No segundo semestre deste ano, o Tribunal de Justiça do DF (TJDFT) registrou pelo menos dois casos similares, onde os clientes foram favorecidos em detrimento das operadoras de saúde. Em ambos, as empresas foram obrigadas a ressarcir os autores das ações
Buscar direitos enquanto a saúde está debilitada é um desafio a mais e Quelma Regina Pessoa Dantas, aposentada de 52 anos,
sabe bem disso. “Talvez tenham achado que eu era desinformada. Temos
que buscar o que é nosso”, clama a mulher, que convive, há cerca de 15
anos, com o câncer de mama.
Sua luta foi para que o plano de saúde contratado cobrisse procedimento supostamente não previsto no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS). Assim como ela, muitos usuários têm usado a Justiça como aliada para garantir a cobertura.
A briga durou mais de um ano. “Meu mastologista disse que seria interessante eu fazer análise de sequenciamento genético, que só pode ser pedido por um geneticista”, explica. Tratada no Sírio-Libanês em Brasília, ela foi orientada pela própria instituição a fazer o exame, mesmo após negativa de seu plano de saúde em arcar com as despesas. “Falaram para eu entrar na Justiça e pedir ressarcimento depois”, diz.
No segundo semestre deste ano, o Tribunal de Justiça do DF (TJDFT) registrou pelo menos dois casos similares, onde os clientes foram favorecidos em detrimento das operadoras de saúde. Em ambos, as empresas foram obrigadas a ressarcir os autores das ações e ainda pagar indenização por danos morais.
Na decisão de 29 de setembro, o autor da ação pediu indenização, pois seu plano se negou a cobrir uma tomografia computadorizada conhecida como PET Scan, requerida após tratamento de câncer de próstata. A alegação da empresa foi que “o exame não consta do rol de cobertura do plano, nem na lista da ANS”. Na verdade, o PET Scan foi incluído no rol em 2013, mas apenas para alguns casos.
A relatora do processo entendeu que “o rol de procedimentos médicos da ANS é exemplificativo e representa a cobertura mínima a ser observada pelas seguradoras, o que possibilita a inclusão das formas de tratamento mais novas e eficazes descobertas pela medicina”. Dessa forma, o cliente foi indenizado.
Entendimento
“Os juízes vão pela prescrição médica, não pelo que está no rol”, diz o diretor do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin. Para ele, há dificuldade quando um novo procedimento entra no mercado e o contrato, feito anteriormente ao fato, especifica apenas um método antigo e, geralmente, menos eficaz.
“Cada inovação e evolução da medicina, quando lançada, sai sempre mais cara. Então, os planos se negam a fazer a cobertura e querem pagar apenas pelos procedimentos feitos anteriormente”, discorre.
Segundo ele, as vitórias são comuns, mas as empresas “insistem no erro” confiando na ingenuidade dos clientes. “Muita gente é mal informada e desiste por falta de conhecimento”, afirma.
Saiba Mais
Ano passado, o rol da ANS teve a inclusão de cerca de 80 procedimentos médicos e odontológicos – entre eles o PET Scan, para alguns casos – além da ampliação das indicações de mais de 30 procedimentos já cobertos (diretrizes de utilização).
A aposentada Quelma Regina Pessoa precisou fazer outro exame, a tomossíntese, ainda não contemplada no rol da ANS. Desta vez, não contestou judicialmente a falta de cobertura e pagou por conta própria. Agora, espera a inclusão do procedimento, uma mamografia
Rastreamento de gene de câncer
A aposentada Quelma Regina Pessoa Dantas teve câncer de mama pela primeira vez em 1999 e, novamente, em junho do ano passado. O exame PET Scan, cuja cobertura lhe foi inicialmente negada, é o mesmo feito pela atriz e embaixadora da Boa Vontade pela Organização das Nações Unidas (ONU), Angelina Jolie, em 2013. Ambas rastrearam o gene BRCA1/BRCA2 para avaliar riscos de desenvolver câncer de mama. A norte-americana, inclusive, optou, após os resultados, por retirar os seios, o que foi noticiado amplamente na mídia internacional.
“A primeira negativa foi porque não havia a nomenclatura específica no rol da ANS”, explica Quelma. O exame, segundo ela, foi importante para evitar a retirada precipitada de suas mamas e ovários. O plano de saúde até reconheceu o equívoco alguns meses após a contestação, mas os problemas estavam longe de terminar. “Tive que discordar deles de novo, pois o valor que enviaram não estava nem perto de ser o certo”, relembra-se.
