Se o seu filho aprendeu a tocar violino aos cinco anos, era
o primeiro aluno da classe aos sete anos, resolvia sozinho complicados
problemas de matemática aos doze anos e leu e compreendeu as obras filosóficas
de Immanuel Kant aos 13 anos, muito cuidado – longe de ser um futuro Albert
Einstein, o precoce autor dessas façanhas, ele não passa de um portador de
necessidades especiais, que precisa com urgência dos cuidados de uma escola
inclusiva, a exemplo das crianças mentalmente retardadas. É o que se deduz do
Plano Nacional de Educação 2011-2020, que – a exemplo de toda a legislação
educacional e de toda a produção acadêmica – trata o aluno superdotado da
mesma forma que trata o aluno com deficiência mental.
A Meta 4 do Plano Nacional de Educação é taxativa:
“Universalizar, para a população de 4 a 17 anos, o atendimento escolar
aos(às) alunos(as) com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e
altas habilidades ou superdotação, preferencialmente na rede regular de ensino,
garantindo o atendimento educacional especializado em salas de recursos
multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou
comunitários, nas formas complementar e suplementar, em escolas ou serviços especializados,
públicos ou conveniados”. E a Estratégia 1.9, que trata da creche e da
pré-escola, também junta, nesse mesmo caldeirão pedagógico, vazado num estilo
sofrível, os “educandos com deficiência e transtornos globais do
desenvolvimento” e aqueles com “altas habilidades ou superdotação”.
Podem anotar: a Meta 4 do Plano Nacional de Educação será
uma camisa de força para o aluno superdotado, que, com base nela, poderá ser
obrigado – repito: obrigado – a estudar na falida escola pública, mesmo que uma
escola privada de elite, apostando em sua inteligência, resolva conceder-lhe
uma bolsa de estudos integral. E poderia ter sido pior: o projeto original do
Executivo, referendado pela Câmara dos Deputados, não continha o termo
“preferencialmente” – lacuna que não passava de uma estratégia para aprisionar
todos os deficientes mentais na escola pública, levando de roldão os
superdotados. Felizmente, devido à luta das Apaes (Associação de Pais e Alunos
de Excepcionais), o Senado acrescentou esse advérbio de modo ao texto,
atenuando o caráter impositivo da lei, que, ainda assim, continua se inspirando
na “escola única” da União Soviética de Lênin, referendada por Paulo Freire, o
santo padroeiro do marxismo de autoajuda, e seu discípulo Moacyr Gadotti.
Tecnicamente falando, a “rede regular de ensino” tanto pode
ser pública quanto privada, além de conveniada ou comunitária, pois o que a
caracteriza é o fato de integrar o sistema educacional progressivo, regido por
lei, que se inicia na pré-escola e se estende à pós-graduação, passando pelos
níveis fundamental, médio e graduação. Todavia, o que se constata, na prática,
é que a expressão “rede regular de ensino”, especialmente quando se associa a
alunos com deficiência, significa, na prática, “rede pública de ensino”,
excluindo os estabelecimentos privados de sua definição. Toda a política de
inclusão, alardeada pelo MEC desde a década de 90, tem como foco preferencial –
e, às vezes, exclusivo – a escola pública, tomada praticamente como sinônimo de
“rede regular de ensino”.
Prova disso é que a própria construção textual da Meta 4 só
tem embasamento lógico se a expressão “rede regular de ensino” for lida como
“rede pública de ensino”, caso contrário, é surrealismo puro. Universalizar o
atendimento escolar para os deficientes mentais e superdotados de 4 a 17 anos
significa tornar obrigatória a educação especial nessa faixa etária. Até aí, vá
lá. Mas qual o sentido de se obrigarem os pais a matricular esse aluno na rede
regular de ensino e, ao mesmo tempo, estabelecer que o “atendimento educacional
especializado” – isto é, justamente o atendimento de maior sofisticação – só
poderá ser feito em sala de recursos multifuncionais da própria rede regular ou
em escolas e serviços especializados, públicos ou comunitários? Por que em
estabelecimentos privados não pode? Desde quando a escola básica privada é
inferior à pública, precisando ser complementada por esta última e não o
contrário?
Tratando superdotado como deficiente
Quando se trata de alunos com retardo mental, ainda é possível
vislumbrar alguma razão que justifique essa meta. Historicamente, o aluno com
deficiência mental era excluído do convívio com alunos normais e não costumava
ser aceito na rede regular de ensino, fosse ela pública ou privada. Por isso,
acreditam os defensores da educação inclusiva, é preciso forçar sua matrícula
na rede pública, para que ele não fique confinado no universo da deficiência
que impera nas escolas especiais. Mas muitos desses alunos têm graves
deficiências de comunicação e não compreendem normas básicas de convívio,
exigindo o atendimento especializado. É onde entram as entidades comunitárias,
como as Apaes e os Institutos Pestalozzi, que dispõem de mais experiência e
recursos para lidar com esses alunos.
