Presidente da Agefis
revela que governo vai contratar empresas para a demolição de prédios
construídos irregularmente
Novas construções irregulares surgem a
todo instante no Distrito Federal – para a comprovação, basta um pulo em Vicente
Pires. Quem as vê pode até se perguntar por onde anda a fiscalização. A esse
tipo de questionamento, a presidente da Agência de Fiscalização (Agefis), Bruna
Pinheiro, é clara: obras ilegais, não consolidadas, serão derrubadas
“muito em breve”, e quem pagará a conta da demolição é o próprio invasor da
terra pública. A promessa é de que essa e outras medidas estão a caminho. “Não
temos a intenção de derrubar todos aqueles (prédios) que já estão construídos,
mas pretendemos regularizar cobrando muito caro o metro quadrado da
irregularidade”, assegura Bruna, que é servidora pública da agência há 21 anos.
O objetivo, diz a gestora, é coibir as irregularidades em todo o DF, do Setor
Sol Nascente aos lagos Sul e Norte. Aliás, a desobstrução da orla do espelho d´água
é outra garantia dada pela presidente da Agefis, que reforça: “A política desse
governo é não permitir novas invasões”.
Qual o
balanço dos primeiros seis meses de trabalho?
A primeira
coisa que fizemos foi mudar a metodologia de trabalho da Agefis, que vinha
trabalhando do mesmo jeito nos últimos 20 anos. Claramente, isso se demonstrou
falível, porque só vimos as irregularidades e os problemas crescendo,
principalmente em relação à grilagem de terras. Mudamos completamente. Os
auditores eram divididos em trechos, ficavam ali entre três e seis meses
e, dentro daquela área, tinham total autonomia para decidir o que seria
feito. Isso até funcionou bem no começo, quando tínhamos uma grande quantidade
de auditores. Então, mudamos essa questão drasticamente. Não trabalhamos mais
com trechos, mas, sim, com programação fiscal pré-estabelecida. Levantamos
temas prioritários, ações que são mais graves, aquilo que faz mais mal à cidade
e soltamos uma programação para uma ação em conjunto. O planejamento é ter começo,
meio e fim. Resolveu aquele problema, vamos para o próximo.
A Agefis
fez uma ação no Sol Nascente, que retirou ocupantes de uma área necessária para
a construção da infraestrutura. Esse tipo de operação vai ocorrer sempre?
Infelizmente,
sim. Poderíamos usar a fiscalização para trabalhar muito mais com a educação
fiscal, proteger o tombamento. Mas a indústria da grilagem praticamente
se descontrolou nos últimos quatro anos. Temos invasões enormes. Mas não
é simplesmente retirar pessoas que têm necessidade de moradia. Elas estão
ocupando áreas de preservação de nascente, áreas que podem comprometer o
abastecimento de água. Outro problema sério é Vicente Pires. Veja o que
aconteceu com aquela região, com o trânsito, o abastecimento de energia, o transtorno
para população daquela imediação. Brasília não suporta mais isso.
A política
desse governo é não permitir novas invasões. A data limite que colocamos é
julho de 2014, porque, no período eleitoral, a fiscalização praticamente não
aconteceu. Fizemos a ação no Sol Nascente, que parecia impossível, já
que se tratava de 500 barracos. Politicamente, é muito ruim, mas é muito pior
deixar. Deixar aquelas edificações prejudicaria as três mil pessoas que
estão no Trecho 1 do Sol Nascente. Já existe um contrato para rua pavimentada,
água canalizada, passeio público e, na área de baixo, locais para creches,
escolas, hospitais.
Aquela população precisa muito de um posto de saúde e onde
isso seria construído? E a gente não pode esquecer também que existe uma máfia,
um crime organizado, pessoas vendendo o que não lhes pertence e usando um pouco
da ingenuidade da população. Um pouco, porque as pessoas já sabem o que é ou
não regular. Mas a população mais carente ainda é um pouco mais ingênua em
relação a isso. A grilagem se beneficia também da omissão do governo, da demora
em agir. Existia um critério nas últimas gestões de que casa habitada não era
derrubada.
Então, era muito fácil. Se você conseguia cobrir e botar alguém lá
dentro, aquilo ficava consolidado. Esse critério nós eliminamos. Habitada ou
não, se for recente, em área de interesse social, ecológico, área prioritária
do governo, vai ser removida.
Muita
gente comparou os métodos do governo no Sol Nascente em relação às invasões da
orla no Lago Sul. Como a Agefis lida com esse tipo de crítica?
