quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Na verdade, estamos colocando grande parte dos investimentos em mobilidade no transporte individual, indo para um sistema absolutamente caótico em um curto espaço de tempo.

Uma cidade violentada

set 21, 2013 by     48 Comentários    Postado em: Atualidades
Via Mangue real. Difícil ser mais horrível.

As ações construtivas são responsáveis pelo futuro que se quer em uma cidade. Elas mostram como será a cidade em algumas décadas. Erros do presente praticamente se perpetuam, já que ao contrário de um mercado tradicional, o mercado de construção civil e de ocupação do solo dificilmente consegue reverter o que foi construído.

Exemplos disso não faltam, como por exemplo, a opção de Londres por vias muito estreitas e algumas avenidas desumanas, a ocupação de áreas na Floresta da Tijuca (tanto por pobres como por ricos) e a opção, 100 anos atrás, pelo transporte rodoviário no Brasil, em detrimento do ferroviário.

Já em Recife temos o exemplo tenebroso da Avenida Dantas Barreto, que destruiu parte do centro histórico do Recife, levado o Centro da Cidade a um muro da Rede Ferroviária. Isso sem falar nos prédios isolados, com muros de 7 metros de altura, acabando com a vida na rua.

Por isso que é preciso um Poder Público atuante, já que uma cidade precisa saber onde quer chegar. (...)

Mas esta grande introdução é apenas para reflexão sobre a Via Mangue.

Enquanto todos se mobilizavam para evitar os viadutos da Agamenon Magalhães, já que era possível enxergar o mal que iria fazer pela cidade, uma agressão muito maior acontecia por trás dos grandes corredores, sem que as pessoas percebessem o que acontecia.

Foi vendida para a cidade uma bela imagem, como a vista abaixo, mas o que acontece na prática é a violência contra o meio-ambiente, da imagem acima.

Via Mangue prometida em imagens

Mais do que uma grande agressão ao que resta de verde em nossa cidade, a Via Mangue é um equívoco econômico sem precedentes.

Com R$ 600 milhões de custo estimado, ainda sem os aditivos finais, seria possível levar um VLT de Boa Viagem até o Centro da Cidade, pela Domingos Ferreira. Como tanto dinheiro não brota em árvores, nem no mangue, esta é praticamente uma opção definitiva.

Os VLTs modernos, como o da imagem, percorrem a mesma via dos automóveis, sem a necessidade de obras imensas. Nem os semáforos são impeditivos, já que o veículo vai em via segregada, e com um sensor que permite abrir o semáforo a seu favor.

Veja que não estou falando de um ônibus barulhento, quente e disputando espaço com os carros, mas de um veículo extremamente moderno e confortável, andando em via segregada. O custo estimado de um VLT é de 20 milhões de dólares por quilômetro. Isso se bancado inteiramente pelo setor público. Se fosse em uma PPP, poderia cair a 50% do valor.


Mas o que estamos fazendo?

Na verdade, estamos colocando grande parte dos investimentos em mobilidade no transporte individual, indo para um sistema absolutamente caótico em um curto espaço de tempo. 

É como se acreditássemos que tudo pudesse ser resolvido de maneira determinística, como se a quantidade de ruas fosse apenas uma variável dependente da quantidade de carros, esquecendo que não há mais lugar para as vias a não ser agredindo o já cambaleante meio-ambiente local. Essa visão de mundo, conhecida como o “Demônio de Laplace”, está nos levando rapidamente ao esgotamento de soluções.

Como carro é como gás, ocupando todo o lugar no espaço, caminhamos a passos largos para a deterioração de nossa qualidade de vida.

E nesta pisada vamos aterrando mangue para construir shopping centers em detrimento do comércio de rua, subindo vias por cima de rios, como o absurdo da imagem em destaque, e deixando o setor imobiliário construir com uma cabeça de planilha, sem lembrar que as ruas são o bem mais valioso de uma cidade.

Isso sem falar na feiura do que estão fazendo.

Só podemos lamentar pela opção do Recife.

Isso ainda vai custar muito caro.



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