Leandro Loyola - Epoca
Dilma sempre se mostrou inapetente para a gestão política e para lidar com o Congresso. Angariou a antipatia da maioria dos parlamentares. O mesmo tipo de hostilidade é mostrado pela maior parte do Congresso, que cultivou ambições hegemonistas de eleger as maiores bancadas na Câmara e no Senado, antes da realização das eleições do ano passado.
>> Reportagem publicada na edição 895 de ÉPOCA
Como é comum em sua rotina, o vice-presidente Michel Temer recebeu o
presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB, em sua residência oficial,
o Palácio do Jaburu, na quinta-feira da semana passada. Entre vários
assuntos, Temer fez um pedido especial.
Preocupada com a volta da Câmara
aos trabalhos, nesta semana, com um enfurecido Cunha à frente, a
presidente Dilma Rousseff marcara um jantar com líderes partidários de
sua suposta base de apoio para as 19h30 desta segunda-feira, 3 de
agosto, no Palácio da Alvorada. É uma tentativa de Dilma de buscar apoio
em um momento difícil.
Ao saber disso, Cunha, craque na arte de
espezinhar o governo, marcara para a mesma segunda-feira à noite um
jantar com seus aliados, em sua residência oficial. Temer pediu a
Eduardo Cunha que evitasse esse pequeno enfrentamento. Conseguiu que
Cunha adiasse seu convescote para as 22 horas, para que os políticos não
passassem pelo constrangimento de ter de escolher entre um e outro.
Assim, eles poderão jantar com Dilma e comer a sobremesa com Cunha.
Outra hipótese é Cunha realizar um almoço no dia seguinte. Ser
articulador político de um governo fraco como o de Dilma implica para
Temer ter de se preocupar com minúcias do gênero.
Tal cuidado com coisas tão pequenas não deveria ser tarefa da segunda maior autoridade da República e chefe da articulação política do governo. Mas tornou-se necessário nestes tempos em que até os políticos mais experientes se impressionam com a aspereza inédita nas relações. Nesta semana, o frágil governo Dilma embarca em – mais um – período delicado.
Tal cuidado com coisas tão pequenas não deveria ser tarefa da segunda maior autoridade da República e chefe da articulação política do governo. Mas tornou-se necessário nestes tempos em que até os políticos mais experientes se impressionam com a aspereza inédita nas relações. Nesta semana, o frágil governo Dilma embarca em – mais um – período delicado.
Todos os cuidados são necessários para enfrentar a volta ao trabalho do
Congresso Nacional, com Renan Calheiros, um presidente do Senado
silencioso, mas oposicionista, e Eduardo Cunha, um presidente da Câmara
declaradamente pintado para a guerra, desde que foi acusado de receber
uma propina de US$ 5 milhões.
O governo está à mercê de um Congresso
cada vez mais hostil a uma Dilma fraca, com um conjunto de projetos que,
se manejado com ira política e sem responsabilidade, pode jogar o
Brasil em um precipício. “Ninguém parece empenhado em fazer uma agenda
positiva para o Brasil”, diz o líder do PMDB no Senado, Eunício
Oliveira. “Não é questão de apoio à presidente, é questão de manter o
país funcionando. Não se pode colocar o país em risco.”
O perigo é latente. Na semana passada, a agência de classificação de
risco Standard & Poor’s fez o que todos os investidores já
esperavam, ao reduzir a perspectiva do Brasil. Desde 2008 o Brasil
integra o seleto clube dos países com grau de investimento que merecem
maior confiança por sua solidez econômica.
Agora está perigosamente
perto de deixar esse clube, o que significa perder investimentos de
fundos internacionais que só podem alocar seu dinheiro em países com tal
selo. Para o Brasil, pode implicar a saída de cerca de US$ 200 bilhões
em questão de semanas e o recebimento de menos investimentos
estrangeiros a partir daí.
Em seu relatório, a Standard & Poor’s
citou especificamente a incapacidade de o governo Dilma obter apoio no
Congresso para as medidas econômicas saneadoras tocadas, com
dificuldade, pela equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O
Congresso pode aniquilar com facilidade a minúscula economia de gastos
já obtida. Basta derrubar o veto da presidente ao reajuste de 56% a 78%
para os servidores do Judiciário, capaz de agregar uma despesa extra de
R$ 10 bilhões em quatro anos.
Ameaças desse gênero estão no baralho de maldades de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, companheiros de partido e nas acusações de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras.
Ameaças desse gênero estão no baralho de maldades de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, companheiros de partido e nas acusações de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras.
Há meses, desde que se tornaram
investigados pela Lava Jato, ambos elegeram o governo Dilma seu saco de
pancadas. Os dois atraíram o apoio da oposição, que foi capaz de
emplacar vitórias contra o governo, em uma magnitude que não era vista
desde que o PT chegou ao Palácio do Planalto em 2003 com a eleição do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A oposição aposta em obter ganhos
políticos com o desgaste contínuo do governo. Sondagens de popularidade
mostram Dilma e o PT no subsolo, o que abre caminho para candidatos
opositores nas eleições por vir – a primeira no calendário é a eleição
municipal de 2016. Politicamente, bater no governo mais impopular desde
Fernando Collor é um esporte simples, uma boa defesa e um agregador de
votos eficiente.
