quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Contratar pessoas inteligentes pode ser mau negócio, diz especialista



Pessoas mais inteligentes nem sempre são as mais respeitadas no trabalho
Quando se contrata ou se promove alguém, ou quando se está formando uma equipe nova, o ideal é sempre contar com as pessoas mais inteligentes disponíveis, certo? Não necessariamente, diz o especialista Sydney Finkelstein no artigo à BBC abaixo:

Inteligência é o tipo de característica em que existe "um nível mínimo desejável". Mas passado esse certo nível, inteligência demais pode ser um problema.

Os administradores da ex-gigante americana Enron, por exemplo, sempre foram conhecidos como "as pessoas mais inteligentes da sala". Mas isso não deu bons resultados. A ex-empresa de energia formou sua equipe com os maiores talentos disponíveis no mercado, mas deixou que ela ficasse a cargo de divisões com altos lucros quase sem supervisão.

Os administradores eram inteligentes, mas também eram arrogantes e inseguros. Eles acabaram assumindo riscos desnecessários e perdendo bilhões de dólares. A empresa foi extinta em 2001.
Certamente há empregos em que muita inteligência é um diferencial. Pesquisadores, analista e programadores são profissionais que obtêm resultados incríveis trabalhando de forma solitária. É possível deixá-las sozinhas em um ambiente para que desenvolvam todo seu potencial. Mesmo que não tenham inteligência emocional ou habilidades sociais, qualquer dano que elas possam causar é limitado, dada a natureza independente do seu trabalho.
Mas com administradores, isso é diferente.

Solução 'superior'

O problema com pessoas inteligentes é que elas geralmente acham que sabem mais que todos os demais. E talvez isso seja verdade. Mas isso não os ajuda quando precisam convencer outras pessoas a comprarem o que elas estão vendendo.

Por exemplo, uma vez eu fui dar treinamento a uma executiva que sempre parecia estar um passo à frente dos demais em sua equipe. Pelo menos era assim que ela pensava. Uma das dificuldades que ela tinha era de entender que os demais administradores não compartilhavam da sua visão de mundo. Isso significa que ela precisava passar muito tempo investindo em convencer os demais a aderir a seus projetos.

Quando se trabalha em grupo e não existe uma autoridade direta sobre os demais, a única forma de influenciar no pensamento dos demais é vendendo uma ideia. Impor uma solução "superior" não funciona.

A ironia é que muitas vezes a pessoa mais talentosa é justamente a pior administradora. Isso é notável no mundo dos esportes, em que as maiores estrelas, quando se aposentam, geralmente têm dificuldades de virar bons técnicos, pois teriam que supervisionar "mortais inferiores", dotados de talento inferior.

Wayne Gretzky foi uma lenda canadense do hóquei no gelo e se aposentou com o maior número de recordes da história do esporte. Mas se tornou célebre como um técnico ineficiente. O mesmo aconteceu com Michael Jordan, tido como o melhor jogador de basquete da história, mas que nunca obteve resultados expressivos como treinador, presidente ou dono de clubes de basquete.

O mesmo problema fica evidente quando pessoas muito inteligentes levam seus produtos ao mercado. Eu lembro de conversar com diretores da Creative Technology, empresa baseada em Cingapura, pouco depois que a Apple lançou o iPod. A Creative tinha um aparelho de mp3 com tecnologia superior ao iPod, mas mesmo assim os clientes preferiam o produto da Apple, para espanto geral do pessoal da Creative.

Eles não conseguiam entender como os clientes podiam ser tão irracionais! Mas a melhor tecnologia nem sempre vence, assim como nem sempre as pessoas mais inteligentes são as mais bem-sucedidas.

Menos é mais

Não é só inteligência em demasia que pode ser prejudicial. Outras qualidades tidas como positivas, como velocidade, também podem ser nocivas. É recomendável reduzir o tempo que cada técnico de call center passa ajudando um cliente, por exemplo? Se o conselho dado no telefone não for bom, de que adianta ele ter sido dado de forma rápida?

A empresa americana Zappos, que vende sapatos pela internet, remunera empregados que passam mais tempo com os clientes. Quando funcionários estão motivados a atender o maior número de clientes possível, pensamentos do tipo "o cliente é sempre prioridade" passam a ser vazios e cínicos.
No longo prazo, essa cultura traz danos colaterais às empresas. As pessoas que realmente se importam com a qualidade do seu trabalho vão procurar empresas que praticam esses valores. As demais ficam com empregados desmotivados, mas que são eficientes em cumprir metas estabelecidas de forma errada.

Usar as pessoas mais inteligentes e talentosos para liderar equipes pode soar como uma grande ideia, mas em muitos casos a teoria é muito melhor que a prática.

* Sydney Finkelstein é professor de estratégia e liderança e Reitor de Educação Executiva da Tuck School of Business. Ele é autor de 16 livros, entre eles 'Why Smart Executives Fail'. Siga o no Twitter: @sydfinkelstein.

Leia o artigo original em inglês no site BBC Capital.

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