Esse governo
foi o primeiro que enfrentou o problema da orla. No primeiro mês, assumimos um
acordo com a Justiça que estava sendo protelado desde 2011. Nós assumimos que
faríamos a desobstrução. Não porque existe a decisão judicial, mas porque
entendemos que é o certo, que a orla precisa ser democratizada.
A ação foi toda
planejada, organizada e foi momentaneamente suspensa pela Justiça. Então, não
existem dois pesos e duas medidas. Assim como algumas casas em áreas de menor
renda conseguem liminares, em uma proporção muito menor, porque não podem pagar
bons advogados, não conhecem todos os meandros da lei, mas também acontece e
nós respeitamos do mesmo jeito. Recentemente, tivemos uma operação no SIA, onde
fizemos uma demolição de um monte de casas e deixamos uma no meio, porque essa
conseguiu uma liminar. Esse governo teve a coragem de enfrentar e pretende
fazer a desobstrução assim que a Justiça finalizar o processo.
O
cercamento geralmente invade a área pública. Essas construções podem ser
derrubadas com o mesmo tipo de operação que foi feita no Sol Nascente?
Sim. Mas,
por exemplo, algumas pessoas construíram quadras de tênis, píeres. A ideia
não é derrubar, mas abrir para que a população utilize as
construções. Até porque o dano ambiental de demolição é muito maior do que
deixar esses equipamentos como estão e abri-los para a população.
Em
Vicente Pires, que ainda está longe da regularização, os prédios começaram a se
multiplicar. Vai ser possível coibir esse tipo de grilagem?
Para você
ver como não existe limite para irregularidade. É possível e vamos reverter.
Tivemos uma reunião com a Associação Comercial de Vicente Pires para dizer que
não permitiríamos novos prédios. São duas coisas distintas. Uma é a ação administrativa.
Essa já está em andamento. As obras estão embargadas, estamos aplicando multas
semanais, inscrevendo em dívida ativa. E um outro processo, que já foi montado,
é a demolição dos novos prédios. A data limite de construção também vale para
eles. Não temos a intenção de derrubar todos aqueles que já estão construídos,
mas pretendemos regularizar cobrando muito caro o metro quadrado da
irregularidade.
O governo está trabalhando em uma legislação para isso, mas não
vamos permitir novos edifícios. Estamos preparando um termo de referência para
contratação de uma empresa especializada para demolição de prédios. E todo
custo dessa demolição vai ser cobrado do infrator que edificou aquele prédio.
Até porque é uma situação extremamente injusta.
Além de ser um problema de
iluminação, água, esgoto, trânsito, do outro lado da EPTG, você tem, em Águas
Claras, empreendedores que demoram, às vezes, três anos para conseguir
Habite-se. Aquele que está agindo certo está sofrendo muito mais do que o
que age errado. Estamos batendo duro na construção de prédios em
Vicente Pires e as pessoas verão, muito em breve, a demolição de algumas dessas
construções.
Como
ficariam os proprietários dos apartamentos?
Com o
decorrer do tempo, é possível que alguns prédios sejam regularizados, mas
também é possível que não, que talvez eles nunca consigam escritura definitiva.
A demolição daquilo que já está consolidado é que provavelmente não ocorra.
Pelo jeito, as pessoas não estão muito preocupadas com a escritura, porque investiram
muito dinheiro, até R$ 150 mil.
A Lei de
Uso e Ocupação do Solo (Luos) não saiu do papel. A Agefis tem dificuldade de
trabalhar sem esse instrumento?
Muita
dificuldade, porque a cidade é viva, dinâmica. E as pessoas, o comércio e a
indústria agem de acordo com a demanda. Se o mercado precisa de um determinado
setor comercial em uma área, o empresário que tem visão vai se
instalar. E Brasília é uma cidade muito engessada com relação ao uso e à
ocupação. É tudo muito setorizado e as pessoas têm dificuldade de
se organizar.
Por exemplo, no Setor de Indústrias Gráficas, não pode
restaurante. Mas as pessoas que trabalham lá não podem comer?
Parte dessas empresas está aqui por conta de liminares. São empresas que
não prejudicam em nada, que fazem a economia girar, que ocupam prédios
que provavelmente estariam vazios ou sendo invadidos.
Então, a Luos é muito
importante para a Agefis, porque existe uma quantidade grande de
estabelecimentos necessários para a cidade e estão sem condições de ter
alvará. Muitos no comércio de pequeno porte estão irregulares por
uma morosidade em aprovar as leis e fazer com que elas se enquadrem nas
necessidades. Estamos trabalhando na redação desse projeto, assim como na
revisão do código de obras, para que a Agefis possa trabalhar protegendo a
cidade e não perseguindo um comerciante que tenta
ganhar a vida licitamente.
