terça-feira, 21 de julho de 2015

Escândalo do petrolão cruza vários processos em Portugal



Texto do jornal Observador, de Portugal: "Lava Jato em 5 gráficos. Operação Marquês, Monte Branco, BPN. O escândalo brasileiro cruza vários processos nacionais



Maria Catarina Nunes e o Milton Cappelletti preparam-lhe cinco gráficos para perceber a teia de ligações que a PGR vai ajudar o Brasil a investigar - mesmo depois de Passos Coelho ter garantido ontem que o ex-Presidente brasileiro nada lhe pediu na audiência que tiveram há uns anos ("nunca me veio meter nenhuma cunha").


O Negócios, por sua vez, fez um trabalho complementar, explicando o que têm em Portugal as construtoras da Lava Jato, que também vale uns minutos de leitura.

Hoje, através do Público, ficamos a saber que a Justiça portuguesa quer levar mais longe essa investigação, procurando dados sobre o envolvimento de ex-governantes, acionistas e gestores da PT no negócio da venda da Vivo e compra da Oi. O negócio de 2010 foi polémico, envolveu 7,5 mil milhões de euros e acabou mal, como sabemos agora." 


Abaixo, um trecho da longa matéria publicada hoje:

Os negócios entre o Brasil e Portugal cresceram visivelmente nos últimos anos. Um dos responsáveis por esse crescimento foi inegavelmente Lula da Silva, o ex-presidente brasileiro, que valorizou as ligações a Portugal. Quando se descobrem casos suspeitos do outro lado do Atlântico é normal que alguns deles cheguem a Portugal. Mas o Lava Jato, o escândalo de corrupção que agora agita o Brasil (depois do Mensalão e do Petrolão) não se cruza apenas com um processo, mas sim com vários. Uma teia de relações entre empresas e pessoas que o Observador tentou simplificar em 5 gráficos.


No cruzamento de linhas do Brasil para Portugal (com passagens por África e Suíça), o Lava Jato entra pelo processo Operação Marquês dentro, pelo qual estão detidos José Sócrates (prisão preventiva), Armando Vara, ex-administrador da CGD, Joaquim Barroca, ex-administrador do Grupo Lena, e o empresário Carlos Santos Silva (todos em prisão domiciliária).  Toca também no caso Monte Branco, via Akoya, a empresa suíça gestora de fortunas representada em Portugal por Francisco Canas. É no âmbito deste processo que, entre muitos outros, é arguido Ricardo Salgado, que teve de pagar uma caução de três milhões de euros para aguardar julgamento em liberdade. E nem o BPN escapa, uma vez que o banco de Oliveira e Costa (que aguarda julgamento em prisão domiciliária) seria usado para a circulação de dinheiro.


Até Passos Coelho acabou por ser citado, alegadamente por ter recebido de Lula da Silva um pedido para interceder a favor da Odebrecht aquando da privatização da EGF. A construtora brasileira acabou por nem concorrer e Passos negou que Lula lhe tivesse metido qualquer “cunha” a favor de empresas brasileiras.


E ao mesmo tempo que se multiplicam as notícias e as ligações entre Lula da Silva, o processo Lava Jato, a empresa Odebrecht e os processos em investigação em Portugal, a Procuradoria-Geral da República portuguesa já confirmou ter recebido um pedido de ajuda das autoridades brasileiras e garantiu o seu apoio à investigação que acaba de incluir o próprio Lula da Silva. “Confirma-se a receção de pedido de cooperação judiciária internacional, através de carta rogatória”, diz a Procuradoria-Geral da República (PGR). Mas o caso parece ir muito além da simples suspeita de tráfico de influências do ex-presidente brasileiro como representante da construtora Odebrecht, quando deixou o cargo no Palácio do Planalto.

Comecemos pelo Brasil e pelas últimas notícias sobre o caso. São desexta-feira, primeiro, quando se soube que Lula da Silva ia mesmo ser investigado. E depois de domingo, quando se conheceram algunstelegramas diplomáticos que envolviam o ex-presidente do Brasil em várias ligações que iam além do lobby a favor da construtora brasileira Odebrecht. O ex-presidente é investigado por suspeitas de tráfico de influência em transação comercial internacional.

A Odebrecht, uma das maiores construtoras do Brasil, está no centro de uma das maiores redes de corrupção no Brasil, a Operação Lava Jato. O seu presidente, Marcelo Odebrecht, está detido desde 19 de junho, juntamente com mais 7 executivos da empresa. São suspeitos de fraude, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, crime contra a ordem económica e organização criminosa. Na mesma investigação, diga-se de passagem, foram também detidos o presidente da Andrade Gutierrez e oito outras pessoas da empresa que esteve ligada aos negócios entre a PT SGPS e a brasileira Oi.
Voltando a Lula. 


