domingo, 23 de novembro de 2014

Estava demorando: dois esqueletos encontrados no armário de Ricardo Semler

semler



O “empresário tucano” Ricardo Semler se tornou um ícone dos petistas nos últimos dias após ter escrito o texto Nunca se roubou tão pouco, publicado na Folha. Um dia depois este blog publicou a refutação Nunca se mentiu tanto para esconder a corrupção petista, onde todas as alegações dele foram reduzidas a pó.


Por que foi tão fácil esmagar o texto de Semler? Por que é como eu digo: guias de falácias são para serem estudados, não apenas folheados.


Uma das dicas para o ceticismo político é começar pelo domínio dos guias de falácias disponíveis por aí. Na Internet existem vários, como o guia do Stephen Downes. Para além da Internet, Critical Thinking, de Walter Carnielli, é uma ótima aquisição, tanto como How to win every argument, de Madsen Pirie.
Lembre-se, é claro, de que vencer a argumentação não é suficiente na guerra política, mas te ajuda a achar os embustes com maior facilidade.


Seja lá como for, dava para notar algo de muito suspeito na atitude de Semler.



O texto 500 anos de corrupção, de Demétrio Magnoli, inclui um trecho muitíssimo interessante:
“Dilma agora lidera a todos nós”, anuncia o empresário dos dedos sujos de lama –que, casualmente, tem como maior cliente a estatal Correios. A narrativa do Ano Zero descortina possibilidades ilimitadas. Dilma “não sabia de nada”? Esqueça. Nos 12 anos em que dirigiu a Petrobras diretamente (como presidente do Conselho de Administração) ou indiretamente (como ministra e presidente da República), os partidos da “base aliada” privatizaram a estatal, desviando dezenas de bilhões de reais. Não é que a Líder dos Imundos “não sabia”. Sabia –mas, sábia, deixou a operação se alastrar para, no Ano Zero, pegar todos os bandidos juntos. Ah, bom!


Para, para, para… como diria João Kleber.

Relembremos o que Semler disse:
“Há dezenas de outras estatais com esqueletos parecidos no armário. É raro ganhar uma concessão ou construir uma estrada sem os tentáculos sórdidos das empresas bandidas.” (grifos meus)
Fui checar a informação de Magnoli e ela é completamente válida. Sim, o maior cliente de Semler são os Correios. Foi ele mesmo que falou ser raro “ganhar uma concessão ou construir uma estrada sem os tentáculos sórdidos das empresas bandidas”.


Como eu disse no texto anterior, já é o suficiente para levar o empresário a uma CPI, pois ele tem muitas alegações a serem comprovadas.


Mas a coisa fica ainda pior, pois o site Implicante trouxe uma outra informação complicando Semler ainda mais.


Para começar, o articulista Gravataí Merengue lembra um trecho do artigo da figura:
“Nossa empresa deixou de vender equipamentos para a Petrobras nos anos 70. Era impossível vender diretamente sem propina. Tentamos de novo nos anos 80, 90 e até recentemente. Em 40 anos de persistentes tentativas, nada feito. Não há no mundo dos negócios quem não saiba disso. Nem qualquer um dos 86 mil honrados funcionários que nada ganham com a bandalheira da cúpula.” (grifos do blog Implicante)


Voltando ao texto do blog Implicante, veja uma informação digna de derrubar muitos da cadeira:


Se agora – segundo o articulista – rouba-se MENOS, como era na época em que seu sócio na Semco Partners, Philippe Reischstul, foi presidente da empresa (notem que ele acusa a CÚPULA)? Como foram aqueles dois anos? Pois é… Considerando ainda a ideia defendida pelo texto (agora roubariam menos), o que afinal de contas levou Semler a associar-se a um ex-presidente da Petrobras justamente na época em que, segundo ele próprio, as coisas não eram tão “boas” quanto agora?


São perguntas que podem parecer irônicas, mas na verdade são muito sérias. E devem ser feitas pela CPI. Nada mais justo, honesto e correto que chamar o próprio Semler, que diz saber desses casos. Além dele, claro, seu sócio que presidiu a empresa por dois anos, naquele período que (novamente, segundo o articulista) as coisas eram piores.


Cabe à oposição o DEVER de convocar Ricardo Semler e seu sócio. Não é admissível passar panos quentes sobre essas declarações. São verdadeiras? Não são? Pois DEVEM ser investigadas, pois são acima de tudo muito graves. E se a oposição NÃO convocá-los nem citar os fatos narrados no artigo, acaba caindo naquele comportamento da base governista que tanto condenamos.
Alguém discorda?

Como eu não sou petista, que adora esconder os crimes de seus políticos, entendo também que é hora de Semler começar a ter que provar tudo que afirmou.


Pessoal, vocês já tem base para pressionar o PSDB para exigir que Semler (assim como seu sócio) tenham que se explicar no Congresso. E mais: investiguem o contrato da empresa dele com os Correios.
***


Em tempo, vou falar de um assunto relacionado.


Muita gente que fala de falácia não sabe efetivamente o que isso significa.
Você nota a ignorância no assunto quando alguém ouve um xingamento a uma outra parte e diz: “Isso é ad hominem”. Chega a dar pena. Isso no caso de falarmos de pessoas bem intencionadas.


A falácia ad hominem só existe caso o xingamento seja parte do ARGUMENTO e se, e somente se, é utilizada como forma de invalidar o quea outra parte disse ou fez.
Um exemplo: “O relatório de X é inválido por que ele lê Nietzsche”.


Aliás, até em alguns casos o ad hominem pode ser válido. Exemplo: “Auditores devem ser independentes. X não é independente neste projeto. Logo, X não pode executar a função de auditoria neste projeto”.


Chamamos de ad hominem circunstancial.


Exemplo do que não é um ad hominem: “[identificação válida de fraude em um argumento 1]+[identificação válida de fraude em um argumento 2]+[identificação válida de fraude em um argumento 3]+[realmente, estamos diante de um embusteiro]“.


Note que eu posso ter identificado de forma argumentativamente legítima três embustes no argumento do outro, deixado a premissa implícita (quem comete tantas fraudes é embusteiro), e depois concluir “ele é um embusteiro”.



Isso não é um ad hominem, pois não está sendo usado para refutar os argumentos. Na verdade, eu posso até suspeitar que alguém é um embusteiro, enquanto faço minhas investigações argumentativas (ou seja, o que defino ceticismo político, pelo foco em achar as fraudes que beneficiam alguém política, ao invés de qualquer tipo de erro lógico).


Pois bem. Um sujeitinho disse que meu texto anterior sobre o Ricardo Semler continha a falácia ad hominem. Das duas uma: (1) ou é um ignorante sobre falácias, (2) ou é safado. E esta não é uma conclusão falaciosa.
Haja saco viu…

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