Os
alvarás ainda representam um grande problema para as construtoras mesmo com a
criação da Central de Aprovação de Projetos. A Agefis tem sido compreensiva com
essa questão?
Sim. A
primeira compreensão é mandar auditores nossos para compor a central, porque a
maioria trabalhou durante muito tempo nessa área. A segunda, que eu
acho que é a maior contribuição da Agefis nesse processo, é trabalhar junto com
a Secretaria de Gestão de Território para desburocratizar o código de
edificações. Hoje, se você for reformar sua casa, sem acréscimo de área, você
precisa entrar na fila de aprovação de projeto.
A gente quer tirar todas essas
obras que não têm impacto. Queremos desburocratizar totalmente esse processo. A
criação da central de projetos é muito boa, afinal estamos padronizando a
análise, todo mundo tem o mesmo critério. Mas é muito burocrática. Eu não
conheço ninguém que conseguiu aprovar um projeto de primeira. Temos
trabalhado na fiscalização, principalmente nas obras de maior risco para a
cidade.
Do ponto
de vista da Agefis, a regularização dos condomínios é possível ser feita em um
prazo razoável?
A gente faz
parte do Conplan, o que era uma distorção que existia, o órgão de fiscalização
não ter assento. Estamos participando de todo o processo de fiscalização
e o Conplan hoje tem trabalhado efetivamente na regularização de diversos
parcelamentos. O novo código de edificações está propondo um processo
simplificado.
Os
ambulantes têm sido presença constante. O que aconteceu?
A questão de
ambulantes no DF, no Brasil e no mundo é social. As pessoas estão
desempregadas, têm família para sustentar e muitas vão para o meio da rua.
Acredito que não seria diferente se não tivéssemos que dar de comer para os
nossos filhos. Não duvido nada que iria vender salgadinho no meio da rua.
Tratar isso como uma questão de fiscalização é pensar muito pequeno. Os ambulantes
precisam, sim, ser regularizados e aquilo precisa ser tratado de maneira
organizada.
Nova York, Paris, Londres e no mundo todo têm ambulantes. No caso
de Nova York, o carrinho é padronizado, o local onde ele pode ficar é definido
e tem limite de vendedores. Não se pode dizer aqui em Brasília que não pode
mais nenhum ambulante. Precisamos trabalhar com critérios e regularização. Não
é um problema só da Agefis.
A gente pode, sim, ocupar o centro como fizemos.
Não dá para tratar só da rodoviária ou só do Setor Comercial Sul. Fizemos todas
as áreas de interesse e ficamos um mês direto. O ambulante chega às 8h?
Chegávamos às 7h30. Então, não teve confronto. Ele chegava com a mercadoria e
era avisado que não podia. Durante esse mês, não houve praticamente nenhum
embate. Querer acabar com os ambulantes é ilusão. Ninguém no mundo conseguiu
fazer isso até hoje.
Vocês
consideram possível convencer os ambulantes a ocupar o Shopping Popular?
Sabe porque
aquele lugar é vazio? Não é porque é longe. A Feira dos Importados é longe e é
cheia, assim como a Feira do Guará. Vai gente de Brasília toda nesses lugares.
Aquele lugar é vazio porque a implantação foi feita de maneira
equivocada. Eu posso dizer porque participei da retirada dos ambulantes, em
2008.
Nessa época, estava na Diretoria de Planejamento da Agefis e montei todo
o plano de retirada. É muito mais fácil você retirar o ambulante e oferecer uma
área a ele. O problema é que essa transição para lá foi muito lenta. Os boxes
não estavam construídos, abriram uma linha de financiamento, começou uma máfia
das associações que queriam parte do financiamento do lojista. Foi tão mal
administrado que fez com que as pessoas não ficassem.
O Jornal
de Brasília mostrou recentemente que as apreensões de mercadorias caíram 85% em
comparação aos seis primeiros meses de 2014. É falta de pessoal?
Em 31 de
dezembro de 2014, encerrou o contrato de apoio operacional. Toda a apreensão é
feita por um pessoal contratado para carregar e levar para os caminhões.
Obviamente, diminuiu bastante nossa capacidade. Mas não apenas por isso.
Também entendemos que esse confronto é a pior maneira de fazer a fiscalização.
O modo que estamos encarando o trabalho é diferente em relação à gestão
passada. Nosso objetivo não é ir para o confronto. Meu objetivo é, no final
desses quatro anos, diminuir o número de autos emitidos pela Agefis.
Quero que as pessoas estejam regulares, que trabalhemos muito mais com educação
fiscal em vez de repressão.
Fonte: Jornal de Brasília - Com: Daniel Cardozo
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