Já no caso dos superdotados, não faz nenhum sentido
estabelecer que sua educação complementar deverá ser ministrada em
estabelecimentos públicos ou comunitários, como se vê explicitamente no Plano
Nacional de Educação. No afã de tratar o superdotado como deficiente, as
autoridades pedagógicas produziram uma meta surrealista, que consiste em
obrigar o aluno com alto desempenho intelectual a aprimorar seus conhecimentos
na rede pública de ensino, mesmo que esteja estudando numa escola privada. É
isso o que restou escrito no Plano Nacional de Educação, que,
estilisticamente, contém trechos que parecem obra de analfabetos funcionais.
Como o mais tresloucado dos ideólogos não ousaria dizer que
a escola pública é melhor do que a escola privada (o Enem e o Ideb mostram o
contrário), o absurdo dessa redação indica que os autores do plano nem estavam
considerando a rede privada e, quando falam em rede regular de ensino, estão
pensando exclusivamente nas escolas públicas.
Prova disso é que, nos documentos oficiais do MEC e nos
estudos acadêmicos, o termo “superdotado” e “portador de altas habilidades”
aparecem indissociavelmente ligados ao termo “inclusão”, como se o superdotado
fosse um incapaz, precisando de alguém que o tome pela mão e o mantenha na sala
de aula. É o que fica claro na “Avaliação do Plano Nacional de Educação
2001-2008”, elaborada a pedido do MEC por pesquisadores de quatro universidades
(UFG, que coordenou o trabalho, UFMG, UnB e UFPE) e publicada em 2009 pelo Inep
(Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Anísio Teixeira). No capítulo em
que avaliam a educação especial, os pesquisadores afirmam, taxativamente, que
“entre os alunos com deficiência também estão incluídos os que possuem altas
habilidades/superdotação, ou seja, grande facilidade de aprendizagem, o que os
leva a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes”.
Na época da publicação desse estudo, fiz a seguinte
observação: “Que não se pergunte aos acadêmicos como uma ‘grande facilidade de
aprendizagem’, que leva o aluno a ‘dominar rapidamente conceitos’, pode ser
considerada uma ‘deficiência’ e não um verdadeiro prêmio. De duas uma: ou a
pedagogia progressista é ela própria uma deficiência mental ou seus
protagonistas precisam, com urgência, de uma camisa de força”. Mas esses
professores universitários que, a exemplo do MEC, tratam o aluno superdotado
como deficiente são os mesmos que não acreditam na deficiência mental e acham
que todos os cérebros são potencialmente iguais – isto é, não passam de uma
tábula rasa a ser escrita apenas pelo ambiente, sem reconhecer as influências
genéticas na formação da inteligência. Por isso, há mais de duas décadas, as
universidades travam uma guerra de ódio contra as Apaes, obtendo sua primeira
vitória já na Constituição de 88, cujo artigo 208 já estabelece que a educação
do deficiente deve ser feita preferencialmente na rede regular de ensino.
Universidades querem acabar com Apaes
A produção acadêmica sobre educação inclusiva, tanto de
deficientes quanto de superdotados, é uma prova de que as universidades querem
acabar com as escolas especiais. É o que se infere desta declaração dos
especialistas que avaliaram o Plano Nacional de Educação a pedido do MEC: “Não
cabe o conceito de deficiência severa a qual alguns estudantes não estariam
aptos a frequentar a escola. Ele reproduz uma visão homogênea de ensino e
aprendizagem que historicamente tem justificado a exclusão escolar de pessoas
com deficiência. A meta [de manter escolas especiais] deverá, portanto, ser
excluída”.
Ocorre que as escolas especiais são as únicas capazes de
acolher crianças que não conseguem comunicar-se com o mundo, pois nem mesmo
sabem quem são, aprisionadas num eu devoluto, destituído de razão e palavras,
sem a mínima noção de alteridade, como acontece, por exemplo, com as crianças
que apresentam síndrome de Rett, uma anomalia genética do cromossomo X, descoberta
em 1966 pelo neurologista e pediatra austríaco Andreas Rett (1924-1997), que
ataca meninas entre 6 e 12 meses de vida, atrofiando-lhes o cérebro, anulando
sua psicomotricidade e condenando-as a minguar, vegetativamente, numa cadeira
de rodas.