Para ela, o pior foi a necessidade de passar pela burocracia do sistema judiciário e da própria empresa em meio a um tratamento delicado. “Quando veio a primeira rejeição de cobertura, eu estava em meio à quimioterapia. Foi mais difícil me concentrar no problema na Justiça do que na doença. Não é uma situação agradável”, desabafa.
Sem justificativa
Os problemas não acontecem somente quando há uma brecha legal para contestação. Em alguns casos, procedimentos supostamente previstos em contrato também são negados ou, por vezes, postergados sem justificativa plausível.
A professora de matemática Sara Vasconcelos Pais, 36, passa por situação similar a que Quelma superou. Também vítima de câncer, seu plano de saúde questionou diversos procedimentos solicitados pelos médicos que a atendem e, atualmente, suas sessões de quimioterapia estão em atraso.
Ela teme que, se o imbróglio continuar, ela não consiga fazer as sessões, algo prejudicial devido ao seu estado e tipo de câncer. A moça também teve um PET Scan negado, em processo de revisão pela operadora. “Já denunciei para a ANS e fui ao Procon, mas ainda não obtive resposta. Fui há pouco na Defensoria e me deram um relatório de documentos que devo levar”, diz.
“Se não faço o PET Scan no prazo, a cirurgia demora mais de 25 dias para ser liberada novamente. Preciso tirar o útero e um ovário”, desabafa a professora, atualmente afastada para tratar da saúde.
Burocracia em excesso
Sara Vasconcelos conta que, além das quimioterapia suspensas sem motivo, a biópsia para identificar se o tumor era maligno ou benigno levou mais de 20 dias úteis para receber uma definição do plano de saúde. “Para tomar injeções de imunidade, a operadora questionou a opção do médico. Contestei, eles liberaram, mas quando fui para a terceira aplicação da injeção, emperraram o processo de novo”, critica.
“Primeiro disseram que o plano não cobre, mas não existe nada disso no contrato. Cobre câncer, então deveriam cobrir tudo inerente à doença”, argumenta. A professora diz estar em uma “corrida contra o tempo” e espera que tudo seja liberado a tempo, mas não esconde a decepção com as questões burocráticas que impactam em sua saúde.
O diretor do Ibedec, José Geraldo Tardin, incentiva quem se sentir lesado a contestar e buscar seus direitos. Ele diz que muitas vezes os planos de saúde criam empecilhos mesmo quando a inclusão no rol da ANS não é problema. “Existem limitações contratuais, como que a pessoa só pode fazer dez sessões de fisioterapia. Mas se o médico prescrever 50, quem tem de saber é ele, não o plano”, exemplifica. “Todo descumprimento desse tipo de contrato dá direito a dano moral, pois coloca em risco a saúde do consumidor”, ressalta.
Sua luta foi para que o plano de saúde contratado cobrisse procedimento supostamente não previsto no rol da Agência Nacional de Saúde (ANS). Assim como ela, muitos usuários têm usado a Justiça como aliada para garantir a cobertura.
A briga durou mais de um ano. “Meu mastologista disse que seria interessante eu fazer análise de sequenciamento genético, que só pode ser pedido por um geneticista”, explica. Tratada no Sírio-Libanês em Brasília, ela foi orientada pela própria instituição a fazer o exame, mesmo após negativa de seu plano de saúde em arcar com as despesas. “Falaram para eu entrar na Justiça e pedir ressarcimento depois”, diz.
No segundo semestre deste ano, o Tribunal de Justiça do DF (TJDFT) registrou pelo menos dois casos similares, onde os clientes foram favorecidos em detrimento das operadoras de saúde. Em ambos, as empresas foram obrigadas a ressarcir os autores das ações e ainda pagar indenização por danos morais.
Na decisão de 29 de setembro, o autor da ação pediu indenização, pois seu plano se negou a cobrir uma tomografia computadorizada conhecida como PET Scan, requerida após tratamento de câncer de próstata. A alegação da empresa foi que “o exame não consta do rol de cobertura do plano, nem na lista da ANS”. Na verdade, o PET Scan foi incluído no rol em 2013, mas apenas para alguns casos.
A relatora do processo entendeu que “o rol de procedimentos médicos da ANS é exemplificativo e representa a cobertura mínima a ser observada pelas seguradoras, o que possibilita a inclusão das formas de tratamento mais novas e eficazes descobertas pela medicina”. Dessa forma, o cliente foi indenizado.
Entendimento
“Os juízes vão pela prescrição médica, não pelo que está no rol”, diz o diretor do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin. Para ele, há dificuldade quando um novo procedimento entra no mercado e o contrato, feito anteriormente ao fato, especifica apenas um método antigo e, geralmente, menos eficaz.
“Cada inovação e evolução da medicina, quando lançada, sai sempre mais cara. Então, os planos se negam a fazer a cobertura e querem pagar apenas pelos procedimentos feitos anteriormente”, discorre.
