O governo federal decidiu retomar os imóveis dos beneficiários mais
carentes do programa Minha Casa Minha Vida que estão inadimplentes há
mais de três meses. A Caixa Econômica Federal apertou a cobrança das
prestações que estão atrasadas. Passou a ligar e a enviar SMS para os
beneficiários logo após os primeiros dias de vencimento.
A
mudança de postura em relação aos calotes da chamada faixa 1 do programa
- famílias com renda mensal de até R$ 1,6 mil - se deve a dois fatores:
o agravamento da crise, que não permite ao governo ser leniente com a
inadimplência em momento de frustração de recursos, e o temor da
fiscalização dos órgãos de controle, já que até 95% desses imóveis são
bancados com dinheiro público.
A inadimplência do faixa 1 fechou o
primeiro semestre deste ano em 22%, dez vezes superior aos atrasos dos
financiamentos imobiliários tradicionais. O nível é também destoante das
operações das outras duas faixas de renda do Minha Casa: a parcela de
atrasos acima de 90 dias nessas faixas está por volta de 2%. Os dados
foram repassados pelo Ministério das Cidades. Segundo o governo, um
quarto dos contratos do MCMV faixa 1 está há mais de 90 dias em atraso.
De acordo com as regras do programa, as prestações para as famílias da
faixa 1 não podem ultrapassar 5% da renda do beneficiário, com valor
mínimo de R$ 25 pagos pelo período de dez anos.
O primeiro passo
para retomar os imóveis dessas famílias foi dado no fim do ano passado
pela presidente Dilma Rousseff. Ela modificou uma lei para determinar
que os imóveis tomados devem ter um tratamento diferenciado. Em vez
levar a leilão, como costuma acontecer nos financiamentos imobiliários, a
Caixa tem de reincluir o imóvel no programa, para ser direcionado a
outro beneficiário que está na lista de espera do Minha Casa. A
alteração na lei evita que o imóvel retomado seja comprado por uma
família com renda superior à dos beneficiários do programa, o que seria
uma desvirtuação do programa. Essas casas ou apartamentos têm um
tratamento tributário diferenciado, ou seja, são construídos com menos
impostos.
Na época, o Ministério das Cidades informou que o
programa não tinha objetivo de retomar os imóveis no caso de
inadimplência, mas ajudar as famílias a superar as dificuldades
financeiras e colocar as prestações em dia. Ressaltou o fato de que a
faixa 1 do Minha Casa não era um financiamento como outro qualquer, mas
uma política social para reduzir o déficit habitacional. O discurso,
porém, mudou. O Ministério das Cidades informou agora que adotará o que
diz a lei para os casos de inadimplência, ou seja, entregar o imóvel
para outra família. "Hoje, o Ministério das Cidades e o agente operador
do programa [CAIXA] estão discutindo a forma de implementação da lei",
informou.
"Tolerar
a inadimplência como ocorreu até pouco tempo é inadmissível. O imóvel é
bancado com dinheiro da sociedade. Não consigo entender por que não
tomaram essa decisão antes", diz Flávio Prando, vice-presidente de
Habitação Econômica do Secovi-SP, o sindicato de empresas do setor em
São Paulo. Ele considera que as condições são "exageradamente
favoráveis" para o calote e que falta uma qualificação mais precisa das
condições financeiras das famílias.
Para Lauro Gonzalez,
coordenador do centro de estudos de microfinanças e inclusão financeira
da FGV, parte considerável dos beneficiários do programa poderia pagar
uma prestação superior à de 5% da renda. Ele defende que o caminho seria
uma espécie de microcrédito orientado para essas famílias, com análise
do potencial de pagamento de cada uma. "Isso diminuiria a inadimplência e
o subsídio empregado no programa", diz. As informações são do jornal O
Estado de S. Paulo.
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