Mas até crianças com essa síndrome os pedagogos querem
condenar à escola regular, privando-as do tratamento personalizado da escola
especial. É o que defende, por exemplo, o pesquisador Rogério Drago, pós-doutor
em Educação e professor da Universidade Federal do Espírito Santo, onde é
orientador de teses de mestrado e doutorado, além de ser o organizador de
vários livros e autor de vários artigos sobre o tema. Em artigo publicado na
revista da Faculdade Cenecista de Vila Velha, em 2012, Rogério Drago afirma que,
“ao contrário do que muita gente pensa, pode não ser tão difícil assim” educar
na escola comum uma criança com síndrome de Rett, ainda que isso demande mais
tempo e recursos.
O pedagogo afirma que a escola regular deve oferecer às
crianças com síndrome de Rett um espaço “estimulante, interessante, envolvente,
instigante, de produção de subjetividades autônomas, criadoras e inovadoras,
livres de preconceitos que possam impedir que a diversidade dos sujeitos se
faça presente, numa proposta de escola inclusiva”. E conclui que o indivíduo
com deficiência, no caso a criança com síndrome de Rett, ao “participar do
contexto histórico e sociocultural da sociedade à qual está integrado”, entra
em contato sistemático com outras pessoas, “apropriando-se dos conhecimentos e
conceitos acumulados pela sociedade e pelas contribuições que pode receber das
interações mantidas com seus pares” e, “num processo de apropriação e
transformação, vai deixando sua marca como ser único na coletividade”.
Pedagogia despreza avanços da genética
Como se vê, a pedagogia brasileira sofre de um profundo
autismo ideológico e se tornou completamente incapaz de perceber a realidade à
sua volta. Se em nome do igualitarismo de Rousseau e Marx, ela nega os graves
efeitos cognitivos de um dano cerebral como a síndrome de Rett, é evidente que
vai negar também os efeitos positivos de um QI elevado, desprezando as raízes
genéticas e hereditárias da inteligência, o que, na prática, significa matar
simbolicamente o superdotado.
Useiras e vezeiras em responsabilizar o professor do ensino
básico por todos os males do ensino, as universidades gostam de acusá-lo também
pela suposta “invisibilidade” do superdotado na escola, mas essa invisibilidade
ocorre, de fato, na academia, que historicamente negligenciou o aluno
superdotado, tentando negar até mesmo sua existência.
Segundo dados da Associação Nacional de Pós-Graduação em
Educação, divulgados numa entrevista da professora Susana Pérez à revista
“Ciência Hoje” de janeiro de 2007, até aquele ano só havia registro de um único
trabalho de pós-graduação sobre superdotação no País, enquanto sobre
deficiência já existiam centenas. Até então, só havia seis doutores formados
com foco em superdotação (Pérez seria a sétima) e o número de mestres não
chegava a 50. Hoje, esse quadro mudou, ao menos quantitativamente: já foram
defendidas 45 dissertações e teses de mestrado e doutorado sobre superdotação e
o MEC estimulou a criação de centros de apoio à educação dos superdotados em
todos os Estados brasileiros. Mas, substancialmente, a política educacional
para os superdotados continua a mesma – para o MEC, o superdotado deve fazer
parte da “escola inclusiva”, o que significa rebaixá-lo a um nível
intelectualmente inferior.
Em tese, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, promulgada
em 20 de dezembro de 1996, prevê a aceleração escolar para o superdotado,
permitindo-lhe concluir em menor tempo o programa de ensino, mas, na prática,
isso raramente acontece – se é que acontece no âmbito da escola pública. A
educação brasileira, desde o advento da famigerada pedagogia de Paulo Freire,
nivela o aluno por baixo e, nos centros de apoio aos superdotados, não será
diferente. É o que se depreende de um programa sobre superdotados produzido e
veiculado pela TV Câmara em agosto de 2008, que contou com a participação da
professora goiana Raquel Teixeira, então deputada federal pelo PSDB, e de
professoras do Núcleo de Atendimento a Alunos com Altas Habilidades e
Superdotação do Distrito Federal, escolhido pelo MEC para ser modelo para as
outras 26 capitais brasileiras, onde foram implantados núcleos do gênero.
Quem pensa que protagonistas do referido programa foram
crianças prodígios em matemática, línguas ou música clássica, engana-se – em
meio a imagens de Pelé marcando gols, para ilustrar o conceito de gênio, os
principais destaques foram um menino de 11 anos que se tornou campeão mundial
de patinação e uma ex-moradora de rua que gosta de fazer poemas e desenhar.
