Tragédia evitável
Congonhas reage a alto risco de rompimento da barragem Casa de Pedra
Moradores cobram da CSN,
privatizada em 1993, paralisação de atividades de uma das maiores
barragens em área urbana do mundo. Se romper, lama cobre bairro mais
próximo em oito segundos
por Cláudia Motta, da RBA
publicado
31/01/2019 17h32,
última modificação
31/01/2019 19h55
Dam Projetos de Engenharia/Via SEESP
Barragem Casa de Pedra, da CSN: ameaça a Congonhas do Campo
São Paulo – Os moradores de Congonhas do Campo, uma das cidades mineiras consideradas patrimônio histórico e cultural da humanidade, convivem com o medo há anos. Mas desde o crime da Vale,
em Brumadinho, o medo se transformou em pavor. Três bairros, onde vivem
mais de 5 mil pessoas, estão abaixo do nível da barragem de rejeitos de
minérios Casa de Pedra, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), uma
das maiores do mundo em área urbana, com 50 milhões de metros cúbicos.
A barragem existe desde a década de 1970, mas com a
privatização realizada pelo governo de Fernando Collor, em 1993, foi
sendo expandida até chegar, na década de 2010, a esse gigantismo. Para
efeito de comparação, a barragem do complexo Mina Córrego do Feijão,
rompida em 25 de janeiro, em Brumadinho, tinha capacidade de
aproximadamente 12 milhões de metros cúbicos de lama de rejeitos. A de
Fundão, em Mariana, despejou para o meio ambiente em 2015 mais de 60
milhões de metros cúbicos.
“Em todos os lugares onde há uma barragem, todas as pessoas
que estão embaixo de uma barragem de rejeito hoje, ninguém dorme
tranquilo”, afirma a integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Fernanda de Oliveira Portes.
Classificada como Classe 6 pela Agência Nacional de Águas
(ANA), a mais alta em categoria de risco, a Casa de Pedra está acima da
cidade de Congonhas. Avaliações técnicas dão conta de que, em caso de
rompimento, a lama tóxica cobriria o Bairro Residencial, que está a 200
metros da barragem, em apenas oito segundos. Os rejeitos também se
deslocariam por toda a cidade, com 54 mil habitantes, e atingiria
comunidades próximas.
“Brumadinho foram 30 segundos, Mariana quatro minutos. Ou
seja, não há plano de emergência que consiga dar segurança para as
famílias de que se aquilo romper, não vão morrer, não vai acontecer um
desastre ainda maior de perda humana, além dos impactos sociais e
ambientais”, alerta Fernanda, afirmando que a retirada das famílias
seria o ideal, com pagamento de aluguel e indenização para todos.
Essa e outras exigências dos moradores foram entregues
nesta quarta-feira (30) à direção da CSN. A pauta de reivindicações foi
definida em assembleia realizada com o MAB no dia 29 e o prazo para
retorno da empresa é de três dias.
“Queremos que tenha fiscalização dos órgãos ambientais que
cobre o processo de licenciamento para operar; paralisação das
atividades onde estão essas barragens de risco e fazer o secamento da
barragem. E o monitoramento, até que acabem todos os riscos para as
famílias”, explica Fernanda.
De acordo com o MAB, no sétimo dia desde o rompimento da
barragem foram confirmados 110 mortos, dos quais 71 foram identificados.
Ainda há 238 pessoas sem contato ou desaparecidas entre trabalhadores e
moradores de Brumadinho. São 108 os desabrigados. A área atingida pela
lama, que já percorreu 98 quilômetros, equivale a 300 campos de
futebol.
Brumadinho
A coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens em
Minas Gerais lembra que a barragem da Vale no Córrego do Feijão, em
Brumadinho, não estava ativa. Mas em dezembro de 2018 a empresa obteve uma nova licença para recuperar o minério de ferro que estava nos rejeitos.
“Não era minerar, mas recuperar e isso de uma certa forma
mexe com aquele rejeito”, explica. “Eles alegam que isso seria feito
somente a partir de fevereiro, porém a comunidade afirma que já havia
caminhões passando lá. Muitos avaliam que já estariam começando a mexer e
isso pode ter contribuído para o rompimento da barragem.”
A lama tóxica da Vale já chegou ao rio Paraopebas,
responsável pelo abastecimento de toda da região metropolitana de Belo
Horizonte. O risco iminente da Casa de Pedra acende mais um sinal de
alerta, diz Fernanda. “Temos duas bacias com risco de contaminação:
Paraopebas já foi atingido e isso pode chegar ao São Francisco,
comprometendo o abastecimento de água em oito estados. A Vale ainda não
tratou disso. É um crime ambiental, um massacre, um genocídio humano.”
Na manhã desta quinta-feira (31), integrantes do MAB
reuniram-se com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em
Brasília, para reivindicar direitos dos atingidos. O objetivo do
movimento é que a impunidade no crime da Samarco, em Mariana, não se
repita no caso de Brumadinho.
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