Mara Bergamaschi É jornalista, escritora e mãe
Li na segunda-feira, e não foi em nenhum dos chamados blogs sujos, mas em páginas da prestigiada imprensa paulista, que Marina (e curiosamente também Aécio) teria agora, quando Dilma recupera o favoritismo, “aquele ar de falsa virgem já inúmeras vezes deflorada.”
Isso mesmo: em pleno 2014, além de suportar uma campanha do atraso, em que as duas candidatas à Presidência mostram-se na prática incapazes de sustentar uma pauta de avanços feministas, nós, eleitoras, ainda temos de ver publicado algo violento e ofensivo como se fosse muito natural.
“Opinião” compartilhada mil vezes, sem sinal de indignação. E na mesma segunda-feira em que as redes sociais foram tomadas pelos protestos contra a chocante demonstração de homofobia do nanico Fidelix.
A carga de preconceito contra as mulheres contida nesta frase é tão grande que nem sei por onde começar. Talvez o velho Houaiss ajude: deflorar é uma palavra datada de 1561, certamente herança da obscura Idade Média, quando prevalecia a exigência absoluta da castidade feminina. E aí daquelas que ousassem falar ou agir: teriam, como boas bruxas, a fogueira como destino.
Cabe ainda perguntar: “a falsa virgem já inúmeras vezes deflorada” seria, por acaso, uma definição para devassa ou prostituta? Ou uma referência à prática do (merecido?) estupro, já que o “defloramento” nem sempre é consensual?
Pois o que esta frase infelizmente consagra, em pleno século 21, é a ideia de veto à igualdade sexual, ao pleno direito das mulheres de serem, como os homens, donas de seus corpos. Sexismo assacado gratuitamente contra alguém que se destaca na disputa do mais alto cargo do país.
Um “chega-lá-pra-lá”, cheio de desprezo, na candidata frágil – em queda, Marina também já foi chamada de “pobre coitada” e “saco vazio”- que ousou invadir o território político, de vasto domínio masculino.
Por conta própria, sem a sombra de Lula, Dilma Rousseff, que em 2013 tuitou contra “a sociedade é sexista e preconceituosa”, deveria ser a primeira a lamentar mais este tipo de “piada que mata” na campanha de 2014.
Brutalidade atinge Marina (Imagem: Arquivo Google)
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