Parece piada, mas o menino se tornou um “superdotado” porque, além de ser
repetente e tirar notas ruins em matemática e português, tinha péssimo
comportamento na escola e em casa. Sua mãe procurou ajuda de um psicólogo e a
criança acabou sendo classificada como superdotado por ser exímio e obcecado
patinador. Tudo bem que esse seu talento esportivo fosse acolhido pela escola
como atividade complementar, mas daí a premiá-lo com a matrícula num núcleo de
superdotados é um acinte, que desestimula os bons alunos em matemática e
linguagem, preteridos por um patinador, como se fosse possível construir uma
nação sobre patins.
Superdotação justifica até o crime
Parece que o único superdotado, de fato, mostrado na
reportagem era um jovem de 19 anos que estava participando da construção de um
foguete na UnB, depois de integrar programas para superdotados desde os 11
anos. Mas seu talento no difícil campo da física foi colocado no mesmo patamar
do talento de uma ex-moradora de rua que largou a escola aos 15 anos de idade e
se entregou ao álcool. Aos 30 anos foi resgatada das ruas e, por alinhavar
poemas e copiar desenhos, foi acolhida como superdotada – o que,
definitivamente, não é. Na reportagem, após recitar uns versos singelos (que
não exigiam habilidade nem talento e, ao menos parcialmente, foram copiados de
terceiros, como dá para notar), ela se emociona e chora. É a superdotação sendo
confundida com assistência social. Num ambiente assim, uma mente brilhante pode
ser tolhida – não só pela falta de competidores, mas também pelo remorso,
abdicando de dar o máximo de si para não parecer socialmente ofensiva.
Pasmem! Para esses especialistas, a superdotação não se
confunde apenas com assistencialismo – ela serve até para justificar o crime.
Num dado momento da reportagem, a apresentadora afirma: “E quando o talento de
uma criança superdotada é ignorado?” A resposta é a imagem de Luiz Fernando da
Costa, o Fernandinho Beira-Mar, sendo preso pela polícia federal, enquanto a
narração continua: “A pobreza e os problemas sociais podem fazer o Brasil
perder essas inteligências para o crime. Violentos e engenhosos líderes de
facções criminosas como Fernandinho Beira-Mar são apontados pelos especialistas
como superdotados”. Então, a professora Olzenir Ribeiro, do Núcleo de Altas
Habilidades do Distrito Federal, hoje doutoranda em educação, acredita que tem
a chave para a compreensão da criminalidade, ilustrada por Beira-Mar, e afirma
taxativamente: “A gente pode dizer que o talento precisa ser desenvolvido e
trabalhado ou para o bem ou para o mal. E que se nós não conseguimos alcançar
esse talento para o bem ele vai ser trabalhado para o mal”.
Tenho calafrios só de pensar que esse núcleo de
especialistas em superdotação da UnB é o modelo do MEC. Para essa gente, os
superdotados não passam de autômatos completamente incapazes de enfrentar os
imprevistos da vida e se não forem confinados em estufas cognitivas, protegidos
do mundo por babás pedagógicas, fatalmente vão-se tornar criminosos, colocando
seu talento a serviço do mal para se vingar da sociedade que não os acolheu.
Por esse critério, as cadeias estariam abarrotadas de escritores e artistas
frustrados, começando por Machado de Assis, forjado pelas intempéries da vida,
sem babás pedagógicas a dirigir seu talento. Felizmente! E o que dizer do
grande Patativa do Assaré, nosso Homero sertanejo, órfão, cego, escravo da
fome, trabalhando no eito aos oito anos de idade para ajudar no sustento da
família? Esse, sem dúvida, tinha de ir para o cangaço. Só assim para se vingar
do enorme descaso de que foi vítima.
MEC compara Jô Soares a Da Vinci
Esse vilipêndio contra os superdotados se acha presente no
livro “Altas Habilidades/Superdotação: Encorajando Potenciais”, de Angela
Virgolim, publicado em 2007 pela Secretaria de Educação Especial do MEC. Num
quadro da obra intitulado “O Que Diz a História?”, conta-se que o professor de
música de Beethoven disse que ele era “sem esperança” como compositor e que
Einstein tinha dificuldade de ler e soletrar e foi reprovado em matemática. É
uma forma sutil e invejosa de dizer que qualquer um pode ser Beethoven ou
Einstein. Notem que o MEC não diz que Beethoven teve seu talento negado por
“um” professor, o que seria normal, mas por “seu” professor. É como se o autor
da “Nona Sinfonia” tivesse sido um completo fracasso musical antes de se tornar
um gênio.
