias que ele passou a Renault em sua
conversa. Anunciou uma reviravolta no caso da Lava-Jato logo depois do
Carnaval, quando nomes graúdos da oposição também seriam tragados pela
voragem. Como o ministro sabe? Eis um mistério.
Fato:
depois da conversa de Cardozo com o advogado, a UTC, a OAS e a Camargo
Corrêa recuaram de eventuais acordos com o Ministério Público. Segundo
um advogado confidenciou à revista VEJA, também se tratou de outro
assunto naquela reunião: a garantia de que Lula estava entrando
pessoalmente na, digamos, “jogada”. Com que poder? Não se sabe.
É evidente
que conversa dessa natureza é inaceitável. E, por isso, com justeza,
Barbosa cobrou a cabeça de Cardozo — a quem, diga-se, ninguém
minimamente razoável reconhece credenciais para ocupar aquele cargo.
Vamos entender agora a segunda mensagem do ex-ministro do STF. Escreveu
ele: “pesquisem sobre uma controvertida decisão do TCU de jun/jul 2012,
pouco antes do início do julgamento da Ap 470”. A Ação Penal 470 é a do
mensalão.
Muita gente não entendeu. Refresco a memória de vocês. O caso é um pouco complicado e eu o expliquei em detalhes aqui
em meu blog no dia 20 de julho de 2012. Para entender o caso, leitor,
você tem de saber o que é “bonificação por volume”. Trata-se do desconto
que veículos de comunicação concedem a agências de publicidade, que
costumam ficar com o dinheiro como parte de sua remuneração, em vez de
devolvê-lo aos anunciantes. Segundo a lei que havia no Brasil, no caso
de estatais, as agências eram obrigadas a devolver esse desconto às
empresas. Pois bem: o TCU constatou que agências de publicidade, muito
especialmente as de Marcos Valério, haviam embolsado, até 2005, ano em
que explodiu o mensalão, R$ 106,2 milhões.
Agora, é
preciso a gente se lembrar que Ana Arraes, a mãe do então lulista
Eduardo Campos, foi conduzida ao TCU em setembro de 2011. E foi ela a
relatora justamente desse caso do dinheiro sequestrado pelas agências.
Ana contrariou o parecer técnico do tribunal e disse não ver nada de
errado na retenção. E o fez com base em uma lei proposta sabem por quem?
Pelo então deputado federal petista José Eduardo Cardozo, o mesmo que
faz reuniões impróprias.
A “lei” inventada por Cardozo, a 12.232,
mudava a regra: as agências poderiam ficar com o dinheiro do desconto e
pronto! Só foi sancionada pelo então presidente Lula em 2010. Ocorre
que o texto tornava legal a retenção daquele dinheiro também para
contratos já encerrados. Entenderam? Cardozo assinou um projeto,
sancionado de bom grado por Dom Lulone, que, na prática, tornava legal a
ilegalidade praticada por Valério. Uma lei não pode retroagir para
punir ninguém, mas, para beneficiar, pode. Ao tentar legalizar parte da
dinheirama do mensalão, é evidente que o deputado Cardozo procurava
influenciar a decisão dos ministros do Supremo no julgamento do
mensalão.
Felizmente,
a operação deu errado, e a cúpula do PT foi parar atrás das grades,
ainda que já tenha saído de lá. Mas a operação vergonhosa deixou sua
marca. Em outro post (abaixo), trato da face cordial da truculência.
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