Dois telegramas analisados pela Polícia Federal brasileira vieram sustentar a suspeita do Ministério Público do Brasil e o pedido de ajuda a Portugal. E porquê? A rede de ligações de Lula da Silva, e de empresários detidos no âmbito do processo Lava Jato, a empresários e altos quadros do Estado portugueses, que por sua vez estão envolvidos nos processos investigados em Portugal, começam a surgir, umas atrás das outras.

Lula da Silva terá utilizado as suas viagens pelo mundo para ajudar a construtora brasileira Odebrecht, da qual se tornou representante após deixar de ser presidente brasileiro, em várias frentes. Mas Lula terá ido além do simples lobby. Terá usado os seus conhecimentos para interceder a favor da empresa. 


Em Cuba e em países africanos, entre 2011 e 2014, terá colaborado para a angariação de novos contratos para a empresa. Essa é uma das razões para o ex-presidente ser suspeito de tráfico de influências em transação internacional dentro do processo Lava Jato.


Mas não só. Lula da Silva terá intercedido a favor da construtora para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social (BNDES), ligado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do Brasil, financiasse obras da empresa, mas fora do país. O aeroporto de Cuba é um exemplo. 



Em troca, a Odebrecht terá pago contrapartidas a Lula da Silva.


Quando se deslocou a Portugal, as viagens do ex-presidente terão sido pagas pela Odebrecht. Seis das deslocações, pelo menos, terão sido suportadas pela empresa brasileira. Numa dessas viagens, em 2013, Lula da Silva apresentou o livro de José Sócrates, “A Confiança no Mundo”. O presidente da Odebrecht Portugal, Fábio Januário, garantiu ao Expresso, que aquela viagem financiada pela construtora foi apenas para trazer Lula às comemorações dos 25 anos da empresa.
A apresentação do livro teria sido apenas um extra, justificado com a relação pessoal entre Lula e Sócrates.



Mas terá havido mais. Num telegrama diplomático, datado de 25 de outubro de 2013, o Ministério Público brasileiro encontrou suspeitas. No documento, o embaixador brasileiro em Lisboa comenta com o ministério dos Negócios Estrangeiros do Brasil a visita de Lula da Silva a Portugal, nos dias anteriores: entre 21 e 23 de outubro. O documento deixa claro que o convite da viagem partiu da Odebrecht Portugal e revela reuniões em Lisboa com empresários brasileiros ligados à construtora. Investiga-se agora com que propósitos.



O atual primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, também vê o seu nome associado às notícias sobre o processo Lava Jato, por alegadas conversas com Lula da Silva.
De acordo com um relatório da Polícia Federal brasileira, o ex-presidente brasileiro terá contactado Passos Coelho para demonstrar o interesse da construtora Odebrecht no processo de privatização da portuguesa Empresa Geral de Fomento (EGF) e para lhe pedir que intercedesse a favor dos brasileiros.

O negócio de privatização da EGF foi anunciado no início de 2014 e fechado em novembro do mesmo ano. Recorde-se que a Suma, consórcio liderado pela Mota-Engil, foi a vencedora e comprou a EGF por 149,9 milhões de euros. Nenhuma empresa brasileira chegou a concorrer.

Mas um segundo telegrama diplomático investigado pelas autoridades brasileiras, trocado em maio de 2014, entre o embaixador brasileiro em Lisboa e o ministro brasileiro dos Negócios Estrangeiros, analisa a privatização da EGF. E nele, o embaixador Mário Vivalva destaca que as empresas brasileiras Odebrecht e Solvi, em parceria com o grupo português Visabeira, tinham interesse no negócio. A atenção teria gerado “simpatia dos formadores de opinião em Portugal”. 



É depois desta informação que “a ação direta de Lula em favor da Odebrecht” terá sido referida, avança o Globo.

Por causa destas notícias, e das alegadas conversas com Lula da Silva, Passos Coelho teve de fazer um desmentido claro esta segunda-feira: “A empresa brasileira que é referida não apresentou candidatura”. A garantia de negação foi mais longe e o primeiro-ministro decidiu mesmo utilizar vocabulário corrente “para que todos percebam de forma direitinha: o ex-presidente do Brasil nunca me veio meter nenhuma cunha”. (Continua).


Postado por Orlando Tambosi às 10:02

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