Mentira! Inteligência e talento são largamente hereditários,
como sabe o povo, que criou o provérbio: espinho quando tem que furar já nasce
com a ponta fina. Hoje, essa máxima é referendada pelas modernas pesquisas
científicas sobre o cérebro, infelizmente ignoradas pela pedagogia brasileira.
Praticamente todos os grandes músicos demostraram propensão para a música
ainda em tenra idade. Com Beethoven não foi diferente. Ele começou a estudar
música aos três anos, aos sete fez sua primeira apresentação pública e aos onze
publicou sua primeira obra, as “Variações Dresslef”. No ano seguinte, seu
professor de música, o cravista, organista e compositor Christian Gottlob Neefe
publicou uma nota elogiosa sobre Beethoven, então com doze anos, numa revista
especializada em música. E, aos 13 anos, Beethoven foi nomeado organista da
corte, juntamente com Neefe, seu professor. Mais tarde, Haydn, então o maior
compositor da Europa, insistiu para que Beethoven publicasse suas composições
com o epíteto: “Discípulo de Haydn”, já que Beethoven fora seu aluno entre 22 e
24 anos.
Se a ideia de um Beethoven medíocre, vendida pelo MEC, não
se sustenta, o que dizer do Einstein que foi reprovado em matemática? Einstein,
de fato, teve problemas na escola devido ao seu gênio irascível, mas estava
longe de ser outro “superdotado deficiente”, nos moldes prescritos pelo nosso
MEC, em busca de uma babá pedagógica. “Uma crença amplamente difundida a
respeito de Einstein reza que ele foi reprovado em matemática quando era
estudante”, escreve Walter Isaacson, na biografia “Einstein: Sua Vida, Seu
Destino” (Companhia das Letras, 2007). “Bem, a infância de Einstein oferece
diversas ironias à história, mas essa não é uma delas”, continua o biógrafo e
conta que, em 1935, ao saber que numa coluna de jornal haviam dito a respeito
de si que “o maior matemático vivo repetiu em matemática”, Einstein riu: “Nunca
fui reprovado em matemática”. E acrescentou: “Antes dos quinze anos, já
dominava cálculo diferencial e integral”.
Há uma clara tentativa da pedagogia brasileira no sentido de
desvalorizar os superdotados, começando por engessá-los no ambiente desolador
da escola pública, sob a ideologia da “educação especial numa perspectiva
inclusiva”. Incluir superdotados? Não passa de contrassenso. O superdotado
precisa não de escola inclusiva, mas de escola exclusiva. Ele deveria ser
positivamente excluído das salas abarrotadas de alunos relapsos, desordeiros,
drogados e intelectualmente medíocres para ser incluído em escolas de elite,
onde seria estimulado pela convivência com seus iguais, num misto de diálogo e
desafio. Mas, no Brasil, os pedagogos abominam a ideia de acelerar aluno
superdotado para que ele adiante os estudos. Preferem apostar no que chamam de
“enriquecimento”, que é dar conteúdo extra para o superdotado no contraturno,
mantendo-o preso na série compatível com sua idade cronológica, ainda que muito
aquém de sua idade mental.
Nos Estados Unidos, há 165 escolas públicas com altíssimo
nível de ensino, destinadas exclusivamente a superdotados, mediante um rigoroso
processo de seleção. Uma delas, a Escola de Ensino Médio Thomas Jefferson para
a Ciência e Tecnologia, do Norte da Virgínia, oferece anualmente 480 vagas, mas
atrai 3.300 candidatos, dois terços dos quais são superdotados. Os dados são do
presidente do Instituto Thomas B. Fordham, Chester E. Finn Jr., em artigo
publicado no “The New York Times”, em 18 de setembro de 2012, em que defende a
ampliação dessas escolas para superdotados. Algo que, no Brasil, soa como
anátema. É mais fácil o MEC derrubar escolas e construir no lugar campinhos de
pelada.
Afinal, em seu livro oficial sobre educação de superdotados,
o MEC não perdoa nem Leonardo da Vinci. Pelé aparece ao lado de Da Vinci como
um dos “grandes gênios” de todos os tempos, que “deram contribuições originais
e de grande valor à humanidade”, enquanto Jô Soares, chamado até de
“multinstrumentista”, para espanto de um Gismonti ou de um Hermeto, é
considerado tão versátil como o gênio da Renascença. Dizer o quê? Um país que
confunde bola com cérebro e dá mais valor ao campo de futebol do que à sala de
aula está fadado eternamente a comer capim.
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