Consciente da própria decadência, o governo foi a campo na semana passada para se prevenir dos percalços que poderão surgir no Congresso. Dilma se reuniu com os 27 governadores no Palácio da Alvorada.
Consciente da própria decadência, o governo foi a campo na semana passada para se prevenir dos percalços que poderão surgir no Congresso. Dilma se reuniu com os 27 governadores no Palácio da Alvorada.
Colocou-os ao redor de
uma mesa e leu um discurso de 20.550 caracteres, transmitido ao vivo
pela televisão. Terminada a enfadonha leitura, ministros fizeram
explanações sobre as consequências funestas de projetos que estão no
Congresso – não só para as finanças do governo federal, como para os
estaduais.
Dilma repetiu o gesto que fez em 2013, quando estava enfraquecida pelas manifestações nas ruas: em vez de pedir ajuda, usou os governadores como claque de apoio. Daquela vez, não funcionou.
Dilma repetiu o gesto que fez em 2013, quando estava enfraquecida pelas manifestações nas ruas: em vez de pedir ajuda, usou os governadores como claque de apoio. Daquela vez, não funcionou.
Agora, ainda procurou
amedrontá-los com as consequências de algumas medidas. Entretanto, a
crise é tão grave que os governadores manifestaram boa vontade. “Há uma
preocupação genuína de todos de tentar evitar o pior”, diz o tucano
Simão Jatene, governador do Pará. “Apesar das posições partidárias, há
uma agenda comum que afeta a todos. Não podemos sair da crise pior que
entramos.”
Os governadores prometeram tentar influenciar deputados e
senadores. De concreto, obtiveram de Dilma a promessa de liberação de
financiamentos do Banco do Brasil, entre outras medidas que podem
aliviar suas finanças. A queda de arrecadação que empareda o governo
federal também bate forte nos Estados.
Antes da reunião, o governo fez o que manda o manual político em tempos
difíceis. O ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, que auxilia Temer
na articulação, anunciou a distribuição de 200 cargos no terceiro
escalão para acalmar aliados. Em outra iniciativa para aplacar
animosidades contra o Planalto, anunciou também que o governo liberará
cerca de R$ 4,9 bilhões para pagar emendas ao Orçamento, as indicações
de gastos públicos que os parlamentares têm direito a fazer.
O vice-presidente Michel Temer tratou pessoalmente de aplainar o terreno em outras áreas. Combinou com Eduardo Cunha de chegar a um acordo sobre o futuro presidente da incômoda – para o governo – CPI que vai investigar contratos do BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, responsável por financiar no exterior empreiteiras enroladas na Operação Lava Jato e diversas empresas doadoras de campanhas do PT (leia reportagem na página 52).
O vice-presidente Michel Temer tratou pessoalmente de aplainar o terreno em outras áreas. Combinou com Eduardo Cunha de chegar a um acordo sobre o futuro presidente da incômoda – para o governo – CPI que vai investigar contratos do BNDES, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, responsável por financiar no exterior empreiteiras enroladas na Operação Lava Jato e diversas empresas doadoras de campanhas do PT (leia reportagem na página 52).
Um dos nomes em cogitação é o do
deputado Edio Lopes (PMDB-RR), um
aliado de Cunha, mas que mantém bom diálogo com o governo.
Temer acertou
ainda que, antes de partir para o jantar com Dilma, nesta
segunda-feira, os líderes dos partidos da base aliada farão uma parada
estratégica no Palácio do Jaburu, às 18 horas.
Dilma sempre se mostrou inapetente para a gestão política e para lidar com o Congresso. Angariou a antipatia da maioria dos parlamentares. O mesmo tipo de hostilidade é mostrado pela maior parte do Congresso, que cultivou ambições hegemonistas de eleger as maiores bancadas na Câmara e no Senado, antes da realização das eleições do ano passado.
Agora, os
petistas estão recebendo o troco – não só dos oposicionistas, mas de
seus supostos aliados no governo, que não perdem a oportunidade para
criar mais dificuldades apenas com o objetivo de fazê-los sangrar.
Contudo, priorizar a disputa política em detrimento dos interesses
nacionais é um perigoso flerte com a tragédia.
Agora não se trata mais
de uma questão de transferir a responsabilidade por decisões impopulares
para a presidente Dilma. Derrubar vetos da presidente, como ao fim do
fator previdenciário ou do reajuste para os servidores públicos,
implicará mais gastos, no momento em que o país não pode arcar mais com o
crescimento das despesas públicas.
Poderá implicar também aumentos dos
impostos ou da inflação, com aumentos dos aluguéis e até do preço da
comida na feira. Os parlamentares foram eleitos para defender os
interesses dos cidadãos. Agora, trata-se de uma questão de agir com
responsabilidade e honrar o voto que receberam.
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