Quando o PGR não incluiu Dilma na lista dos investigados, em março de 2015, assim nos posicionamos em artigo até então com ineditismo, com perplexidade e nestes termos:
Entendemos ser sim cabível investigar a presidente Dilma Rousseff, quando o impedimento, que guarda o parágrafo 4º do art. 86, atine a responsabilização, leia-se processo [ação penal], quando consabido que, investigação pode revelar-se procedimento que apenas irá instruir futuro processo.
Lembramos que, existem provas que devem restar colhidas tão logo se tenha notícias delas, sob pena de futuras colheitas restarem ineficazes, ou por haverem desaparecido ou mesmo por se tornado excessivamente rarefeitas com o passar do tempo, perdendo suas marcas originais, quando a falta de uma prova não mais possível de ser realizada [exemplo: por morte de uma testemunha ou o achacamento desta] pode arrefecer todo o conjunto probatório, que passa a não ser mais suficientemente robusto e capaz para condenar.
É nestes termos que sustentamos que Dilma deveria sim estar incluída na lista de Rodrigo Janot, com a devida máxima vênia às opiniões divergentes. A Carta de 1988, na forma da interpretação que emprestamos ao artigo em comento, confere uma imunidade temporária a presidente para o processo, não para investigação.
Esta é a melhor interpretação que temos para o art. 86, parágrafo 4º do Diploma Maior.
Concluímos assim que, nos termos da Constituição, não há qualquer impedimento constitucional para a investigação da presidente, que o artigo infra-colacionado, núcleo central do presente, não se revelaria o fundamento necessário para pautar a ausência de vontade política de investigar Dilma Rousseff.
Segue artigo da Constituição que alimentou o presente artigo:
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.
§ 4º - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções (nosso grifo).
Assentamos por último no citado artigo:
Como constitucionalista, como professor, como um arguto estudioso dos preceitos da Carta, sinto-me constrangido quando a sua normatividade encontra barreiras em passageiras ideologias políticas de Governo. Sou tomado pelo encabulamento quando leciono no sentido do melhor direito constitucionalizado e este resta temerariamente tergiversado, em outros momentos mesmo vilipendiado pelas razões políticas de momento. Preocupado quando nossa cognição, com a chancela dos fatos, coloca-nos em xeque, por exemplo, a independência de um Ministério Público, que mais maleável que o recomendável sucumbi diante de apelos que não nos serviria jamais como fundamento de direito.
Posteriormente em novo artigo assim discorremos:
O PPS honrou-nos ao encampar nossos fundamentos quando entrou com pedido formulado na PET 5569, que pedia a reconsideração da decisão pelos motivos por nós articulados.
O pedido foi analisado pelo ministro Teori Zavascki, na decisão ele escreveu que o fato relacionado à petista já é investigado na primeira instância da Justiça Federal, numa investigação sobre o ex-ministro Antonio Palocci. Nestes termos:
“Não há como acolher a pretensão de ser instaurado procedimento investigatório contra a presidente da república neste momento. Cumpre realçar, por importante, que, de qualquer modo, o fato denunciado na colaboração premiada, sobre um suposto pagamento ilegítimo à campanha presidencial, já está sendo investigado em procedimento próprio”, escreveu.
Data vênia, não confraternizamos com o entendimento do nobre ministro. Em primeira instância quem está sendo investigado é Antônio Palocci, não a Presidente (que possui foro por prerrogativa de função). Não é fundamento apreciável a alegação de que como está investigando A, B, por conexão, também estaria por, em tese, haver participado do mesmo fato investigado. Se a investigação contra Dilma não foi autorizada, o STF não delegou expressamente esta missão à 1ª instância da Justiça Federal, Dilma definitivamente não é sujeito passivo de qualquer investigação.
Assim que, o nobre ministro praticou um contorcionismo jurídico não muito inspirado, com todo respeito que merece o insigne ministro, com o objetivo de rejeitar o recurso interposto pela oposição. As razões de direito mais uma vez subjugaram-se às razões da política em um fenômeno que se tornará cada vez mais frequente, o da “politização do direito”.
Voltando ao presente momento, perguntamos: Por que Dilma, presidente da república (maior hierarquia do Executivo Federal) não pôde ser investigada e Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados (maior hierarquia de uma das Casas do Legislativo Federal) pode ser investigado, quando não há hierarquia entre as funções de Poder?
Estaremos diante de institucionalizada blindagem político-partidária apenas para Dilma Rousseff?