Segundo ele, as vitórias são comuns, mas as empresas “insistem no erro” confiando na ingenuidade dos clientes. “Muita gente é mal informada e desiste por falta de conhecimento”, afirma.
Saiba Mais
Ano passado, o rol da ANS teve a inclusão de cerca de 80 procedimentos médicos e odontológicos – entre eles o PET Scan, para alguns casos – além da ampliação das indicações de mais de 30 procedimentos já cobertos (diretrizes de utilização).
A aposentada Quelma Regina Pessoa precisou fazer outro exame, a tomossíntese, ainda não contemplada no rol da ANS. Desta vez, não contestou judicialmente a falta de cobertura e pagou por conta própria. Agora, espera a inclusão do procedimento, uma mamografia
Rastreamento de gene de câncer
A aposentada Quelma Regina Pessoa Dantas teve câncer de mama pela primeira vez em 1999 e, novamente, em junho do ano passado. O exame PET Scan, cuja cobertura lhe foi inicialmente negada, é o mesmo feito pela atriz e embaixadora da Boa Vontade pela Organização das Nações Unidas (ONU), Angelina Jolie, em 2013. Ambas rastrearam o gene BRCA1/BRCA2 para avaliar riscos de desenvolver câncer de mama. A norte-americana, inclusive, optou, após os resultados, por retirar os seios, o que foi noticiado amplamente na mídia internacional.
“A primeira negativa foi porque não havia a nomenclatura específica no rol da ANS”, explica Quelma. O exame, segundo ela, foi importante para evitar a retirada precipitada de suas mamas e ovários. O plano de saúde até reconheceu o equívoco alguns meses após a contestação, mas os problemas estavam longe de terminar. “Tive que discordar deles de novo, pois o valor que enviaram não estava nem perto de ser o certo”, relembra-se.
Para ela, o pior foi a necessidade de passar pela burocracia do sistema judiciário e da própria empresa em meio a um tratamento delicado. “Quando veio a primeira rejeição de cobertura, eu estava em meio à quimioterapia. Foi mais difícil me concentrar no problema na Justiça do que na doença. Não é uma situação agradável”, desabafa.
Sem justificativa
Os problemas não acontecem somente quando há uma brecha legal para contestação. Em alguns casos, procedimentos supostamente previstos em contrato também são negados ou, por vezes, postergados sem justificativa plausível.
A professora de matemática Sara Vasconcelos Pais, 36, passa por situação similar a que Quelma superou. Também vítima de câncer, seu plano de saúde questionou diversos procedimentos solicitados pelos médicos que a atendem e, atualmente, suas sessões de quimioterapia estão em atraso.
Ela teme que, se o imbróglio continuar, ela não consiga fazer as sessões, algo prejudicial devido ao seu estado e tipo de câncer. A moça também teve um PET Scan negado, em processo de revisão pela operadora. “Já denunciei para a ANS e fui ao Procon, mas ainda não obtive resposta. Fui há pouco na Defensoria e me deram um relatório de documentos que devo levar”, diz.
“Se não faço o PET Scan no prazo, a cirurgia demora mais de 25 dias para ser liberada novamente. Preciso tirar o útero e um ovário”, desabafa a professora, atualmente afastada para tratar da saúde.
Burocracia em excesso
Sara Vasconcelos conta que, além das quimioterapia suspensas sem motivo, a biópsia para identificar se o tumor era maligno ou benigno levou mais de 20 dias úteis para receber uma definição do plano de saúde. “Para tomar injeções de imunidade, a operadora questionou a opção do médico. Contestei, eles liberaram, mas quando fui para a terceira aplicação da injeção, emperraram o processo de novo”, critica.
“Primeiro disseram que o plano não cobre, mas não existe nada disso no contrato. Cobre câncer, então deveriam cobrir tudo inerente à doença”, argumenta. A professora diz estar em uma “corrida contra o tempo” e espera que tudo seja liberado a tempo, mas não esconde a decepção com as questões burocráticas que impactam em sua saúde.
O diretor do Ibedec, José Geraldo Tardin, incentiva quem se sentir lesado a contestar e buscar seus direitos. Ele diz que muitas vezes os planos de saúde criam empecilhos mesmo quando a inclusão no rol da ANS não é problema. “Existem limitações contratuais, como que a pessoa só pode fazer dez sessões de fisioterapia. Mas se o médico prescrever 50, quem tem de saber é ele, não o plano”, exemplifica. “Todo descumprimento desse tipo de contrato dá direito a dano moral, pois coloca em risco a saúde do consumidor”, ressalta.
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília
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