O que nos deixa incrédulos é o uso de dois pesos e duas medidas, a ausência de isonomia na análise de questões semelhantes. Dilma portanto, não se pôde investigar, quando já sustentamos e neste instante reafirmamos não existirem quaisquer impedimentos para que a investigação tenha curso, o impedimento reside unicamente na impossibilidade de apresentação de ação penal em face da presidente; já com Eduardo Cunha acertadamente se permitiu a investigação... Reafirmamos que, não estamos aqui sustentando a não investigação do presidente da Câmara Eduardo Cunha como medida de isonomia, ao contrário, deve ser sim amplamente investigado, respeitada sua constitucional prerrogativa de foro, sob a presidência do STF. O que nos constrange refere-se unicamente a divindade atribuída à Dilma Rousseff.
Lembremos que, uma investigação sem blindagens poderia dar azo para um pedido de “impeachment” da presidente caso as suspeitas que pairam sob a nobre mandatária restassem confirmadas. Impedir a sua investigação é impedir que o Estado Democrático de Direito atinja com efetividade algumas de suas finalidades. À contrário senso, não podemos admitir, elocubrar, que uma de suas finalidades seja a de proteção dos crimes praticados pela mandatária que preside o Estado, e o pior, que o Supremo Tribunal Federal referende, chancele esta vertente de desvio absolutamente antidemocrático.
Nossa Constituição, que nesta passagem se aproxima de uma Carta outorgada, à nosso sentir, já desproporcionalmente se equivoca ao ponderar os interesses tuteláveis, blindando o Chefe do Executivo Federal como se a “reencarnação do filho de Deus na Terra” representasse, quando não poderá ser processado pelos crimes cometidos neste período. O STF inobstante, estendeu referida proteção a partir de uma decisão nitidamente político-partidária de blindagem, indevidamente, data máxima vênia, para além do comando constitucional, vedando que o Chefe do Executivo Federal reste não apenas processado, mas, inclusive, investigado.
Lembramos que, não há hierarquia entre as funções de poder (Executivo, Legislativo e Judiciário), que a Constituição já deu mais prerrogativas do que deveria ao Chefe do Executivo, assim que lamentável o posicionamento do STF ao melancolicamente ampliar essas prerrogativas que já não se conformavam com um modelo saudável de Estado Democrático de Direito, que reverberam menos prerrogativas e mais odiosos privilégios.
Quando percebemos que um cidadão sem prerrogativas constitucionais, como o “nobre” ex-presidente Lula, recebe uma blindagem “divina” que o permite comportar-se como se de uma anarquia fosse membro, imaginemos “os que” a Constituição já blinda em sua normatividade; até onde pode ser estendida esta blindagem para além da Constituição? O Supremo tem nos dado uma boa amostragem de que tende ao infinito...
Assim finalizamos afirmando que não há qualquer impedimento constitucional, mas tão apenas impedimento politico-partidário. A partir deste impedimento político-partidário o STF manobrou e criou impedimento jurídico com a decisão do ministro Teori.
São nestes termos, onde as razões político-partidárias prevalecem para os iluminados pelo sistema sobre a Constituição e o melhor direito, que para os inimigos, a letra fria da lei; na falta dela, manobra-se! Já para os companheiros, o escaldante calor da impunidade...
Fica nossa indignação e a certeza de que muita coisa precisa mudar!
Nota: O ministro Teori, com base em nova interpelação do PPS diante de sua decisão despida de lógica jurídico-argumentativa, ao menos em tese, procura reposicionar-se. Nestes termos:
“Não se nega que há entendimento desta Suprema Corte no sentido de que a cláusula de exclusão de responsabilidade prevista no parágrafo 4º do artigo 86 da Constituição (‘O presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções’) não inviabiliza, se for o caso, a instauração de procedimento meramente investigatório, destinado a formar ou a preservar a base probatória para uma eventual e futura demanda contra o chefe do Poder Executivo.” Ele citou o precedente relatado por Celso de Mello, um dos que o PPS havia mencionado em seu recurso.
Em tese viu-se obrigado a aderir à única tese jurídica possível. Porém, politicamente, Dilma ainda está blindada. Nenhum legitimado para o procedimento de investigação está autorizado a investigar Dilma Rousseff, fato.
Nos honra que nosso posicionamento haja enfim sido encampado pelo Supremo, ainda que "para inglês ver". Não há qualquer investigação direta em curso, o que há é o seu nome citado em delações premiadas e investigações indiretas, quando se investiga outrem e se depara com a presidente...
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